Quem matou Marielle?
Agora, 2.423 dias depois do crime que chocou o Brasil e o mundo, essa pergunta começa a ser respondida. Em julgamento que durou 15 horas, o 4º Tribunal do Júri do Rio de Janeiro condenou os ex-policiais militares Ronnie Lessa e Élcio de Queiroz pelos assassinatos do vereador Marielle Franco e seu motorista Anderson Gomes.
Lessa foi condenado a 78 anos e 9 meses de prisão e Élcio de Queiroz a 59 anos e 8 meses de prisão.
Se por um lado a condenação de ambos representa uma vitória para os familiares das vítimas que há seis anos lutam por justiça, por outro é apenas o início do desvendamento de um crime político para o qual ainda há muitas dúvidas .
É sempre bom lembrar: foi um crime político, um feminicídio político. E ela morreu não só por defender o coletivo do ataque dos grileiros urbanos, mas por tudo que representou na resistência ao racismo, ao machismo, à LGBTfobia.
“A sentença que será lida agora é dirigida aos acusados aqui presentes e aos vários Ronnies e Élcios que existem na cidade do Rio livres por aí”, declarou a juíza Lúcia Glioche, quase num prenúncio de que a justiça só será feita quando as pessoas que ordenaram o crime e todos os envolvidos na cadeia de corrupção que cerca as investigações do assassinato também estão no banco dos réus.
“A justiça às vezes é lenta, é cega, é estúpida, é injusta, é errada, é torta, mas chega”, acrescentou o juiz.
Marielle e Anderson foram executados nos fundos, em uma rua onde as câmeras de vigilância estavam desligadas. A frieza do assassino ao relatar o ocorrido na noite de 14 de março de 2018 chocou a todos. “Se fosse um revólver, só o vereador teria morrido”, confessou Lessa na Justiça. Mas Marielle e Anderson foram metralhados pelas costas.
Em 15 horas, o Brasil inteiro foi levado para aquela noite. “Dói cada vez mais, dói muito. É uma falta, um vazio, um coração que tem um pedaço que foi covarde, injustamente arrancado naquela noite”, declarou Marinete Silva, mãe de Marielle, que desde aquele dia se vê obrigada a revisitar a tragédia.
A condenação é, sem dúvida, um marco para o país. Durante anos, com a ação conivente do crime organizado infiltrando-se na máquina do Estado do Rio de Janeiro, foram feitas todas as tentativas possíveis para evitar que o caso fosse elucidado.
O assassinato de Marielle foi um crime que merece ser totalmente desvendado. Os réus confessos, Lessa e Queiroz são apenas a ponta de uma matéria que ainda tem perguntas sem respostas —na opinião da coluna.
Não há justiça capaz de resolver a dor e a perda das vítimas desta execução. Mas o país precisa de todas elas, das respostas. É fundamental que todos os responsáveis sejam condenados e presos pelo maior tempo possível, mesmo que no Brasil isso signifique, na prática, uma pena máxima de 30 anos. “Talvez a justiça estivesse com a presença de Marielle e Anderson”, disse o juiz, lembrando que a pena máxima pedida pelo Ministério Público é de 84 anos – 84 anos seriam poucos.
Se não existe uma justiça perfeita, capaz de reparar integralmente os danos causados a quem perdeu uma filha, um marido, uma mãe, um pai, a condenação de Lessa e Queiroz, pelo menos, é uma demonstração de que existe uma justiça possível, mesmo que tem inúmeras falhas. O crime nem sempre prevalecerá, mas ainda assim ganhou mais do que perdeu no Brasil.
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