FOLHAPRESS – O ministro Alexandre de Moraes, do STF (Supremo Tribunal Federal), vinculou o vazamento e publicação de mensagens que expunham ações fora do rito de seu mandato a uma organização criminosa que teria como objetivo desestabilizar instituições, fechar o tribunal e conseguir “o retorno da ditadura”. Os termos foram utilizados no documento que abriu o inquérito para apurar o caso.
Nesta quinta-feira (22/8) o magistrado retirou o sigilo do inquérito aberto na última segunda-feira (19/8).
Esta nova investigação foi aberta após a Folha de S.Paulo revelam que o gabinete do ministro no Supremo ordenou, por meio de mensagens e oficiosamente, a produção de relatórios do TSE (Tribunal Superior Eleitoral) para respaldar as decisões do próprio Moraes contra apoiadores de Bolsonaro na investigação das fake news.
A nova investigação também é denunciada por Moraes porque é tratada, no processo, como relacionada ao inquérito das fake news, sob sua responsabilidade.
“O vazamento e a divulgação de mensagens privadas trocadas entre funcionários dos referidos Tribunais revelam-se como novas provas da atuação estruturada de uma possível organização criminosa que tem por finalidade desestabilizar as instituições republicanas”, escreveu Moraes na abertura da nova investigação.
Segundo ele, essa articulação se dá principalmente contra órgãos que possam se opor “de forma constitucionalmente prevista a atos ilegais ou inconstitucionais”, como o Congresso e o Supremo Tribunal Federal.
De acordo com a decisão que abre o inquérito, esta organização se daria em uma rede virtual de apoiadores que trabalham, sistematicamente, para criar ou compartilhar mensagens com o objetivo final de derrubar a estrutura democrática e o Estado de Direito no Brasil.
“Esta organização criminosa, ostensivamente, ataca a Democracia e o Estado de Direito, especificamente contra o Poder Judiciário e em particular contra o Supremo Tribunal Federal, pedindo o impeachment de seus integrantes e o fechamento do Supremo Tribunal do país, com o retorno da ditadura e o afastamento da fiel observância da Constituição Federal”, escreveu Moraes.
O celular do ex-assessor do TSE Eduardo Tagliaferro havia sido apreendido pela Polícia Civil de São Paulo, após ele ter sido preso por suspeita de violência doméstica, em 2023. O aparelho ficou sob guarda policial de 9 a 15 de maio de 2023. Segundo a Polícia Civil Documento policial, Tagliaferro devolveu o celular após reconhecer o objeto e verificar sua integridade e funcionalidade.
Na decisão, Moraes cita dois textos do site da revista Fórum, que, segundo ele, abordam “a inconsistência de informações relacionadas à propriedade do celular, que é a provável origem do vazamento de mensagens publicadas” pela Folha de São Paulo.
“Nas referidas publicações foi registrado o possível vazamento deliberado de informações, com o objetivo de estabelecer narrativa fraudulenta relacionada à atuação de servidores”, escreveu Moraes.
Na mesma decisão, ele já encaminha o caso à Polícia Federal e determina que Tagliaferro seja ouvido no prazo máximo de cinco dias. Ele também exige cópia integral do inquérito aberto em Franco da Rocha (SP) sobre o caso de violência doméstica.
Assim, a PF convocou o ex-chefe da AEED (Assessoria Especial de Combate à Desinformação) do TSE para prestar depoimento nesta quinta-feira em São Paulo. A esposa do ex-assessor também foi convocada.
O perito também mandou apreender o novo celular. “Sempre há uma surpresa”, disse Eduardo Kuntz, seu advogado, após ser questionado sobre a apreensão.
A defesa do ex-assessor do TSE criticou a condução da investigação pelo ministro. Kuntz afirmou que o cliente negou o vazamento das mensagens e disse que, “se não for vítima, é uma boa testemunha” para a investigação.
“Obviamente não consigo entender e concordar com essa condução excessiva das vítimas, dos investigados, do juiz, do promotor e do delegado de polícia, mas este é o momento que estamos vivendo”, disse Kuntz.
Após os primeiros relatos, na quarta-feira (14/8), Moraes disse, durante sessão no plenário do STF, que “nenhum dos assuntos preocupa meu gabinete, me preocupa, nem a lisura dos procedimentos” e afirmou que tudo foi documentado . O presidente do tribunal, Luís Roberto Barroso, e o reitor, Gilmar Mendes, também manifestaram apoio ao colega.
O Folha de S.Paulo teve acesso a mais de 6 gigabytes de diálogos e arquivos trocados via WhatsApp por auxiliares de Moraes, incluindo seu principal assessor no STF, que até hoje ocupa o cargo de juiz instrutor (uma espécie de auxiliar de Moraes no gabinete), e demais integrantes de sua equipe no TSE e no Supremo Tribunal Federal.
O CNJ (Conselho Nacional de Justiça) arquivou nesta terça-feira (20/8) um processo movido pelo partido Novo contra os desembargadores citados no caso das reportagens produzidas no TSE a pedido de Moraes.
A reclamação disciplinar referia-se a Airton Vieira e Marco Antônio Martin Vargas, respectivamente, juiz instrutor do gabinete de Moraes e juiz auxiliar da presidência do TSE quando o ministro presidia o órgão.
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