Memórias afetivas com a comida: as lembranças desp…

Memórias afetivas com a comida: as lembranças desp…



eu estava dentro cozinha preparando um almoço simples, pois minha esposa havia saído e deixado algumas instruções. Cortei um tomate e de repente uma epifania! O cheiro do tomate desencadeou uma série de memórias de um passado não muito recente.

Quando estávamos crianças e adolescentesfizemos longos passeios de bicicleta. Meus amigos e eu pedalamos para lugares distantes de São Paulo (pelo menos pareciam na época). Saíamos de Pinheiros ao Jardim Botânico ou ao Zoológico. Ou vá ao Ibirapuera ou ao Butantã. Muitos quilômetros para bicicletas pequenas e sem marcha, mas nossos pés e coxas eram jovens e aguentavam.

A hora da comida era provavelmente o momento mais esperado do passeio, e abrimos nossas sacolas (sacos plásticos, como os de supermercado) com sanduíches de pão fatiado, presunto e queijo, e sucos em garrafa. Ovos duros que quebramos na cabeça uns dos outros, frango assado frio e o indefectível tomate inteiro. Comemos o famoso tomate de uma só vez, acrescentando um pouco de sal – e o suco escorreu na boca.

Ok, talvez não cheirasse tomate. Mas o sabor era sempre o mesmo, confiável, maduro e nos dava a sensação de liberdade… Que podíamos fazer o que quiséssemos. O que comemos era simples, extravagante e desejável.

Memórias afetivas são momentos que nos despertaram prazer e que permanecem parte de nossas vidas, armazenados em algum canto do cérebro. Até termos a mesma experiência ou começarmos a contar as histórias para nossos filhos, netos e alunos.

O interessante é que as memórias afetivas relacionadas alimentos Quase sempre são comidas simples, como um tomate, um pedaço de bolo da avó, o feijão temperado pela empregada, o bife que minha mãe fritou, porque eu não comia muito mais que isso.

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Memórias que geralmente não são de alimentos que gostamos, mas de experiências agradáveis ​​(na maioria das vezes) ou desagradáveis. Não têm nada a ver com chocolate, refrigerante, coxinha da cantina da escola… Nem com o cachorro-quente (com tudo o que você tem direito), que comemos na saída da escola, depois de uma longa fila.

Acredito que inúmeras mães gritaram que, se não almoçássemos bem depois daquele cachorro-quente, haveria… O que aconteceria era só imaginação – talvez uma surra se alguém contasse o episódio ao pai à noite?

Tudo politicamente incorreto, você diria. Sim, eram tempos diferentes. Momentos em que comíamos todos juntos em casa, pelo menos no jantar. Tempos em que a disciplina era natural, mesmo que meu pai levantasse a cabeça diante de alguma denúncia de má educação. Momentos em que eu corria em volta da mesa fugindo da minha mãe, que nunca conseguia me pegar, por causa de alguma coisa que eu tinha feito.

A comida tinha cheiro, tinha temperatura e tinha gosto. Bom ou ruim, a impressão é que me pareceu melhor do que é hoje. O sorvete que comi no intervalo do jogo do Santos no Pacaembu estava mais gostoso que o mesmo de hoje, mesmo sendo da mesma marca. Os churros que comíamos na barraca portuguesa eram mais quentes e doces do que os que hoje se servem de sobremesa nas churrascarias.

Meus amigos italianos juram que a massa de domingo era muito melhor do que a que você compra hoje nas melhores churrasqueiras. E lembro-me da minha avó a esticar a massa com as mãos e os rolos ameaçadores, para a sopa que seria servida na sexta-feira, dia de jantar em família e celebrar o Shabat que se aproximava.

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Memórias afetivas de comida, lembranças de família, dias de mais disciplina e maior liberdade. Estávamos mais limitados e muito mais livres, de uma forma mais responsável. Não fomos melhores do que quem hoje vivencia a infância, mas posso garantir que foi diferente. O aparelho telefônico ficava na parede ou sobre uma mesinha, com um fio comprido, e não tinha imagens. Mas servia para conversar, trocar novidades e carinhos, para amor e para sustos.

O que resta são memórias… Parodiando a banda The Mamas and The Papas (um grupo dinossauro, dirão alguns), “isto é dedicado a quem amo”… Sim, esta crónica é dedicada a quem amo.

* Mauro Fisberg é pediatra e nutricionista, professor da Unifesp e coordenador do Centro de Excelência em Nutrição e Dificuldades Alimentares -CENDA, do Instituto PENSI/ Hospital Infantil Sabará

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