SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Pesquisadores holandeses realizaram um experimento para investigar os mecanismos por trás da síndrome pós-Covid – também conhecida como Covid longa – e tiveram um resultado único: camundongos, após receberem anticorpos de pessoas com Covid longa, apresentaram os sintomas da doença.
A constatação é única, pois estudos realizados até então indicavam que fatores como a carga viral do vírus no momento da infecção aguda e respostas inflamatórias no organismo estavam relacionados à síndrome, além de fatores de risco como sexo, idade e hábitos de vida.
Pesquisas sugerem que, assim como as doenças reumáticas, autoimunes ou infecções que causam desregulação do sistema imunológico, a Covid longa pode se manifestar como uma doença autoimune, causada por um ataque das células de defesa do organismo.
O artigo que detalha o experimento foi publicado no repositório online bioRxiv em formato pré-print, ou seja, ainda não passou por revisão por pares. No entanto, o experimento foi concebido como um ensaio clínico padronizado, onde os participantes foram divididos em 3 grupos e comparados a um grupo placebo. Cerca de 24 ratos foram utilizados na pesquisa.
Niels Eijkelkamp, médico e investigador principal do laboratório de imunologia translacional do Centro Médico da Universidade de Utrecht, na Holanda, coordenou o estudo. Também participaram pesquisadores do Instituto de Infecção e Imunidade de Amsterdã, do Departamento de Imunohematologia Experimental da Sanquin Research e da Faculdade de Ciências do Movimento e do Comportamento da Universidade Livre de Amsterdã.
Como se sabe que a Covid causa danos aos tecidos de vários órgãos, detectados pela presença de marcadores (proteínas ou restos celulares) na corrente sanguínea, os cientistas analisaram pacientes no Centro Médico da Universidade de Amsterdã para avaliar a presença desses biomarcadores.
Como o estudo foi realizado
Os pesquisadores avaliaram a presença de anticorpos IgG humanos em diferentes tecidos de camundongos
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No total, foram incluídos no estudo 34 participantes, que tiveram infecção confirmada pelo Sars-CoV-2 e não desenvolveram Covid de longa duração nem foram hospitalizados pela doença.
Os pacientes foram então divididos em três grupos (LC-1, LC-2 e LC-3) de acordo com a presença de biomarcadores conhecidos como interferons no sangue, indicando maior atividade nas células neurológicas ou musculoesqueléticas.
Depois, foram retiradas amostras de sangue dos pacientes e foram isolados autoanticorpos do tipo IgG, chamados de memória e de longa duração, ao contrário dos anticorpos IgM, que normalmente desaparecem alguns dias após a infecção.
Os anticorpos foram purificados e introduzidos nos animais em laboratório. Amostras de autoanticorpos IgG de pacientes que não tiveram Covid (placebo) também foram utilizadas para comparação.
Após 15 dias, os pesquisadores avaliaram a presença de anticorpos IgG humanos em camundongos em diferentes tecidos, como coração, músculos, medula espinhal e células cerebrais, por serem esses os principais órgãos afetados pela síndrome pós-Covid.
O que os pesquisadores constataram é que roedores que receberam anticorpos de participantes com Covid longa desenvolveram sintomas, como dores, dificuldades locomotoras e maior sensibilidade ao calor, que poderiam permanecer por até 15 dias após a transfusão.
Vale ressaltar que os anticorpos de diferentes grupos de pacientes também apresentaram diferentes padrões de comportamento nos animais, sendo os grupos LC-1 e LC-3 mais relacionados à redução da mobilidade e à hipersensibilidade.
Os sintomas da Covid longa podem ser difusos e se manifestar de forma diferente nos pacientes. Estudos indicam que indivíduos com Covid grave e hospitalizados apresentam alto risco de desenvolver síndrome pós-Covid, mas não só. No caso do experimento acima, apesar de terem tido Covid leve a moderada durante a fase aguda, os 34 participantes apresentavam marcadores no sangue indicando uma desregulação do sistema imunológico pós-Covid.
Ainda são necessários mais estudos para entender melhor como a extensão dessa condição desregulada pode causar sintomas e até outras condições de saúde a longo prazo, mas o estudo conseguiu demonstrar que a presença de anticorpos do tipo IgG por pelo menos seis meses ou mais pode indicar uma longa condição de Covid.
Os pesquisadores concluem o artigo afirmando que os animais podem ser modelos experimentais para novas pesquisas sobre a Covid longa, sendo um passo importante para a compreensão da síndrome e até mesmo para novos testes de medicamentos e terapias contra a doença.
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