A dívida de Minas Gerais, incluindo as dívidas com a União, cresceu 51,3% desde janeiro de 2020, ainda na primeira gestão do governador Romeu Zema (Novo), reeleito em 2022. Os dados são do Boletim Mensal da Dívida Pública do Estado, divulgado pela Secretaria da Fazenda do Estado (SEF) desde 2020. Em janeiro daquele ano, o boletim apontava um valor acumulado de R$ 124,7 bilhões.
A última consolidação dos números do boletim mostra que, em dezembro do ano passado, a dívida total do estado era de R$ 188,7 bilhões, um aumento de R$ 64 bilhões em cinco anos ou R$ 35 mil por dia. Esse valor corresponde, por exemplo, a quase metade da receita prevista para o estado de Minas Gerais para este ano: a estimativa é de R$ 126,7 bilhões.
Dessa dívida total, R$ 159,86 bilhões são devidos à União. São esses valores que serão objeto de renegociação por meio do Programa de Refinanciamento da Dívida do Estado (Propag), aprovado pelo Congresso Nacional em dezembro passado, por meio de articulação feita pelo presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD). Minas Gerais, junto com São Paulo, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul e Goiás, é um dos estados mais endividados do país.
O restante são dívidas do Estado com instituições financeiras nacionais e internacionais, com o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), com o Instituto de Pensões dos Servidores Militares (IPSM) e com depósitos judiciais. Contactado pela reportagem, o SEF escusou-se a comentar o aumento da dívida.
Para o vice-presidente do Sindicato dos Servidores de Tributação, Fiscalização e Arrecadação do Estado de Minas Gerais (Sinfazfisco-MG), João Batista Soares, o principal motivo do crescimento da dívida mineira no governo Zema foi, segundo ele, “o inadimplemento sob tutela do Supremo, cuja primeira liminar foi obtida no último mês do governo Fernando Pimentel (PT), em dezembro de 2018”.
Substituição por Propag
Nessa data, o governo mineiro obteve autorização da Justiça para suspender o pagamento do parcelamento da dívida com a União, que só seria retomado em 2024, após a adesão ao Regime de Recuperação Fiscal (RRF), que deverá ser substituído, por o final deste ano. ano, pela Propag.
Segundo João Batista, auditor fiscal do SEF, se somarmos as dívidas de curto prazo, o buraco nas contas públicas ultrapassa os R$ 188,7 bilhões, passando para R$ 195,9. Esse aumento de pouco mais de R$ 7 bilhões refere-se ao saldo do restante a pagar até dezembro deste ano de despesas incorridas em anos anteriores.
A auditora fiscal Maria Lúcia Fattorelli, coordenadora nacional da Auditoria Cidadã de Dívidas, organização não governamental que defende uma auditoria das dívidas públicas do estado, diz que a principal causa do aumento desses valores são os altos juros cobrados no refinanciamento de dívidas com a União e o não pagamento pelo Estado das parcelas desta dívida.
“O que ele (Zema) não pagou foi incorporado ao estoque da dívida. Todo este crescimento deveu-se a taxas de juro excessivamente elevadas. E se não quitarem, aplicam também juros sobre a parcela não paga, ou seja, juros sobre juros, o que é anatocismo, outra ilegalidade”, diz Fatorelli, referindo-se ao termo usado para definir a prática de cobrança de juros sobre juros vencidos .
Segundo ela, essa dívida é ilegal desde a sua origem e nem deveria ser cobrada, pois esses recursos nunca entraram no tesouro do estado para a realização de obras e ações em benefício da população. “A maior parte diz respeito à dívida com a União, refinanciada desde 1998, e que inicialmente incluía passivos de bancos estatais que foram privatizados ou extintos. Ou seja, já começa com essa ilegitimidade. Inicialmente era cerca de R$ 14,8 bilhões e agora chegou a R$ 188,7 bilhões”, destaca.
“O estado já pagou”
O auditor destaca ainda que, desde 1998, quando essa dívida no valor de R$ 14,8 bilhões foi refinanciada pela União, por pressão de entidades do sistema financeiro – nacional e internacional –, o estado já pagou R$ 48,6 bilhões até 2023 , em valores não atualizados pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA). “O Estado já pagou mais de três vezes esta dívida contraída em 1998, e continua devendo dinheiro”, afirma o auditor.
O saldo de quanto foi pago em 2024 ainda não foi divulgado pelo Tesouro Nacional. Mas o governo afirma que o estado, desde outubro do ano passado, já quitou três parcelas da dívida no valor de R$ 819,6 milhões. Foram pagos R$ 286,7 milhões em outubro, R$ 291,7 milhões em novembro, R$ 296,2 milhões em dezembro e R$ 303,7 milhões neste primeiro mês de 2025.
O vice-presidente do Sinfazfisco-MG defende a adesão imediata do governo estadual à Propag para evitar prejuízos e o aumento ainda maior da dívida do estado com a União. Segundo Soares, por meio do RRF o governo terá que pagar R$ 14 bilhões por ano em parcelas da dívida. “Com a Propag você vai pagar R$ 5,66 bilhões, portanto, o prejuízo anual vai ultrapassar R$ 8 bilhões anuais, caso haja atraso ou não adesão à Propag”. O governo afirmou que migrará para a Propag até o final deste ano.
Contudo, a coordenadora nacional da Auditoria Cidadã da Dívida é crítica à Propag que, segundo ela, não vai resolver o problema, apenas securitizá-lo. Para Fatorelli, essa dívida deveria ser extinta, pois não teria legitimidade, e o perdão não causaria prejuízos à União, devido à reserva de caixa para sustentar esta decisão. Além disso, destaca o auditor fiscal, os estados teriam mais recursos para investir em ações e realizar obras para melhorar a vida da população.
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