CURITIBA, PR (FOLHAPRESS) – Cada vez mais mulheres buscam o congelamento de óvulos antes dos 35 anos. Segundo especialistas em reprodução humana, esse é o período ideal para o sucesso do método, já que, a partir dessa idade, a reserva ovariana cai rapidamente e começa a perder seu potencial reprodutivo.
Para Pedro Augusto Monteleone, ginecologista e membro da Febrasgo (Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia), isso não significa que seja impossível conseguir bons resultados depois. “Mas fica cada vez mais difícil.”
Apesar disso, a tendência é que as mulheres só comecem a pensar na ideia por volta dos 37 anos, diz estudo encomendado pela farmacêutica Oregon, em parceria com o Instituto Ipsos, que realiza pesquisas de mercado. Artigo publicado pela Universidade de Brasília também estima que a idade média dos pacientes que congelam seus óvulos é de 38 anos.
Mas esse número começou a mudar. Segundo o Sistema Nacional de Produção de Embriões, da Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária), o número de ciclos anuais de congelamento de óvulos realizados entre mulheres com menos de 35 anos cresceu 49% entre 2020 e 2023 no Brasil. Acima dessa idade, o aumento no mesmo período foi de 40%.
Em 2020, a Anvisa registrou 2.193 ciclos em mulheres com menos de 35 anos e 5.679 em pacientes acima dessa idade. Em 2023, os números saltaram para 4.340 e 9.539, respectivamente.
“Muita gente demora para procurar a técnica porque ela é relativamente nova”, diz a ginecologista Paula Marin, que atua no Centro de Reprodução Humana do Hospital das Clínicas da Universidade de São Paulo (USP). A médica avalia ainda que as mulheres têm poucas informações sobre seus horizontes reprodutivos, mas que isso pode melhorar à medida que a ciência avança.
“Na escola sempre aprendemos o que fazer para evitar engravidar. Agora precisamos entender antecipadamente como ter filhos e as possibilidades para isso, ampliando nossas chances de escolha”, afirma Marin.
O primeiro caso de gravidez com óvulo congelado ocorreu em 1986. Mas a técnica permaneceu em campo experimental por décadas. A maior dificuldade dos pesquisadores foi evitar o aparecimento de cristais de gelo nos ovos durante o congelamento, pois isso comprometia a sua qualidade.
O problema foi resolvido com a chegada da vitrificação, substituto do congelamento lento (aplicado até então em estudos), que acelerou o processo e evitou a formação de cristais no interior do gameta. Com a novidade, foi possível obter 90% de sobrevivência dos ovos – anteriormente, a taxa era de 70%.
Inicialmente pensado para atender pacientes com câncer, que apresentam grandes perdas de reserva ovariana ao longo do tratamento oncológico, o congelamento passou a ser visto como uma demanda social mais ampla, já que as mulheres buscam engravidar cada vez mais tarde, explica a ginecologista Silvana Chedid, especialista em reprodução humana no Hospital Sírio-Libanês, em São Paulo.
Assim, em 2012, a Sociedade Americana de Medicina Reprodutiva (Asrm) certificou a segurança do procedimento, visto pela entidade como uma importante ferramenta para a autonomia reprodutiva da mulher. No Brasil, foi regulamentado pelo CFM (Conselho Federal de Medicina) em 2017.
Desde então, a busca pela técnica vem aumentando. Artistas como Carla Diaz, 33; Paulo Oliveira, 42; e Tatá Werneck, 40; aderiu a ela, ajudando a torná-la mais conhecida. Em meio ao crescimento, empresas como Mercado Livre, Meta e Fleury passaram a oferecê-lo aos colaboradores com o objetivo de reter talentos e promover a carreira feminina.
A demanda também mudou durante a pandemia de Covid. “Estando em casa, muita gente pensou mais em ter uma família com filhos”, diz Marin.
O congelamento de óvulos começa com a avaliação da reserva ovariana. Monteleone, da Febrasgo, recomenda que esse acompanhamento seja feito durante os exames de rotina e não apenas após a decisão do congelamento.
“Embora a idade seja fator determinante na qualidade e quantidade dos óvulos, fatores genéticos e estilo de vida influenciam nessa dinâmica, que precisa ser conhecida por cada paciente”, afirma.
Cada mulher nasce com aproximadamente 1 milhão de folículos (estruturas que abrigam os óvulos), mas isso pode variar. Outro aspecto que muda é o número total de folículos utilizados e eliminados em cada ciclo reprodutivo. “Sabemos que são entre 6 e 12, mas não há um valor fixo”, afirma o médico.
Além disso, não existe um teste que identifique a qualidade dos óvulos, mas monitorar o tamanho da reserva já é um passo importante, explica a ginecologista Mayra Nakano, membro da Sociedade Europeia de Reprodução Humana. Os exames utilizados para isso são ultrassom transvaginal, FSH basal e hormônio anti-Mülleriano.
Após determinar que existem folículos suficientes para iniciar o procedimento, a mulher toma medicamentos para iniciar a ovulação. Em seguida, os ovos formados são retirados e armazenados. O ideal é selecionar em média 15 óvulos, e a paciente pode mantê-los armazenados até o momento em que deseja engravidar e fazer a fertilização in vitro.
O principal impasse relacionado ao procedimento hoje é o preço, inacessível à maioria da população. O custo do congelamento, que é fornecido pelo SUS (Sistema Único de Saúde) apenas para pacientes com câncer ou com alguma condição específica que comprometa a fertilidade, varia entre 15 e 30 mil, dependendo da clínica, e a manutenção dos óvulos gira em torno de R$ 1 mil por ano. Para realizar a fertilização in vitro, ainda será necessário desembolsar cerca de R$ 10 mil.
Tornar o procedimento acessível é um dos maiores desafios do momento. Segundo Luiz Fernando Pina, ginecologista e obstetra e membro da Asrm, há um longo caminho a percorrer, a começar pelos medicamentos mais baratos, que representam 40% do custo total. “O método precisa ser visto pelas seguradoras como um tratamento de saúde, e os remédios também não podem ser tão caros”, finaliza Pina.
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