Em audiência na Câmara dos Deputados, Fernando Haddad perdeu a paciência com as provocações da oposição. E ele subiu.
Ao ouvir que a economia vai mal e que deveria voltar aos livros: “Não sei o quanto você gosta de livros, mas peço que acompanhe os relatórios do Tesouro”.
Ao ver o custo da inadimplência dos precatórios e da isenção do ICMS (feita por Bolsonaro) colocado na conta do governo: “O filho é seu, você tem que assumir a responsabilidade. Faça um teste de DNA.”
Sobre o desprezo pela cultura: “Você gosta da monocultura, eu sei que você gosta”. “Eu olho para você de um ponto de vista antropológico. (…) Tentando entender o seu raciocínio. Com muita dificuldade.”
Sobre a isenção de impostos sobre jogos de azar: “Gostaria de saber se você está no seu perfeito juízo.”
E, com toda a razão, acusou o bolsonarismo de estar mais interessado em lacrar as redes do que em contribuir para um debate sério sobre o país —ironicamente, ao criticar a vedação alheia, lacrou-a como se não houvesse amanhã.
É certo que Haddad se divertiu muito, deu um baile e, sem dúvida, venceu a discussão.
Mas ele não aceitou.
As críticas ao governo não partem apenas de bolsonaristas duros e mal-intencionados: há muitas pessoas sérias e bem-intencionadas que estão preocupadas, com razão, com os rumos da economia.
O défice nominal está nas nuvens, continua a aumentar, mas o quadro fiscal não prevê cortes de despesas em nenhuma circunstância (pelo contrário, prevê um aumento constante). O equilíbrio fiscal depende exclusivamente do aumento das receitas (ou seja, dos impostos). Mas, quando a receita aumenta, em vez de reduzir a dívida, o governo reduz a meta do défice primário.
Ministros como Ruy Costa e Alexandre Silveira defendem o aumento dos gastos e a única pessoa que demonstra compromisso com a responsabilidade fiscal é o ministro das Finanças. O próprio Lula critica constantemente a responsabilidade fiscal e defende reduções nas taxas de juros. E bastou Haddad defender na Câmara a taxação das importações da China (que ele chama, não sem razão, de “contrabando”) para o presidente avisar que deve vetá-la.
Haddad disse que “a impressão que dá é que tem um fantasmazinho tomando conta das pessoas e prejudicando o nosso plano de desenvolvimento”.
O problema é que o “fantasminha” que assombra o governo Lula e atrapalha os planos de Haddad é o próprio presidente Lula.
(Por Ricardo Rangel em 26/05/2024)
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