MicroRNA: entenda de vez o assunto que rendeu o No…

MicroRNA: entenda de vez o assunto que rendeu o No…



Todas as células do corpo humano contêm o mesmo genoma, informação genética na forma de moléculas de DNA. Ou seja, em essência, todas as células vêm acompanhadas do mesmo manual de instruções. Como, então, a célula do pâncreas sabe que precisa produzir insulina e a célula do cérebro não? Como as células musculares são tão diferentes dos neurônios, que por sua vez são tão diferentes das células do coração ou da pele? Como, a partir do mesmo livro de receitas, as células se diferenciam em tecidos e órgãos com funções tão específicas, sabendo exatamente quais proteínas produzir e quais não produzir? A resposta para isso é a regulação genética, e isso rendeu a Prêmio Nobel de Medicina e Fisiologia este ano para os pesquisadores Victor Ambros e Gary Ruvkun.

Na escola aprendemos que os genes, na molécula de DNA, são transcritos de uma forma molécula de RNA mensageiro que, por sua vez, é traduzido em uma proteína. Em outras palavras, o DNA gera RNA que gera proteínas. É assim que os genes são transformados em algo com estrutura e função. Este é o chamado dogma central da biologia molecular. A propósito, veremos mais tarde por que é uma má ideia chamar algo de dogma na ciência.

Como podemos evitar que todas as células do corpo que não são do pâncreas produzam insulina? É necessário regular como os genes são ativados e desativados. Precisa ter um botão “liga e desliga”. Intervir no processo em que o DNA gera RNA que gera proteínas pode ser um bom mecanismo. Podemos ativar ou desativar genes se conseguirmos colocar obstáculos nas etapas do processo.

Desde a década de 1960, são conhecidos vários tipos de regulação gênica que interferem no início do processo, impedindo que o DNA produza RNA. São os chamados “fatores de transcrição”, proteínas que se ligam a regiões específicas do DNA, determinando quais delas serão transcritas em mRNA e quais não. Eu mesmo trabalhei com fatores de transcrição em bactérias durante meu doutorado e pós-doutorado, estudando como os genes das bactérias se regulavam em situações estressantes.

No caso das bactérias, elas usaram isso para responder aos estímulos ambientais, garantindo melhor aproveitamento da energia. Afinal, imagine a bagunça se mesmo numa bactéria, um organismo unicelular, todos os genes estivessem ativos ao mesmo tempo?

Os pesquisadores ganhadores do Prêmio Nobel não trabalharam com bactérias. Eles estudaram um verme chamado Caenorhabditis elegans1 mm de comprimento, e que todos chamam C. elegans. É um dos melhores modelos para estudar células eucarióticas, células que encontramos em organismos multicelulares, como plantas e animais.

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Esses pesquisadores ficaram muito curiosos com duas mutações nesse pequeno verme: uma mutação em um gene chamado lin4 e outra em lin14. Estudando esses mutantes, perceberam que, de alguma forma, o lin4 regulava a atividade do lin14. Eles descobriram que o RNA formado pelo lin4 era muito pequeno, em torno de 20 pares de bases – as bases nitrogenadas são as letras do DNA (A, T, C e G) e do RNA (A, U, C e G) -, e parecia não codificar nenhuma proteína: não possuía as sequências necessárias para ser traduzido em uma proteína.

Esse RNA pequeno parecia servir apenas para interromper a expressão do gene lin14! Trabalhando juntos, os pesquisadores perceberam que o lin4 de alguma forma inibiu o lin14, mas não impediu a formação de um mRNA do lin14. O que quer que estivesse acontecendo, estava acontecendo depois desta etapa.

Ou seja, esse pequeno RNA, que parecia não ter utilidade, estava “bloqueando” a tradução de outro RNA, impedindo que o outro RNA gerasse uma proteína. O mecanismo também era extremamente simples. Comparando as sequências de lin4 com as de lin14, os cientistas perceberam que elas “se encaixam”. Lembra-se de como as fitas da dupla hélice do DNA se emparelham de uma maneira específica? A com T, C com G? O microRNA lin4 teve esse tipo de acoplamento, mas com uma região do mRNA do lin14. Quando chegou lá, “parou” a produção da proteína. Aqui vemos por que nunca se deve chamar algo de “dogma” em biologia. Você já percebeu que nem todo RNA gera proteína, certo?

Uma nova forma de regular o expressão genética. Esse modelo foi denominado regulação pós-transcricional, pois ocorre após a transcrição do mRNA, e não antes, como acontece com os fatores de transcrição. A pequena molécula de RNA foi denominada microRNA. Esta foi uma notícia tremenda na época e rendeu aos cientistas duas publicações na revista científica célulaem 1993.

Na época, a comunidade científica viu a descoberta como algo interessante, mas achou que deveria ser um mecanismo exclusivo do verme, o C. elegans. Somente depois de mais alguns anos de pesquisa o grupo de Ruvkun mostrou que esses microRNAs são universais em todos os organismos multicelulares.

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Só em humanos, foram identificados mais de mil microRNAs, que participam da ativação e silenciamento de um grande número de genes. Quando esta regulação falha, podem surgir doenças como o cancro, doenças autoimunes e falhas no desenvolvimento embrionário. Um belo trabalho de ciência básica, movido apenas pelo desejo de conhecimento. A pesquisa poderia até ter aplicações importantes na medicina e na agricultura. Afinal, saber ligar e desligar genes pode ser muito útil para terapia genética e criação de plantas resistentes a vírus, por exemplo. Mas o fato é que os cientistas não estavam pensando nisso, queriam apenas entender como os genes são regulados.

A curiosidade e a busca pelo conhecimento impulsionam a ciência. E, portanto, precisam ser estimulados e financiados. Nesse sentido, o Brasil ainda tem muito que aprender. Se quisermos ter um Prémio Nobel para chamar de nosso, é melhor começarmos a levar a ciência a sério, com investimento, incentivos e desenvolvimento de carreira para os nossos jovens investigadores.

* Natalia Pasternak é professora de ciência e políticas públicas na Columbia University (EUA) e na Fundação Getúlio Vargas (FGV-SP) e presidente do Instituto Questão de Ciência (IQC). O artigo foi publicado originalmente na Revista Questão de Ciênciado Instituto Questão de Ciência

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