Estudo inédito identifica fatores genéticos de risco para depressão e abre portas para novas terapias – Jornal Estado de Minas

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Um estudo inédito identificou fatores de risco genéticos para depressãooferecendo novas pistas sobre como a doença afeta o cérebro, o que poderia levar a tratamentos mais eficazes. Foram analisados ​​dados de mais de 5 milhões de pessoas de 29 países, incluindo o Brasil.

A depressão é uma das principais causas de incapacidade no mundo e afeta cerca de 15% da população global ao longo da vida. O distúrbio é tipicamente de natureza recorrente ou crônica, muitas vezes com incapacidade persistente, apesar das terapias farmacológicas e psicológicas.

Publicado na revista científica Cell nesta terça-feira (14), o estudo identificou cerca de 700 variações genéticas relacionadas à depressão, das quais quase 300 nunca haviam sido reveladas antes. Essas variações estão ligadas a neurônios em regiões cerebrais que controlam as emoções.

O trabalho utilizou dados de um consórcio internacional com mais de 300 pesquisadores. É o maior e mais diversificado estudo já realizado sobre a genética da depressão. Pesquisas baseadas em gêmeos e famílias mostram que há uma contribuição genética significativa para o desenvolvimento da doença de cerca de 37%.

Segundo o psiquiatra Pedro Mario Pan, pesquisador da Unifesp (Universidade Federal de São Paulo) e coordenador da coorte brasileira, o trabalho mostra a importância de incluir diferentes populações nas pesquisas para que os tratamentos possam ser eficazes para todos.

A identificação de um terço das novas variações genéticas ocorreu graças à inclusão de indivíduos de ascendência africana, asiática, hispânica e sul-asiática.

“Historicamente tivemos um predomínio de estudos genéticos de populações majoritariamente europeias. Este foi o estudo mais inclusivo de todos. Com isso, podemos estar mais próximos da verdade sobre a genética da depressão”, afirma Pan, também membro do conselho do Instituto Ame sua Mente.

Segundo Pan, uma vez identificados esses genes, é possível realizar novos estudos experimentais, utilizando cultura celular in vitro, e identificar, por exemplo, a quais tipos de neurônios esses genes estão mais associados em termos de expressão gênica.

“Essas novas informações destacam áreas do cérebro que podem ser alvos diretos de terapias, além de permitir a adaptação de medicamentos existentes para tratar a depressão”, explica a professora Sentia Belangero, da Unifesp e que também participou do estudo.

Segundo os pesquisadores, entre os medicamentos que podem ser reaproveitados estão a pregabalina e o modafinil, atualmente utilizados no tratamento de dores crônicas e distúrbios do sono. Mas alertam que são necessários mais estudos e ensaios clínicos antes de confirmar a sua eficácia para a depressão.

Hoje, 20% a 30% das pessoas com depressão apresentam a forma resistente da doença, o que significa que não respondem a pelo menos dois medicamentos em dose e horário adequados.

“Essas novas descobertas abrem portas para fazermos um pouco do que fizemos lá em [epidemia de] Covid. Em outras palavras, testar medicamentos in vitro para diversas aplicações e avaliar se eles podem ter um impacto nessas vias afetadas que identificamos agora”.

A coorte brasileira incluída no estudo utilizou dados de uma amostra de 2,5 mil jovens de São Paulo e Porto Alegre, acompanhados desde 2009.

Na opinião de Pan, o estudo também é um marco no perfil de contribuição dos pesquisadores brasileiros. “Contribuímos de forma muito mais significativa, não só incluindo a amostra mista, que é fundamental, mas também analisando e desenvolvendo a capacidade de análise de dados tão complexos.”