Depoimento de Anielle revela detalhes da acusação…

Depoimento de Anielle revela detalhes da acusação…


Anielle Franco escolheu um restaurante privativo, relativamente distante da região mais movimentada de Brasília, para uma conversa que deveria ser definitiva. Desde que assumiu o Ministério da Igualdade Racial, no início de 2023, ela foi alvo de constrangimento e assédio por parte de um colega, o ministro Silvio Almeida, dos Direitos Humanos. Os dois se conheceram durante o período de transição governamental e ficaram muito próximos após assumirem o cargo. Aos poucos, as conversas descontraídas do início do relacionamento deram lugar a avanços com conotações sexuais. O ministro olhava para Anielle com olhares de soslaio, fazia “elogios” inconvenientes, sussurrava fantasias eróticas em seus ouvidos e, na mais ousada das incursões, chegava a pousar a mão entre as pernas do ministro. O encontro no restaurante foi a última tentativa de Anielle de pôr fim a uma situação “insustentável”, que já havia chegado ao conhecimento de outros ministros, importantes assessores do Palácio do Planalto e do próprio presidente da República. Ela tentou evitar que o caso virasse escândalo, mas, segundo seu relato, não funcionou.

Na sexta-feira, 6, Silvio Almeida foi demitido após o site Metrópoles revelar que a ONG Me Too Brasil recebeu denúncias de assédio sexual contra ele e que Anielle seria uma das vítimas. Pouco antes de perder o cargo, o ministro negou as acusações, disse ter sido vítima de perseguição, exibiu um conjunto de mensagens que atestavam que mantinha apenas uma relação cordial com o ministro e citou o encontro no restaurante como prova da sua inocência. O que Almeida não sabia é que Anielle já havia prestado depoimento detalhado sobre o caso, inclusive sua versão do encontro no restaurante. Diante dos ministros Vinícius Marques de Carvalho (Controladoria-Geral da União), Jorge Messias (Procurador-Geral da União), Cida Gonçalves (Mulher) e Esther Dweck (Gestão), Anielle confirmou que vem sendo assediada “há vários meses” , relatou diversos episódios em que o colega se dirigiu a ela com palavras de “lascívia” e descreveu cenas em que seus ombros e costas foram apalpados de forma absolutamente inadequada. Confirmou ainda que ficou completamente “desconcertada” num dia em que Almeida tocou nas suas partes íntimas debaixo da mesa, durante uma reunião de trabalho e na presença de várias autoridades.

NO MINISTÉRIO – Assédio: ministra disse que teve suas partes íntimas tocadas durante reunião
NO MINISTÉRIO – Assédio: ministra disse que teve suas partes íntimas tocadas durante reunião (Thayane Alves/.)

No seu depoimento, a ministra descreveu os vários ataques a que foi alvo e explicou o contexto em que aceitou jantar com o colega, mesmo depois de tudo o que ele já tinha feito. Ela conta que o convite partiu dela e o objetivo era tentar convencer o colega a mudar de comportamento e evitar um escândalo que pudesse comprometer a carreira de ambos. Foi, aliás, um jantar cordial, como disse a ministra na sua versão. A certa altura da conversa, Almeida reconheceu ter ido além e até se arrependeu. Ao sair do restaurante, porém, o ministro se aproximou de Anielle e, como se nada tivesse acontecido, sussurrou-lhe um desejo ao ouvido —uma expressão impublicável. Em seu relato aos colegas de ministério, Anielle destacou que, mesmo sofrendo assédio sexual de forma recorrente há mais de um ano, não formalizou a denúncia por medo de ser desacreditada e perder o cargo por não poder para provar as acusações — um problema enfrentado pela grande maioria das vítimas de assédio. “Como são crimes que quase sempre não deixam vestígios materiais, temos a palavra de um contra a palavra de outro”, destaca a ex-procuradora Gabriela Manssur, especialista na defesa dos direitos das mulheres.

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Silvio Almeida negou todas as acusações e disse ter sido vítima de uma armação política. Antes de ser demitido, ele também foi ouvido por colegas do governo. O ministro relatou que houve disputa de protagonismo com Anielle em relação ao combate ao racismo, mas que isso, embora tenha gerado algumas disputas, nunca atrapalhou o bom relacionamento entre elas. Pelo contrário. Os dois conversavam com frequência, tinham certa intimidade e compartilhavam projetos. Para comprovar o que dizia, Almeida selecionou um conjunto de mensagens que trocou com o ministro de novembro de 2022 a março de 2024. Os diálogos, segundo ele, mostram uma relação que seria incompatível entre uma vítima de assédio e seu suposto algoz. Há promessas de fidelidade, demonstrações de carinho e elogios mútuos. “Quero ser seu parceiro, a pessoa em quem você pode confiar. Eu não estava bêbado quando conversamos ontem no avião de relações públicas…”, escreveu ele em agosto do ano passado. Os dois acabavam de retornar de uma viagem oficial ao exterior. “Minha admiração por você é imensa. A última coisa que quero é que tenhamos problemas”, respondeu Anielle. Na ocasião, organizaram um jantar para “ajustar o relógio”. “Quero recomeçar com você”, destaca Almeida. “Eu também”, responde Anielle. Dias depois, o ministro envia foto de ambos. O ministro comenta: “Estamos lindas, Anielle!” E acrescenta: “Esse seu vestido é deslumbrante”. “Foi muito f. né!?”, ela concorda, sugerindo uma legenda para a imagem: “Linda, negra, competente e ainda ministra”. No dia em que a ministra afirma ter sido surpreendida pela mão tola da ministra, há registro de uma ligação perdida dela para ele após a reunião.

NO RESTAURANTE - Jantar: mais uma tentativa de convencer um colega a mudar de comportamento
NO RESTAURANTE – Jantar: mais uma tentativa de convencer um colega a mudar de comportamento (@brasiliapalace/Instagram)

Rumores sobre o assédio ao chefe da Igualdade Racial já circulavam em vários gabinetes importantes de Brasília, inclusive no do Presidente da República. Alguns ministros conheciam detalhes. Porém, como a acusação de assédio não havia sido formalizada, os assessores de Lula tentaram contornar o problema para evitar os danos políticos que a acusação certamente causaria. Amiga de Anielle Franco, a primeira-dama, Janja da Silva, entrou no circuito e ouviu detalhes do assédio sexual da própria ministra. Anielle, porém, não estava disposta a levar o caso adiante e, segundo a versão de Almeida, nada havia acontecido, então era melhor deixar como estava. Nas últimas semanas, os dois nem se cumprimentaram mais. Um dia antes de estourar o escândalo, eles compareceram a um evento oficial. Eles nem se entreolharam e Anielle saiu do local antes que o ministro falasse. Uma dificuldade comum na investigação de crimes de assédio e assédio sexual é a produção de provas. As abordagens geralmente são realizadas quando a vítima está sozinha ou longe de ambientes públicos. Acusações falsas são raras, mas também existem.

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CASO ENCERRADO - Lula e Macaé, o novo Ministro dos Direitos Humanos: rumores circulavam pelo Planalto há meses
CASO ENCERRADO – Lula e Macaé, o novo Ministro dos Direitos Humanos: rumores circulavam pelo Planalto há meses (Ricardo Stuckert/PR)

A denúncia contra o ministro foi publicada na noite desta quinta-feira, 5. Horas depois, durante a madrugada, ele foi solicitado a prestar esclarecimentos. Em seu depoimento, relatou aos ministros Vinícius Marques de Carvalho, Jorge Messias e Paulo Pimenta (Secretaria de Comunicação Social) que as acusações, além de infundadas, eram fruto de uma disputa política entre militantes com agendas identitárias e faziam parte de um movimento de desacreditá-lo, orquestrado por um advogado ligado ao Grupo Prerrogativas. Nas primeiras horas da manhã, Almeida procurou conselhos de amigos. Dois deles foram informados de que ele provavelmente tiraria a própria vida. Ele não parecia um blefe. Desorientado, repetiu que sua vida pessoal e carreira profissional estavam arruinadas. Um advogado nomeou um psiquiatra e outro o aconselhou a deixar o cargo para se dedicar à preparação de sua defesa e evitar constrangimentos ao governo. Mais tranquilo, ainda nas primeiras horas da manhã, ligou para uma assessoria do presidente da República para comunicar a decisão. Era tudo o que o Planalto queria.

SOLIDARIEDADE - Janja: primeira-dama ouviu reportagem direta de Anielle
SOLIDARIEDADE – Janja: primeira-dama ouviu reportagem direta de Anielle (@janjalula/Instagram)

Lula não precisaria se dar ao trabalho de demitir o ministro e apagaria o incêndio em poucas horas. Ficou acertado que Almeida conversaria com o presidente ainda naquele dia e anunciaria sua renúncia. O ministro, porém, mudou de ideia. Antes do encontro com o presidente, ele divulgou nota afirmando que as acusações contra ele eram “conclusões absurdas”, acusou o grupo Me Too de ter tentado interferir em uma licitação e disse que pediria ao Ministério Público e órgãos governamentais que realizassem realizar uma “investigação rigorosa” do caso. Na audiência com Lula, ele disse que não iria renunciar, reafirmou sua inocência e tentou mostrar as provas que tinha: o vídeo do jantar com Anielle e as mensagens de WhatsApp trocadas com o ministro. Lula ouviu as explicações, mas já tinha o veredicto. O novo Ministro dos Direitos Humanos, Macaé Evaristo, tomará posse na próxima semana. Para o Planalto, o caso está encerrado.

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Publicado em VEJA em 13 de setembro de 2024, edição nº. 2910



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