Segurança não justifica omissão de dados sobre viagens de ministros do STF

Segurança não justifica omissão de dados sobre viagens de ministros do STF



SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – A alegação genérica de que questões de segurança justificam a falta de divulgação de informações sobre viagens envolvendo ministros do STF (Supremo Tribunal Federal) não é suficiente para justificar a ausência de dados sobre os magistrados nesses casos, eles dizem especialistas ouvidos pela Folha de S.Paulo. Ao mesmo tempo, a posição prejudica a imagem do tribunal e pode enfraquecê-lo institucionalmente, dizem.

O tribunal gastou quase R$ 200 mil com diárias de quatro policiais federais que acompanharam ministros da corte em viagem aos Estados Unidos no final do ano. O gabinete do STF não divulgou quem eram os ministros nem o motivo das viagens, alegando preocupações de segurança. No período, apenas o ministro Edson Fachin anunciou compromissos públicos, previstos para ocorrerem no Brasil.

“O STF não fornecerá dados sobre quais policiais ou agentes da polícia judiciária atuam em quais ministros por questões de segurança”, afirmou o tribunal em comunicado. “Num contexto de ameaças acrescidas ao STF e aos seus membros, a divulgação de nomes de agentes da polícia judiciária ou de outros agentes, segundo análise técnica do setor de segurança, coloca em risco os servidores, seus familiares e as autoridades”, acrescentou. .

Para Bruno Morassutti, diretor da Ficam Sabendo, agência de dados especializada em LAI (Lei de Acesso à Informação), e membro do Conselho de Transparência Pública da Controladoria-Geral da União, a preocupação com a segurança dos ministros é razoável, mas não não pode comprometer a transparência dos dados.

Segundo Morassutti, um dos autores da coluna Transparência Pública da Folha de S.Paulo, o ideal é que as informações sejam divulgadas antes mesmo das viagens.

Casos delicados, no entanto, podem exigir divulgação após o evento. Mesmo assim, as decisões relativas à omissão de informações precisam ser bem fundamentadas e não podem ser baseadas em justificativas genéricas, além de necessitarem respeitar uma restrição temporal de quanto tempo os dados devem ser omitidos.

“Quando se trata dos magistrados mais importantes do judiciário nacional, deveríamos ter informações sobre suas atividades de forma mais transparente. A transparência fortalece a reputação e a imagem institucional, além de evitar a desinformação [sobre a atuação dos ministros]“, afirma. “Muito melhor seria fortalecer a transparência para combater os boatos e boatos que se criam”.

Mesmo com restrições de segurança que possam justificar a ausência de detalhes sobre as viagens, é desejável que o tribunal forneça mais informações sobre o caso, como o motivo da viagem e os nomes dos ministros, afirma Morassutti.

Ele afirma que seria positivo haver mais transparência em relação à agenda dos magistrados, como já acontece no Executivo. “Esse movimento para melhorar a transparência dos tribunais supremos não é exclusivo do Brasil. Isso aumenta a confiança que temos na instituição. Um tribunal que perde a confiança da população torna-se institucionalmente mais frágil.”

Para Juliana Sakai, diretora executiva da ONG Transparência Brasil, omitir dados não é razoável, principalmente nos casos em que o evento já ocorreu. “O argumento da segurança não é sustentável e gera mais desconfiança em relação à forma como o dinheiro público é utilizado pelo tribunal”, afirma.

Ela diz observar um movimento crescente no sistema de justiça brasileiro para dificultar o acesso à informação pública. Como exemplo, ele cita uma resolução aprovada em novembro do ano passado pelo CNMP (Conselho Nacional do Ministério Público) que exigia a identificação de pessoas interessadas em consultar os salários dos procuradores.

Ainda segundo Sakai, a questão da segurança é muitas vezes utilizada de forma genérica para justificar a ausência de informações que deveriam ser públicas. “Esse argumento é usado de forma completamente abstrata, dizendo que há risco potencial, mas sem falar em elementos concretos”.

Ela afirma que as instituições podem, dependendo do caso, analisar quanta informação podem oferecer sem comprometer a segurança dos envolvidos, mas que a ausência de dados simples, como o nome dos magistrados que fizeram a viagem, não é razoável.

“Talvez não precisemos saber o endereço exato para onde os ministros foram, mas precisamos saber quanto estamos pagando. Há um nível de transparência necessário e eles não estão fornecendo nenhuma”, afirma.

Segundo Sakai, a ausência de informações aumenta a desconfiança em relação à instituição. “Eles querem proteger-se contra a opinião pública, mas esta falta de responsabilização não é consistente com o fortalecimento democrático”, diz ele.

Para Marco Antonio Ferreira Macedo, professor do departamento de direito público da UFF (Universidade Federal Fluminense), a resposta do tribunal ao caso não atende ao princípio da publicidade presente na Carta Magna.

“Na Constituição não há regra explícita de sigilo. Muito pelo contrário, a regra é a publicidade, conforme artigo 37”, afirma. Ele argumenta que a questão da segurança não parece justificar a ausência de dados gerais sobre a viagem.

Segundo Macedo, a prática prejudica a transparência e a ideia de responsabilização. Além disso, a falta de informação criaria “um escudo para os ministros não serem criticados”.



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