Daniel Roberto, 31 anos, desde o nascimento deu sinais de que seria uma criança atípica. “Ele se irritava com facilidade e não olhava nos nossos olhos”, lembra a mãe, a professora Helena Maria de Souza, 58 anos. Já no hospital, Daniel só se acalmou na hora de tomar banho. Depois, teve dificuldade para amamentar, ingerir alimentos sólidos e também atrasou na fala.
O autismo, ou transtorno do espectro autista (TEA), é considerado um transtorno do neurodesenvolvimento caracterizado por alterações comportamentais que afetam a comunicação e a interação social, explica o psiquiatra André Luís Pires e diretor do Censa Betim. Ele destaca que o autismo se manifesta em diferentes necessidades de apoio. “O autismo leve, ou nível 1, pode apresentar dificuldades de comunicação e interação social, mas as pessoas com esse grau geralmente conseguem viver de forma independente”, explica.
O autismo moderado pode trazer desafios na comunicação verbal e não verbal, além de comportamentos repetitivos e interesses restritos. No autismo grave, as pessoas têm necessidades de apoio e comunicação mais complexas, com dificuldades significativas de comunicação e interação social, comportamentos repetitivos e interesses restritos.
“É importante deixar claro que cada pessoa é única e apresentará sinais e comportamentos diferentes. O diagnóstico clínico é baseado na observação direta do comportamento do paciente e em entrevistas com os pais”, afirma o especialista.
O mais cedo
O diagnóstico precoce desempenha um papel fundamental no tratamento e na melhoria da qualidade de vida das pessoas afetadas. Quanto mais cedo a criança receber o diagnóstico, mais cedo poderá iniciar atividades que estimulem estímulos para o seu desenvolvimento. No entanto, compreender o autismo nem sempre foi fácil, mesmo para especialistas.
‘Ele se irritava facilmente e não olhava nos olhos’, lembra Helena Maria
Arquivo pessoal
Há três décadas, o diagnóstico do transtorno do espectro do autismo (TEA) ainda era desconhecido por muitos profissionais e a condição não era generalizada. “No início alguns profissionais achavam que o Daniel era surdo, mas eu sabia que não, porque ele me entendia”, diz Helena. Para incentivar o filho, a professora procurou a Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais (Apae) e assim, desde que completou um ano, Daniel passou a frequentar a instituição.
O diagnóstico de Daniel do espectro do autismo nível 3 – o mais grave, só veio quando ele tinha três anos e nove meses e foi avaliado por um médico especialista de Curitiba que estava em Patrocínio (MG) para ministrar um curso, cidade onde Helena morava a família. “Antes, eles me disseram que ele era talentoso.” Diante do diagnóstico, Helena começou a fazer um curso sobre TEA e também buscou formas e métodos para cuidar do filho.
A microempreendedora Estela Mares Guillen, 61 anos, mãe de Alexandre Guillen, atualmente com 37 anos, também passou por dificuldades para finalizar o diagnóstico do filho. “Na época não havia muita informação sobre o autismo. A princípio os médicos pensaram que ele era surdo. Ele também teve crises muito fortes e muitos pensaram que era sua birra. Ouvi até coisas horríveis como “esse menino não vai dar em nada”, “ele precisa de chinelos”. Só tivemos o diagnóstico quando ele tinha quase quatro anos. Era um autismo grave”, lembra ela.
O caminho
Para cuidar do filho Daniel, Helena buscou respostas. “Eu me perguntei qual caminho deveria seguir e fiz tudo o que pude para incentivar meu filho. Até montei uma sala de aula lúdica e estudei métodos. Eu sabia que ele não poderia ir para um quarto normal por causa das limitações de seu autismo severo, mas nunca o deixei de fora de nada. Ele nos levou para sair, para a igreja, mesmo sendo muito difícil.”
Daniel cresceu dentro da Apae até os 15 anos, conta a mãe. Mas quando chegou à adolescência os sintomas mais graves intensificaram-se. Ele começou a se jogar no chão, se atacando e quebrando coisas. Na idade adulta a situação ficou ainda mais complicada, lembra Helena. “Meu filho estava se machucando muito, colocando a própria vida em risco. Ele era desumano. Cada ataque seu foi um pedido de ajuda. Encontrar um lugar ideal para cuidar dele tornou-se uma questão de sobrevivência.”
Quando Estela levou o filho ao psiquiatra, ele recomendou uma escola especializada em autismo em Belo Horizonte. No início, seu filho Alexandre estava matriculado em meio período, depois passou a frequentar a escola em período integral. Aos 13 anos, Alexandre teve que ser internado em uma instituição especializada.
Estela Mares, mãe de Alexandre, também teve dificuldades para finalizar o diagnóstico do filho
Arquivo pessoal
“Suas crises estavam piorando. Ele tentou pular do 12º andar, não com ideia de suicídio. Ele nos trancava em casa e jogava a chave no corredor, se autoflagelava, cortava o pulso, batia com a mão nos vidros e nas janelas”, lembra. Estela enfrentou uma decisão difícil, mas necessária. “Até ouvi dizer que se eu o quisesse vivo, precisaria hospitalizá-lo.”
A difícil decisão
Para famílias com indivíduos com autismo grave, optar por instituições especializadas pode ser um caminho viável para o tratamento de seus filhos. Pessoas autistas com grande deficiência muitas vezes precisam de apoio total desde o momento em que acordam até o momento em que vão dormir. “São pessoas que precisam de ajuda, por exemplo, para manter a rotina diária de higiene, como escovar os dentes, pentear os cabelos, tomar banho. Precisam de cuidados, acompanhamento e acompanhamento 24 horas por dia durante toda a vida”, ele explica. a psicóloga Natália Costa, diretora do Censa Betim, instituição que acolhe adultos com autismo grave e oferece atendimento transdisciplinar.
Embora difícil, a decisão de escolher uma instituição parceira para cuidar dos filhos foi acertada pelas mães Helena e Estela. “Ninguém mais poderia nos ajudar. A Apae não tinha mais estrutura e ficamos cada vez mais sozinhos. Entramos com uma ação no Ministério Público e com muita força de vontade e fé conseguimos encontrar esse lugar maravilhoso para nos atender”, conta Helena.
Daniel mora em Censa há 10 anos, onde chegou aos 21 anos.
André Luís destaca que o autismo se manifesta em diferentes necessidades de apoio
Arquivo pessoal
“No Censa ele foi acolhido, está recebendo atendimento. Hoje minhas palavras são de gratidão à instituição e às pessoas que cuidam dele. Tudo o que passei me tornou uma pessoa mais humana. O desafio de ter um filho autista é emocional, todo mundo tem desafios na vida, a pessoa precisa se conhecer, conhecer seus limites como mãe, todos da família e também da sociedade”.
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Estela também lutou para dar qualidade de vida ao filho. Ela fundou a Associação de Pais e Amigos de Pessoas Especiais (Apape) há 20 anos e foi presidente da instituição. “Há um terror quando se fala em casos graves”, diz ela.
Até escolher Censa, para atender seu filho Alexandre em Betim, Estela peregrinou por três lugares. “Lá encontramos apoio, carinho. Meu filho é respeitado, tem outros colegas, com patologias iguais ou semelhantes”, afirma.
Na instituição, os filhos de Estela e Helena fazem artesanato, têm ginástica, música e atividades diversas com equipe interdisciplinar. As visitas dos pais são gratuitas e quando podemos levamos ele para o convívio familiar. “Vou visitá-lo aos sábados ou domingos. Nesses dias, dirigimos o dia todo e voltamos à instituição à noite”, conta Estela.
Para as famílias de pessoas com autismo grave, dividir o cuidado dos filhos com uma instituição especializada é um ato de amor e representa tranquilidade e conforto. Estela relata que hoje em dia sua família consegue viver uma rotina mais tranquila.
“Temos uma vida mais normal, podendo dormir, fazer uma refeição tranquilamente, atividades que antes eram impossíveis de realizar em casa. Sabemos que o Alexandre está sendo bem cuidado e estamos sempre juntos. Ele é muito guerreiro. Com ele aprendemos humildade, perseverança, amor, carinho, igualdade, respeito às diferenças”, afirma. E ele acrescenta. “Os autistas graves muitas vezes são vistos como loucos e nessas horas a família tem que se unir e se apoiar ainda mais”, afirma Estela.
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