O insônia É uma condição muitas vezes subestimada, mas bastante comum em idosos, pois ocorrem alterações nos padrões de sono com o envelhecimento. Não existem dados oficiais, mas estima-se que os distúrbios do sono afetem cerca de 50% dos idosos, e dentro deste grupo destaca-se a insónia com uma prevalência entre 20% e 40%. Muitos recorrem a medicamentos sedativos dormir, o que pode gerar dependência e piorar a qualidade de vida, aumentando o risco de quedas, por exemplo.
Mas, de acordo com um estudo publicado em setembro no “JAMA Psychiatry”, intervenções autoguiadas para terapia cognitivo-comportamental pode ajudar a reduzir o uso de medicamentos e melhorar a qualidade do sono em idosos com insônia, tornando-se uma alternativa eficiente e de baixo custo para o manejo do problema.
A intervenção autoguiada é um modelo de mediação comportamental aplicado em uma situação específica, como a insônia, sem a participação ativa de um profissional de saúde. O indivíduo recebe materiais escritos ou em vídeo com orientações sobre como lidar com um problema específico. A ideia é que ele siga as instruções e consiga, sozinho, reduzir o uso de medicamentos.
“Além de incentivar independência do pacientea técnica é vantajosa principalmente porque alivia a carga do sistema de saúde. A proposta é muito positiva porque demonstra a força de vontade da própria pessoa em querer melhorar”, analisa a neurologista Letícia Soster, do Grupo Médico de Assistência ao Sono do Hospital Israelita Albert Einstein.
Como o estudo foi realizado
Pesquisadores da Austrália e do Canadá avaliaram o impacto da intervenção autoguiada em 565 pessoas com mais de 65 anos que sofria de insônia e usei alguns medicamentos para dormir. Eles foram divididos em três grupos: dois receberam cartilhas diferentes com orientações sobre mudança de comportamento e um manteve o tratamento habitual, sem qualquer intervenção. Após receberem o material, os voluntários foram acompanhados durante seis meses.
Os idosos do primeiro grupo receberam uma carta de apresentação e livros intitulados “Como parar de usar remédios para dormir” e “Como recuperar o sono“, além de um site com informações adicionais. Os participantes do segundo grupo receberam livros intitulados “Você pode estar em risco” e “Como ter uma boa noite de sono sem remédios”.
Todos utilizavam algum medicamento para dormir: o zopiclona foi o medicamento mais utilizado (71,3%), seguido do lorazepam (12,3%), clonazepam (6,2%), oxazepam (5,8%), temazepam (4,1%) e zolpidem (4,1%). A coleta de dados foi realizada por meio de duas entrevistas telefônicas (no início do estudo e após seis meses) com duração de 60 a 90 minutos cada.
Ao final da investigação, os pesquisadores perceberam que os grupos que receberam a intervenção autoguiada conseguiram suspender o uso de medicamentos ou reduzir a dose. Além disso, os resultados mostram que houve redução da insônia (diminuição do tempo para adormecer), aumento do tempo total e da eficiência do sono e menor sonolência diurna.
Na avaliação de Letícia, esses achados reforçam o potencial benéfico da intervenção autoguiada ao demonstrar o quão importantes são as mudanças comportamentais durante o dia e antes de dormir. “Se a pessoa conseguiu diminuir o uso de medicamentos, isso mostra que não foi um problema puramente químico, mas sim comportamental”, avalia.
Segundo o neurologista, o tratamento primário e padrão ouro para a insônia deveria ser a terapia cognitivo-comportamental; o medicamento é um suporte, utilizado apenas quando necessário.
O uso de sedativos deve ser evitado porque muitas vezes apresentam efeito residual, ou seja, continuam agindo no dia seguinte. É comum as pessoas usarem este medicamento para dormir e no dia seguinte permanecerem letárgicas, um pouco sonolentas e pensamento mais lento. “Este é um efeito colateral comum. A partir do momento que você reduz a medicação, ou eventualmente consegue parar de usá-la, esses efeitos diurnos deixam de existir”, alerta Letícia.
Abstinência
Durante o estudo, 33% dos participantes que pararam de tomar medicamentos apresentaram sintomas de abstinência por um período de cerca de quatro semanas – a insônia foi o mais comum, afetando 29,4% dos voluntários, seguido de ansiedade.
Segundo Letícia, esse é um problema comum na hora de interromper o uso crônico de medicamentos sedativos, porque o cérebro estava acostumado a trabalhar apenas com aquela molécula específica.
Apesar disso, é possível reduzir o uso com segurança, por meio de orientações como reduzir a velocidade de retirada, alternar doses e associar o uso de medicamentos a outros mecanismos de ação.
“Existem diversas estratégias para o manejo da abstinência de medicamentos, mas o melhor sempre será a orientação e o apoio comportamental. Jamais recomendamos que você pare de usar abruptamente”, aconselha.
Um problema multifatorial
À medida que envelhecemos, a capacidade de dormir e permanecer dormindo muda. Uma delas é que o gasto energético diminui, fazendo com que a pessoa não vá para a cama tão cansada. Outra mudança é o menor produção de melatonina nos idosos, o que faz com que a sincronização de claro e escuro no ambiente dependa de mais sinais.
Um terceiro ponto é que, muitas vezes, idosos não fazem atividades padrões regulares de sono (não têm horário para dormir e acordar, por exemplo) e isso quebra o ciclo padrão do sono. Além disso, muitas vezes os idosos precisam acordar várias vezes durante a noite para urinar. E há também o fator psíquico, provocado, por exemplo, pela perda de pessoas próximas nesta fase da vida.
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