LONDRES, INGLATERRA (FOLHAPRESS) – “As pessoas procuram morte assistida porque se sentem desamparados”, argumenta Alistair Thompson, diretor da ONG Care Not Killing, organização britânica que se opõe à descriminalização do suicídio assistido e da eutanásia.
A ONG é uma das representantes de um movimento de pessoas insatisfeitas e temerosas com o avanço da legalização da morte assistida na Europa, e que veem problemas e possíveis desigualdades na possibilidade de optar por morrer.
“Permitir o suicídio assistido pode levar as pessoas a escolherem a morte porque têm medo de se tornarem um fardo para os familiares”, diz Thompson. O grupo é formado por ativistas religiosos, médicos e pelos direitos dos deficientes.
No Brasil, o debate sobre a morte assistida ressurgiu com a morte do escritor Antonio Cícero que, diante do diagnóstico de Alzheimer, decidiu pelo suicídio assistido na Suíça, onde a prática é legal.
Hoje, no Reino Unido, é proibido ajudar uma pessoa a cometer suicídio e a eutanásia também é ilegal. Na Inglaterra, a pena pode ser prisão perpétua. Isso pode mudar em 2024.
No dia 29 de novembro, o Parlamento britânico deverá começar a discutir uma mudança na lei para ingleses e galeses. A Escócia também está a considerar um projecto separado.
A proposta deveria apelar à legalização da eutanásia e do suicídio assistido para pacientes terminais, com esperança de vida de seis meses.
O Care Not Killing, que surgiu em 2003 durante a análise de um projeto semelhante que terminou em derrota, mobilizou-se contra a nova proposta.
Thompson diz que estabelecer um prognóstico de vida é incerto. “Tem gente que tem seis meses de vida e acaba vivendo muitos anos”, diz.
A organização argumenta que o estabelecimento de uma licença para diagnósticos terminais também poderia ser visto apenas como um “primeiro passo”. “Podemos pegar, por exemplo, o caso da Holanda, onde os limites já foram ampliados e atualmente incluem até crianças”, afirma o diretor.
A lei holandesa permite o suicídio assistido para pessoas com mais de 12 anos, desde que sejam cumpridos certos critérios, como demonstrar “sofrimento insuportável”. Até aos 16 anos é necessário o consentimento dos pais.
Thompson também cita dados do estado de Oregon, nos Estados Unidos, onde o suicídio assistido é legal para pacientes terminais desde 1997. “Vemos uma tendência de aumento de mortes assistidas onde há legalização”, afirma.
Números divulgados pela Lei Morte com Dignidade do estado americano mostram que, em 2023, 560 pessoas receberam prescrição de barbitúricos e 367 ingeriram os medicamentos, um aumento em relação a 2022, com 304 mortes. Desde que a lei entrou em vigor, Oregon registrou 2.847 suicídios assistidos.
Segundo o relatório, 17 pessoas que receberam receitas em 2023 e decidiram não prosseguir com o suicídio assistido viveram além do prognóstico de seis meses originalmente estabelecido.
Organizações como a Care Not Killing afirmam que os investimentos na melhoria dos cuidados paliativos poderiam reduzir a procura de casos de suicídio assistido. Defende, no caso do Reino Unido, que deveria haver maior investimento.
Thompson menciona o caso de uma veterana do exército canadense e atleta paraolímpica que acusa o governo de seu país de lhe oferecer a possibilidade de morte assistida quando ela solicitou uma rampa para sua casa. O caso de Christine Gauthier, de 2022, ganhou atenção internacional.
“Este caso é assustador”, diz ele. “Só porque é mais difícil ou mais caro prestar cuidados não significa que devamos dizer às pessoas para escolherem a morte”.
Apesar da acusação, o departamento que lida com veteranos do exército disse não ter provas de que tenha sido oferecida morte assistida a Gauthier. O caso está sob investigação do governo canadense.
Os defensores da descriminalização da morte assistida afirmam que a possibilidade de escolher o momento e a forma de morrer traz dignidade e conforto aos pacientes terminais e às pessoas em sofrimento extremo e sem perspectiva de melhora.
No Reino Unido, a ONG Dignity in Dying também afirma que a proibição da prática no país não faz com que pacientes terminais mudem de ideia, mas sim que busquem o suicídio assistido no exterior.
A descriminalização também é bem vista pela opinião pública. Em 2023, uma pesquisa da Ipsos mostrou que 65% dos britânicos são a favor de uma mudança na lei. Thompson também questiona as pesquisas que mostram que a maioria da população britânica é a favor da mudança da lei. “Quando você olha para as perguntas feitas, elas geralmente são tendenciosas”, argumenta ele.
O debate sobre a nova lei em Westminster deverá gerar divisões na base do primeiro-ministro Keir Starmer, que enquanto era chefe do Ministério Público decidiu não processar um médico preso por eutanásia em 2009, e já demonstrou simpatia pessoal para a mudança na lei.
O líder trabalhista, porém, prometeu que os parlamentares poderão votar livremente. Espera-se que membros do próprio governo, como o secretário de Saúde, Wes Streeting, votem contra a proposta.
Thompson diz que Care Not Killing está focado em fazer com que os legisladores votem não. “Atualmente estamos mobilizando os eleitores para agirem em seus distritos, pressionando os parlamentares”.
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