Os dados sobre como a elite vê o governo são chocantes Lula e o futuro do Brasil. Não há nada que os dissuada da ideia de que apenas um Paulo Guedes – note-se que o maior quebra-teto de gastos até hoje – é a salvação do Brasil, que para eles se resume a números e indicadores. O Governo Lulaclaro, está longe de ser correto com a maioria das escolhas e algumas são especialmente desnecessárias.
O erro de comunicação do governo ao anunciar a isenção do Imposto de Renda para quem ganha até 5 mil reais junto com o plano de corte de despesas é claro e evidente. Não havia razão para tratar do assunto, quando se sabia que o plano não era o que os operadores financeiros mais esperavam.
A matemática é simples: se o mercado entender que a economia está superaquecida e em pleno emprego, deixar esse grupo com mais dinheiro em mãos fará com que gastem mais. Com mais poder de compra, os setores do retalho e dos serviços serão ainda mais impulsionados, o que, na visão dos investidores e decisores do capital financeiro, é algo a combater, pelo menos neste momento. Isso fica claro ao olharmos os números da pesquisa: para 85% dos entrevistados, a economia tende a piorar, ante apenas 15% que acreditam que vai melhorar caso seja aprovada a isenção de IR para quem ganha até R$ 5 mil.
Feitas as ressalvas aos abusos do governo, é preciso dizer que talvez esta ou aquela atitude do atual executivo não importe muito, quando parece que numa hipotética disputa entre Lula e Bolsonaro e, em 2026, o ex-presidente e todo o seu histórico golpista, teriam, prestem atenção, 80% das intenções de voto. É, no mínimo, inacreditável que os operadores do capital financeiro pensem desta forma. Mas eles não apenas pensam, eles vão além.
Note-se que a grande maioria dos entrevistados pela Quaest não tem reservas, pois tudo é visto com um pessimismo exacerbado que parece ter pouco a ver com a realidade. Quando a questão é saber até que ponto a política económica está a ir na direcção certa, 96% dizem que está na direcção errada. É simples assim, mesmo depois de nos enganarmos repetidamente sobre o crescimento do PIB e outros indicadores.
O absurdo vai além. Quando questionados sobre como ficou a imagem do Brasil no exterior desde a posse de Lula, 64% disseram que a imagem do Brasil piorou, surpreendentemente. 24% dizem que está igual e 12% acreditam que melhorou. Para 88%, portanto, o Brasil no exterior é visto pior ou permanece igual quando comparado ao antecessor Jair Bolsonaro. Quero acreditar, e o leitor mais atento também, que a pergunta se refere especificamente ao cenário econômico, embora esse não pareça ser o conteúdo da pergunta.
Como não é esse o objetivo da Quaest para a citada questão sobre a imagem internacional do Brasil, chegamos à conclusão de que aquele cenário de total descontrole da pandemia, de manifestações antidemocráticas e de toda a polêmica com a vacina é visto como algo melhor porque foi acompanhado por uma política económica que desperta nostalgia na multidão do mercado.
É claro que quando Bolsonaro sai de cena, dada a sua inelegibilidade, quem cai nos braços de Faria Lima é Tarcísio de Freitaso chamado moderado do momento. 78% dos entrevistados acreditam que o governador de São Paulo é o melhor candidato ao cargo de presidente num cenário sem Jair Bolsonaro. Não foram questionados, mas não seria difícil imaginar que num possível Ministério da Segurança Pública sob Tarcísio, o candidato preferido para assumir o cargo seria Guilherme Derrite, aquele que nem o bolsonarismo ousou trazer para as fileiras da Executivo. Não para por aí. Dados de pesquisas mostram que eles vão muito além.
Seria de se pensar que num cenário em que Lula estivesse fora surgiria um candidato mais ao centro e até razoavelmente aprovado por eles. Não é bem assim que funciona. Se a eleição fosse entre Bolsonaro e Haddadpor exemplo, 71% estariam com o ex-presidente, contra 21% dos que votariam no atual ministro das Finanças. E se Lula estiver no jogo em 2026 e tiver que competir com Pablo Marçala preferência é clara: 65% apoiariam o treinador, contra 17% dos que optariam por votar em Lula. E mesmo entre Pablo Marçal e Haddad, o candidato do PRTB teria maioria: 54% contra 33% do petista.
Se este cenário não é ideológico a um nível extremo, não posso dizer o que pode ser classificado como tal. Por último, mas longe de ser menos importante, está a confiança na liderança política. Quão confiável é Lula para os operadores do mercado financeiro? 3% confiam mais ou menos nele, em comparação com 97% que não confiam em nada no atual presidente. Quanto à confiança em Bolsonaro, 5% dizem confiar muito nele, 31% dizem confiar mais ou menos nele. Quase o mesmo índice dado a Gabriel Galipoloo novo presidente do Banco Central a partir de 2025. Ou seja, todos apoiaram sem problemas a volta do ex-presidente ao jogo. E quem são os mais confiáveis? Roberto Campos Neto (70%), Tarcísio de Freitas (69%) e Romeu Zema (47%). Não há muitas surpresas aí.
O mais chocante é que Tarcísio de Freitas não foi o queridinho do momento e teve Braga Nettopor exemplo, se você fosse eleito governador de algum estado com projeção e importância, talvez estaríamos vendo uma intenção de voto altíssima para um general quatro estrelas preso neste sábado, dia 15, por envolvimento em uma trama golpista descabida e sobre a qual vai ouvir muito. A sua confiança seria certamente muito elevada entre financiadores e investidores, independentemente do histórico da sua atuação em outros setores.
Quanto à democracia? Para gestores, analistas e tomadores de decisão do capital financeiro, isso tem pouca importância e não é uma variável determinante para as escolhas que fazem.
* Rodrigo Vicente Silva é mestre e doutor em Ciência Política (UFPR-PR). Estudou História (PUC-PR) e Jornalismo (Cásper Líbero). É vice-editor do Journal of Sociology and Politics. Está vinculado ao grupo de pesquisa Representação Democrática e Legitimidade (INCT-ReDem). Contribua para esta coluna semanalmente.
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