Brasil tem mais de 30 internações ao dia por tentativa de suicídio – Jornal Estado de Minas

Brasil tem mais de 30 internações ao dia por tentativa de suicídio – Jornal Estado de Minas


O Sistema Único de Saúde (SUS) registrou, ao longo de 2023, 11.502 internações relacionadas a lesões em que houve intenção deliberada de causar dano a si mesmo, o que dá uma média diária de 31 casos. O total representa um aumento de mais de 25% em relação aos 9.173 casos registrados quase dez anos antes, em 2014. O dado foi divulgado nesta quarta-feira (11) pela Associação Brasileira de Pronto Atendimento (Abramede).

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Em nota, a entidade lembrou que, neste tipo de circunstância, os médicos emergencistas são geralmente os primeiros a prestar atendimento ao paciente. Para a associação, o aumento das internações por tentativas suicídio e a automutilação reforça a importância da capacitação desses profissionais para lidar com os casos de forma rápida e eficiente, além de promover suporte adequado em situações de grande fragilidade emocional.

Segundo a Abramed, os números, já elevados, podem ser ainda maiores, devido a possíveis subnotificações, registros inconsistentes e limitações no acesso ao atendimento em algumas regiões do país. Os dados mostram que, em 2016, houve oscilação nas notificações de internações por tentativas de suicídio, com leve queda em relação aos dois anos anteriores. O índice voltou a subir em 2018, com um total de 9.438 casos, e atingiu o pico em 2023.

Estados e regiões

A análise regional das internações por lesões autoprovocadas revela variações entre os estados brasileiros. Para a associação, em alguns deles foi registrado “crescimento alarmante”. Alagoas, por exemplo, teve o maior aumento percentual de 2022 para 2023 – um salto de 89% nas internações. Em números absolutos, os casos subiram de 18 para 34 no período.

Paraíba e Rio de Janeiro, segundo a entidade, também chamam a atenção, com aumentos de 71% e 43%, respectivamente. Por outro lado, estados como São Paulo e Minas Gerais, apesar de registrarem números absolutos elevados – 3.872 e 1.702 internações, respectivamente, em 2023 – registraram aumentos percentuais menores, de 5% e 2%, respectivamente.

Num movimento contrário, alguns estados apresentaram reduções significativas no número de internações por tentativas de suicídio e automutilação no ano passado. O Amapá lidera a lista, com queda de 48%, seguido por Tocantins (27%) e Acre (26%).

A Abramed destaca que a Região Sul como um todo enfrenta uma “tendência preocupante” de aumento desse tipo de internação. Santa Catarina apresentou crescimento de 22% de 2022 para 2023, enquanto o Paraná identificou aumento de 16%. O Rio Grande do Sul ficou no topo da lista, com aumento de 33%.

Perfil

Segundo a associação, o perfil dos pacientes internados por lesões autoprovocadas revela uma diferença significativa entre os sexos. Entre 2014 e 2023, o número de mulheres internadas aumentou de 3.390 para 5.854. Entre os homens, o total de internações caiu, passando de 5.783 em 2014 para 5.648 em 2023.

Em relação à faixa etária, a faixa de 20 a 29 anos foi a mais afetada em 2023, com 2.954 internações, seguida pela faixa de 15 a 19 anos, que registrou 1.310 casos. “Os números destacam a vulnerabilidade de jovens e adolescentes, que, juntos, representam parcela significativa das tentativas de suicídio”, avaliou a entidade.

As internações por lesões autoprovocadas entre pessoas com 60 anos ou mais totalizaram 963 casos em 2023. Outro dado relevante é o aumento de internações entre crianças e adolescentes de 10 a 14 anos – em 2023, foram 601 registros, quase o dobro do observado em 2011 (315 internações).

Para Abramede, embora o atendimento inicial desses casos exija “foco técnico”, é importante que a abordagem inclua também a identificação de sinais de vulnerabilidade emocional, com o objetivo de oferecer suporte integrado. A entidade avalia que uma resposta rápida e humanizada pode fazer diferença no prognóstico desses pacientes, além de ajudar na prevenção de novos episódios.

Setembro amarelo

No Brasil, uma das principais campanhas de combate ao estigma na área da saúde mental é o Setembro Amarelo, que este ano tem como lema Se Precisar, Peça Ajuda. Definido por diversas autoridades de saúde como um problema de saúde pública, o suicídio no país contabiliza cerca de 14 mil registros todos os anos. Isso significa que todos os dias, em média, 38 pessoas tiram a própria vida.

Na avaliação do psicólogo e especialista em traumas e urgências subjetivas Héder Bello, os transtornos mentais representam fatores de vulnerabilidade no contexto do suicídio – mas não são os únicos. Ele também cita ser pessoa LGBT, estar em situação de precariedade financeira ou social, ser refugiado político ou enfrentar ameaças, abusos ou violência. “Esses e outros fatores contribuem para processos de ideação ou mesmo tentativa de suicídio”.

“Políticas públicas que possam, de alguma forma, falar sobre esse assunto, sem tabus, são importantes. Instrumentos nas áreas de educação e saúde também podem ser amplamente divulgados – justamente para que possamos mostrar que existem amplas possibilidades e recursos para lidar com certas situações que são realmente muito estressantes e muito vulneráveis.”

Cenário global

Dados da Organização Mundial da Saúde (OMS) indicam que, todos os anos, mais de 700 mil pessoas em todo o mundo tiram a própria vida. A entidade alerta para a necessidade de reduzir o estigma e estimular o diálogo aberto sobre o tema. A proposta é romper com a cultura do silêncio e do estigma, dando lugar à abertura ao diálogo, à compreensão e ao apoio.

Os números da entidade mostram que o suicídio é atualmente a quarta principal causa de morte entre jovens dos 15 aos 29 anos. A OMS cita consequências sociais, emocionais e económicas de longo alcance causadas pelo suicídio que afetam profundamente os indivíduos e as comunidades como um todo.

Reduzir a taxa global de suicídio em pelo menos um terço até 2030 é um dos objetivos dos chamados Objetivos de Desenvolvimento Sustentável, definidos pela Organização das Nações Unidas (ONU). “Os desafios que levam uma pessoa a tirar a própria vida são complexos e estão associados a factores sociais, económicos, culturais e psicológicos, incluindo a negação de direitos humanos básicos e de acesso a recursos”, destacou a OMS.



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