Os horizontes de Campos Neto e Galípolo

Os horizontes de Campos Neto e Galípolo



Há uma clara divergência entre o actual presidente da Banco Central, Roberto Campos Netoe seu sucessor, o diretor Gabriel Galípolo. Mas ao contrário da especulação do mercado financeiro, as diferenças entre os dois não têm a ver com o início de um ciclo de subida das taxas de juro a partir de Setembro, mas sim com a mensagem que cada um quer transmitir.

Contando os dias para o término do mandato após quase seis anos, Campos Neto tenta encerrar seu ciclo com tranquilidade. Ele analisa o legado após um período conturbado sob Jair Bolsonaro e Lula da Silva.

Prestes a ser indicado, Galípolo precisa mostrar suas credenciais a um mercado que o vê com desconfiança. Na linguagem das declarações do Copom, Campos Neto e Galípolo têm “horizontes relevantes” diferentes.

Em entrevista a Míriam Leitão, do jornal O Globoe no evento do BTG da semana passada, Campos Neto foi “pacífico”, o jargão para uma postura mais branda. “Sempre dissemos que se fosse necessário aumentar as taxas de juro, faríamos, mas não me lembro de ter falado em aumentar as taxas de juro”, afirmou. Ele se mostrou surpreendentemente otimista com o cenário externo e evitou se posicionar na reunião do Comitê de Política Monetária (Copom) do BC, em setembro. “Os economistas não estão prevendo um aumento (nas taxas de juros) para este ano, mas o mercado está. É importante ter calma, ser cauteloso em momentos de grande volatilidade”, disse Campos Neto. Muita gente entendeu o discurso de Campos Neto como um veto ao aumento dos juros em setembro.

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As declarações contrastam com as que Galípolo fez nas últimas duas semanas, quando assumiu o papel de favorito para assumir o BC. “Minha interpretação é que uma posição difícil para o Banco Central é a inflação fora da meta. A inflação fora da meta é uma situação incômoda. Ter que aumentar os juros é uma situação cotidiana para quem está no Banco Central”, argumentou Galípolo, em tom “hawkish” (agressivo). Quem ouviu Galípolo ficou na dúvida sobre o tamanho do aumento dos juros.

É uma ironia. Ao assumir a direção do BC, em agosto do ano passado, Galípolo lutou contra o temor do mercado de que ele fosse uma correia de transmissão do Palácio do Planalto. Último indicado de Bolsonaro para um cargo no Executivo, Campos Neto foi transformado pelo presidente Lula no símbolo dos juros altos. As posições foram invertidas.

No final das contas, a verdadeira diferença entre os dois é que Campos Neto quer reduzir as expectativas do mercado para um ciclo de três ou quatro reuniões do Copom, aumentando as taxas de juros, e evitar deixar o cargo em dezembro sob a previsível barragem de ataques do PT. Faz parte da imposição de um discurso mais cauteloso.

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Galípolo, por sua vez, precisa dissipar as dúvidas de que como presidente do BC seria um líder sem coragem de aumentar os juros. Portanto, suas declarações neste momento precisam soar agressivas.

A essas diferentes perspectivas se soma a vaidade. Galípolo será nomeado presidente do BC nos próximos dias e deverá ser discutido e aprovado pelo Senado na primeira semana de setembro. A reunião do Copom de 17 e 18 de setembro, portanto, terá dois presidentes, um no cargo e outro apenas esperando para trocar o bastão. É previsível que Campo Neto queira mostrar a sua autoridade até ao final do mandato, em dezembro, e que Galípolo esteja ansioso por mostrar para que veio.

Mesmo assim, é muito provável que até a reunião do Copom de 17 e 18 de setembro os dois discursos estejam acertados e o resultado da votação seja unânime.



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