Jejum intermitente: estudo contraindica a prática e aponta limites – Jornal Estado de Minas

Jejum intermitente: estudo contraindica a prática e aponta limites – Jornal Estado de Minas



O jejum intermitente e a restrição calórica têm sido considerados benéficos para a saúde e a longevidade. Experimentos em animais publicados na revista Nature, porém, sugerem que, dependendo do que se come imediatamente após o jejum e da predisposição genética do indivíduo, a prática pode aumentar o risco de desenvolver tumores no intestino.

Realizado por cientistas do Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT), nos Estados Unidos, o estudo é o primeiro a analisar alterações nas células intestinais não apenas durante a interrupção alimentar, mas no período pós-jejum. Os pesquisadores identificaram que, neste momento específico, quando ocorre a realimentação, há uma intensa proliferação de células-tronco intestinais, o que traz benefícios, mas também riscos ao organismo, incluindo maior suscetibilidade ao surgimento de tumores.

“Isso significa que o jejum intermitente causa câncer de intestino? Não. Vários estudos já demonstraram os benefícios dessa prática, inclusive para prevenção de doenças. Descobrimos em nosso estudo que, ao aumentar a proliferação de células-tronco no intestino, dependendo da predisposição genética e, possivelmente, do que se come após o jejum, pode haver um risco aumentado de desenvolver tumores apenas pelo jejum. ”, afirma Renan Oliveira Corrêa, coautor do artigo. Participou da investigação durante estágio de pesquisa no MIT, com apoio da FAPESP.

Os resultados sugerem que a prática do jejum intermitente não seria, portanto, recomendada para indivíduos com histórico familiar de câncer de intestino. A descoberta também esclarece o que comer após o jejum. Portanto, alimentos cancerígenos – como carnes processadas, produtos ricos em açúcar e bebidas alcoólicas – não seriam recomendados, pois poderiam influenciar na ocorrência de mutações genéticas neste período mais crítico de proliferação celular.

“Embora o experimento tenha sido realizado com ratos, em condições artificiais, é possível sugerir maiores cuidados na realização do jejum intermitente”, afirma Corrêa, destacando que mais estudos sobre o tema precisam ser realizados.

Renovação

Conforme explica a pesquisadora, o epitélio, tecido que reveste internamente o intestino, se renova com uma frequência muito elevada. Nos humanos, a renovação total do epitélio ocorre em três a cinco dias, por exemplo. O processo ocorre naturalmente, por meio de células-tronco que, ao se multiplicarem e se diferenciarem, são capazes de gerar todos os tipos celulares presentes no epitélio.

Mais recentemente, os pesquisadores compreenderam que a proliferação de células-tronco pode ser modulada por diversos fatores. Em trabalhos anteriores, o grupo de Corrêa do Instituto de Biologia da Universidade Estadual de Campinas (IB-Unicamp) havia demonstrado que a alimentação – mais especificamente o consumo de fibras solúveis – favorece a renovação do epitélio (leia mais em: agencia.fapesp. br/41777).

“Além da regulação pelos nutrientes ingeridos, conseguimos agora demonstrar que essa proliferação também pode ser modulada pela frequência alimentar, como no caso do período pós-jejum”, explica Marco Aurélio Ramirez Vinolo, professor do IB-Unicamp e co-autor dos dois estudos.

“Isso acontece porque as células se adaptam à condição de interrupção alimentar e respondem proliferando com mais intensidade quando os animais são alimentados novamente após o jejum. Isto tem um aspecto positivo, pois garante a manutenção e recuperação do epitélio. [de um dano ou estresse, por exemplo] mais rapidamente. Porém, vemos um risco potencial para o desenvolvimento de mais tumores caso ocorram mutações cancerígenas neste exato momento de maior proliferação”, destaca Vinolo, que foi orientador de doutorado de Corrêa.

No trabalho publicado recentemente na Nature, os investigadores analisaram a proliferação de células estaminais em três situações diferentes: quando os animais estavam em jejum, quando comiam após o jejum e quando seguiam uma dieta normal sem pausas prolongadas para comer. A comparação mostrou que as células-tronco epiteliais proliferam mais intensamente durante o período de realimentação (após 24 horas de jejum).

“Analisando o mecanismo envolvido, descobrimos que a proliferação mais intensa de células-tronco ocorre devido à ativação de uma via celular chamada mTORC – associada ao metabolismo celular e à síntese proteica. Basicamente, com a ativação dessa via, mais proteínas passam a ser produzidas através do metabolismo das poliaminas, moléculas importantes para que ocorra a divisão celular, o que resulta em maior proliferação de células-tronco neste período de feedback”, explica Corrêa.

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No estudo, quando os pesquisadores ativaram mutações genéticas no período pós-jejum, os ratos tiveram maior probabilidade de desenvolver tumores intestinais em estágio inicial.

“Nossa descoberta mostra, portanto, que se trata de um caso de azar. O jejum intermitente pode ser muito eficiente, pois na verdade reduz o consumo de calorias. Algumas pesquisas mostraram que, além de promover a perda de peso, a prática reduz o risco de diabetes e pode trazer melhorias ao sistema imunológico, protegendo o organismo contra alguns tipos de câncer. Porém, identificamos que não deve ser recomendado para todos, pois o momento da realimentação é quando há grande proliferação celular e pode deixar as células mais suscetíveis à formação de tumores”, pontua Corrêa.

Leia o artigo A realimentação pós-jejum de curto prazo aumenta a rigidez intestinal através de poliaminas



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