Não é novidade que a exposição a poluentes no ar pode afetar o fertilidade. Já sabemos que a poluição pode alterar os hormônios e o ciclo menstrual da mulher, interferir na qualidade do esperma e até prejudicar o desenvolvimento do feto. Mas agora, um estudo pioneiro mostrou que a exposição a poluentes não só afecta as hipóteses de gravidez natural, mas também pode reduzir as taxas de sucesso da fertilização in vitro (FIV).
Realizado durante um período de oito anos, o pesquisa, publicada em uma das principais revistas de medicina reprodutiva do mundoanalisaram mais de 3.000 transferências de embriões congelados em quase 2.000 pacientes que tinham idade média de 34 anos no momento da retirada do óvulo e 36 anos durante a transferência do embrião para o útero. Esta informação foi comparada com dados oficiais sobre taxas de poluição no período próximo ao coleta de ovos.
Assim, os pesquisadores constataram que a alta exposição ao material particulado 10 (PM10) nas duas semanas anteriores à coleta dos óvulos reduziu em 38% as chances de nascidos vivos em comparação à amostra com menor exposição ao poluente. Além disso, a exposição ao material particulado 2,5 (PM2,5) nos três meses anteriores à coleta também reduziu as chances de nascidos vivos, de 0,90 no período médio de exposição para 0,66 no período de maior exposição.
PM2,5 e PM10 são pequenos poluentes presentes no ar que podem ser facilmente inalados. Poeira, queima de combustível e veículos motorizados são as principais fontes. E sabemos, por exemplo, que homens e mulheres que trabalham ao ar livre nas grandes cidades têm maior dificuldade de engravidar naturalmente justamente por causa dessas materiais particulados.
Os cientistas destacaram ainda que o impacto da poluição no sucesso da fertilização in vitro foi observado apesar da boa qualidade geral do ar durante o período do estudo, com os níveis de PM10 e PM2,5 excedendo as diretrizes da Organização Mundial da Saúde (OMS) em apenas 0,4% e 4,5%. respectivamente. Para efeito de comparação, o Brasil tem mais que o dobro dos níveis recomendados pela OMS de PM2,5 na atmosfera.
Em suma, o estudo aponta para uma associação negativa entre a exposição à poluição antes da colheita dos óvulos e as taxas de nascidos vivos em procedimentos de fertilização in vitro com os embriões formados a partir desses óvulos. Em outras palavras, a poluição não afeta apenas negativamente o desenvolvimento da gravidez, mas também a qualidade dos óvulos. E isso ocorre mesmo em locais com boa qualidade do ar, onde limites de poluição os limites aceitos são excedidos em apenas alguns dias.
E embora os mecanismos por trás desta relação ainda não sejam claros, minimizar a exposição à poluição deve ser uma prioridade fundamental para saúde pública.
Infelizmente, a nível pessoal, não há muito que possa ser feito para reduzir a exposição a partículas. Só uma intervenção em termos de políticas públicas será verdadeiramente eficaz para garantir a protecção da saúde reprodutiva da população.
Até então, nos dias com pior qualidade do aro uso de máscaras pode ser recomendado, especialmente se você planeja congelar óvulos ou fazer fertilização in vitro em breve.
*Rodrigo Rosa é ginecologista, obstetra e especialista em reprodução humana, diretor da clínica Mater Prime e do Mater Lab, em São Paulo, e membro da Associação Brasileira de Reprodução Assistida (SBRA) e da Sociedade Brasileira de Reprodução Humana (SBRH)
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