A novela das emendas parlamentares ganhou um novo capítulo no início do ano. Após um final turbulento de 2024, com decisões do ministro Flávio Dino, do Supremo Tribunal Federal (STF), que liberou apenas parcialmente o pagamento de recursos, apesar de apelos da Câmara e do Senado, nesta sexta-feira, o magistrado fez um novo movimento : determinou a suspensão de pagamentos destinados a organizações não governamentais (ONGs) que descumprirem critérios de transparência.
Dino já havia determinado, em agosto do ano passado, que as ONGs que receberem recursos reportassem na internet e com transparência os valores decorrentes de alterações de qualquer modalidade recebidas de 2020 a 2024. Ele também determinou que a Controladoria-Geral da União (CGU) deveria fazer uma espécie de auditoria para avaliar se a decisão foi cumprida.
A CGU identificou que, das 26 organizações que deveriam cumprir a intimação, metade não deu a transparência adequada ou não divulgou as informações.
Segundo relatório da agência, nove entidades (35%) apresentam informações incompletas e apenas quatro atendem aos critérios. A pesquisa, realizada por amostragem, selecionou 26 ONGs de um total de 600 que recebem recursos. A escolha foi feita levando em consideração o volume de recursos.
O relatório traz informações importantes para o julgamento de ações no STF que tratam da transparência no repasse de recursos via emendas parlamentares, tema central na pauta do tribunal.
“Nesse contexto, a ausência ou insuficiência de transparência ativa dificulta o controle, especialmente o controle social, essencial para uma fiscalização adequada e garantia de responsabilização na aplicação dos recursos públicos”, cita o relatório da CGU.
Diante do relatório, o ministro escreveu: “(determino) a suspensão imediata dos repasses às entidades que não apresentem a devida transparência ou não divulguem as informações exigidas, nos termos do relatório da CGU, com o registro das referidas entidades em no Cadastro de Pessoas Jurídicas Privadas sem Fins Lucrativos Proibidos (Cepim) e no Cadastro Nacional de Empresas Inabilitadas e Suspensas”.
Caberá à Advocacia-Geral da União (AGU) notificar os ministérios para que parem de enviar repasses. As ONG também devem ser notificadas. “(Determino) a intimação das entidades que apresentem as informações exigidas de forma incompleta, para que cumpram integralmente a determinação da transparência, com a publicação em seus sites dos valores recebidos de emendas parlamentares (de todas as espécies) e nas quais foram aplicadas ou convertidas, no prazo de 10 (dez) dias corridos (que fluem imediatamente, a contar desta data), sob pena de suspensão de novas transferências”, decidiu o ministro.
Dino também determinou que a CGU faça auditoria específica nas 13 entidades que não atendem aos critérios de transparência. O prazo para envio do relatório é de 60 dias.
O juiz também determinou que a Câmara dos Deputados e o Senado Federal sejam convocados para comentar o relatório da CGU que constatou a falta de transparência nos recursos enviados às organizações.
O ministro do STF é relator de ações que questionam a transparência no uso desses recursos públicos. Herdou participações em emendas parlamentares que antes estavam sob responsabilidade do Ministra Rosa Weber, que se aposentou da Corte em setembro de 2023. O magistrado, que foi governador e ministro da Justiça e Segurança Pública no governo Lula, assumiu sua cadeira na Corte.
Impasse
Em agosto de 2024, Dino suspendeu — com aprovação dos colegas do STF — o pagamento de todas as emendas obrigatórias (aqueles cujo pagamento é obrigatório) até que o Congresso Nacional aprove uma lei para facilitar o rastreamento do dinheiro. O assunto causou uma bola de neve: impactou a articulação do governo com o Congresso e, como bônus, a aprovação do Orçamento da União.
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A situação se agravou depois que a Câmara e o Senado aprovaram um projeto que pouco avançava nas questões levantadas pelo Supremo. Dino liberou pagamentos de emendas, mas exigiu mais transparência. A divulgação foi suficiente para o governo aprovar os projetos do pacote de corte de gastos no Congresso, mas irritou os líderes partidários.
Após o recesso do Legislativo, Dino suspendeu o pagamento de R$ 4,2 bilhões em emendas de comissão indicadas por líderes da Câmara. Ele argumentou que os recursos deveriam ser aprovados em comitês, o que não aconteceu. Ele também negou a liberação de R$ 2,5 bilhões em emendas ao Senado. Aí ele voltou e liberou parte dos valores.
O ritmo de trabalho de Dino durante esse recesso no Judiciário tem chamado a atenção. Em menos de duas semanas, o magistrado proferiu sete sentenças relacionadas às emendas parlamentares.
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