Ozempic: Queda de patente e acompanhamento podem v…

Ozempic: Queda de patente e acompanhamento podem v…



A cidade do Rio de Janeiro planeja um novo programa de combate à obesidade que oferecerá medicamentos como semaglutida e o liraglutidainicialmente indicado para o controle do diabetes, mas que se popularizou pelo seu efeito emagrecedor.

Segundo a Secretaria Municipal de Saúde, isso deverá ser feito a partir de 2026, mas já foi criado um grupo de trabalho para planejar a melhor estratégia de utilização do medicamento.

Apesar de ter causado certo alvoroço, a iniciativa carioca não é nova. A liraglutida já é utilizada em cidades de Goiás, Distrito Federal e Espírito Santo, e também faz parte de protocolos de tratamento do Instituto Estadual de Diabetes e Endocrinologia do Estado do Rio de Janeiro (Iede), Hospital das Clínicas e Instituto da Criança do Universidade de São Paulo.

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Ainda não há indicação de incorporação dessas substâncias ao Sistema Único de Saúde (SUS).

Em 2023, a fabricante Novo Nordisk solicitou à Comissão de Incorporação de Tecnologias ao SUS (Conitec) que avaliasse a inclusão, mas o parecer foi negativo. Apesar dos estudos que mostram a eficiência do medicamento, a estimativa de impacto orçamentário foi considerada alta: R$ 12,6 bilhões em 5 anos.

Mas este cenário poderá mudar num futuro próximo. Após a perda da patente, outros laboratórios passaram a produzir medicamentos à base de liraglutida e, em dezembro do ano passado, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária autorizou o uso no Brasil dos dois primeiros deles, produzidos pela EMS. Com mais concorrência, a tendência é que o preço do medicamento diminua.

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A semaglutida continua sendo patente exclusiva da Novo Nordisk até março de 2026 e, por enquanto, não é utilizada por nenhum serviço público. Nas farmácias, o preço das ampolas para um mês de uso varia de R$ 800 a R$ 2 mil, dependendo da dosagem.

A liraglutida é um pouco mais barata e pode ser adquirida por cerca de R$ 700, mas exige aplicação diária, enquanto a semaglutida deve ser injetada uma vez por semana.

A vice-presidente da Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia, Karen de Marca, diz estar otimista com a adoção de medicamentos na rede pública do Rio e com a possibilidade de que isso inspire outras entidades públicas na mesma direção.

Ela também é diretora de assistência técnica do Iede, uma das unidades públicas do Brasil que já utiliza liraglutida em alguns pacientes.

“Esses medicamentos são da classe dos agonistas do GLP-1. Nos estudos, notou-se que alcançou um bom controle glicêmico e também ajudou a manter os níveis de insulina. É uma molécula muito completa, temos receptores para esta molécula em vários órgãos do corpo, desde o sistema nervoso central, onde às vezes ajuda na componente de saciedade, por isso começámos a perceber que além de controlar a diabetes, ela também poderia ser útil para pacientes com obesidade”, explica o especialista.

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O vice-presidente da SBEM considera que a adoção desses medicamentos no serviço público de saúde é uma estratégia interessante também pelos estudos que demonstram redução da mortalidade por doenças cardiovasculares, e da ocorrência de doenças crônicas como hipertensão. “Quando pensamos em introduzir um medicamento no Sistema Único de Saúde, é preciso pensar no real benefício, para quem atende, quanto custa e o que vai economizar. Então se pensarmos que é uma molécula muito complexa, que pode melhorar o controle glicêmico, controlar o peso e conseguir uma perda de peso de até 25%, ainda por cima com benefícios cardiovasculares, que é a principal causa de morte de pacientes diabéticos com obesidade , é muito interessante. E você reduz custos de internação cardiovascular, de complicações de diabetes, de amputação, de remédios para hipertensão, de doenças renais.”

Essa é a principal justificativa da Prefeitura do Rio para adotar o medicamento. O secretário municipal de saúde, Daniel Soranz, acredita que isso pode acabar representando uma economia para os cofres públicos:

“Hoje, o Rio de Janeiro gasta mais ou menos R$ 130 milhões por ano com internações decorrentes de problemas de diabetes e obesidade. A expectativa é que, com a semaglutida e um programa mais amplo de combate à obesidade, consigamos reduzir essas internações e possamos de fato avançar ainda mais na melhoria da qualidade de vida.”

Segundo o secretário, a Prefeitura já mantém contato com quatro laboratórios: o Novo Nordisk, e outros três que deverão começar a fabricar o medicamento assim que a patente for quebrada.

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Soranz garante que o medicamento será oferecido dentro de um tratamento integrado: “o desenho clínico de acompanhamento dos pacientes será das Clínicas da Família. O médico de família definirá o protocolo terapêutico. Se vai precisar tomar remédio, fazer dieta, fazer exercícios, se vai precisar de cirurgia bariátrica.”

Para o vice-presidente da Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabolismo, o ideal seria que os pacientes tivessem acesso a centros de tratamento multidisciplinares: “um lugar completo, onde você tenha educador físico, nutricionista, psicólogo, psiquiatra, endocrinologista, clínico geral quem pode seguir este tratamento. Eu realmente vejo como uma necessidade ter uma equipe multidisciplinar, porque a obesidade é multifatorial. Os medicamentos tratam a obesidade, mas não tratam os motivos que levaram ao ganho de peso.”

A endocrinologista alerta ainda que os programas públicos precisam de protocolos para garantir o melhor aproveitamento dessa estratégia: “Aqui no Iede, por exemplo, estamos dispensando Liraglutida para pacientes com obesidade grave, que não responderam a outros medicamentos, que possuem outras comorbidades. E diante dessa situação, vale a pena investir em medicamentos mais caros.”

Até mesmo as bulas dos medicamentos disponíveis no Brasil – Saxenda, que contém liraglutida, e Wegovy, que contém semaglutida – indicam que são indicados para uso por adultos com índice de massa corporal acima de 30 quilos por metro quadrado (kg/m²), o que caracteriza obesidade, ou 27kg/m2, na faixa de sobrepeso, desde que o paciente tenha algum problema de saúde relacionado a essa condição.

Os medicamentos também podem ser usados ​​por adolescentes maiores de 12 anos, obesos e com peso mínimo de 60kg. Em todos os casos, a recomendação é que o medicamento seja associado à dieta alimentar e à prática de exercícios físicos.

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Uso estético

O medicamento à base de semaglutida e de marca mais famosa, Ozempic, não possui recomendação na bula para uso contra a obesidade, mas apenas para pacientes adultos com diabetes tipo 2 não controlada.

Ainda assim, a eficácia das substâncias tem atraído muitas pessoas que não se enquadram nos critérios, mas querem perder peso por questões estéticas. A venda de todos esses medicamentos exige apresentação de receita médica, mas como a receita não fica retida, é possível adquirir sem recomendação. A Anvisa discute se devem ser enquadrados na mesma categoria dos antibióticos, o que obrigaria as farmácias a guardar cópia da receita, com identificação do comprador.

Em dezembro, as Sociedades Brasileiras de Endocrinologia e Metabologia e de Diabetes e a Associação Brasileira para o Estudo da Obesidade e da Síndrome Metabólica divulgaram uma carta aberta defendendo a retenção de receitas para a venda de agonistas do GLP-1. No texto, dizem que “as vendas sem receita, apesar de irregulares, são frequentes” e que “o uso indiscriminado levanta preocupações com a saúde da população e com o acesso de quem realmente precisa do tratamento”.

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Karen de Marca reforça que quem toma esses medicamentos sem supervisão muitas vezes não toma a dosagem adequada e corre maior risco de sofrer efeitos adversos como náusea, distensão abdominal, prisão de ventre ou diarreia. O uso incorreto também pode piorar distúrbios psicológicos e alimentares.

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“Uma pessoa que tem fixação na autoimagem, em permanecer magra, às vezes pode acabar fazendo uso de dose excessiva de medicamento sem qualquer tipo de indicação. Vemos que há também uma perda de massa magra que pode desencadear um processo de sarcopenia. Você também pode ter uma dependência, no sentido de não conseguir se ver sem aquela medicação, porque precisa se sentir magra”.

A psicóloga Flavia Ferreira da Silva reforça o alerta. Ela começou a usar os medicamentos após ser diagnosticada com pré-diabetes e estenose hepática, além de obesidade. Mas sempre com apoio médico e psicológico.

“É importante lidar com a ansiedade e, às vezes, com a disforia corporal, porque você muda de corpo muito rapidamente e precisa entender que esse novo corpo está em processo, e muita gente não consegue acompanhar a imagem, fica muito fino pensando que eles ainda precisam perder mais. E também tem a vergonha de perder peso com remédios assim, como se fosse um fracasso, porque não conseguimos sozinhos, com exercícios.”

Quando iniciou o tratamento, Flávia pesava 98kg e hoje pesa cerca de 70kg: “Ser gorda não é problema, mas a obesidade crônica sim. Mesmo que você não tenha nada nos exames, você tem problemas na coluna, nos joelhos, nas articulações. Hoje todas as minhas taxas estão boas, açúcar, colesterol.”

Mas a experiência de Flávia não é universal, o que reforça a necessidade de um acompanhamento individualizado. O engenheiro de computação Danilo Vidal Ribeiro tem diabetes tipo 2 e começou a usar semaglutida para tentar controlar melhor os níveis de glicose e também perder peso, mas o tratamento não teve sucesso.

“Usei por uns dois meses, mas sentia muitas dores na barriga, parecia que minha barriga estava inchada, sempre cheia e doía muito. Cheguei até a passar uma noite no pronto-socorro para ver se havia algo extra que pudesse ser pior. Fiz exames, mas não mostraram nada.”

Hoje, com o uso de outro medicamento e mudanças na alimentação, Danilo consegue manter a doença sob controle e alerta todas as pessoas seduzidas pela promessa de emagrecimento fácil e rápido: “Qualquer remédio que você usar sem ajuda médica para tentar alcançar o resultado objetivo de perder peso, ou mesmo controlar o diabetes, você corre grande risco. E você não só fica doente, como aconteceu no meu caso, mas pode ter sérias complicações para a saúde. O uso indiscriminado certamente é preocupante.”



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