Camilo Santana passa a ser visto cada vez mais com…

Camilo Santana passa a ser visto cada vez mais com…


Nos últimos anos, o PT acumulou uma série de derrotas nas urnas, viu seu capital político diminuir em todo o país e se agarrou à figura de sua principal referência histórica, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que retornou ao Planalto em 2022 apoiado por uma ampla coligação. Lula já almeja uma nova candidatura em 2026, mas a empreitada dependerá principalmente de suas condições físicas (o petista terá quase 81 anos e, recentemente, teve problemas de saúde) e, claro, de políticas. Em público, ninguém fala sobre uma possível mudança de planos. Nos bastidores, a conversa é diferente. Uma das grandes questões que cercam o PT é quem, afinal, poderá substituir o dirigente máximo se isso for realmente necessário. O nome mais óbvio é o do ministro Fernando Haddad (Finanças), que concorreu à presidência contra Jair Bolsonaro em 2018, quando Lula estava preso. O seu capital eleitoral, no entanto, dependerá muito do sucesso incerto da economia de hoje.

Entre os nomes que estão por aí como alternativas, quem está em melhor momento é Camilo Santana, titular da Educação. Começou a ser discutido como um possível plano B principalmente pela bancada de Gleisi Hoffmann, presidente do partido e rival interna de Haddad. Camilo tem seus trunfos para tentar vencer essa disputa. Uma pesquisa do IPEC de dezembro mostrou que a educação é avaliada positivamente por 37% do eleitorado, como regular por 27% e como ruim ou péssima por 34%. Pode não ser surpreendente, mas é a única área entre as nove pesquisadas em que a avaliação positiva supera a negativa. Na mesma pesquisa, o combate à inflação, missão da pasta de Haddad, foi considerado ruim ou péssimo por 47% dos brasileiros.

Um dos responsáveis ​​pela boa avaliação de Camilo é o programa Pé-de-Meia, que oferece bolsas de estudos para estudantes do ensino médio e que já se tornou o quinto maior programa social do governo, com 4 milhões de beneficiários e 12,5 bilhões de reais pagos em 2024. O iniciativa, lançada em 2023, só tem menos recursos que Bolsa Família, BPC, Seguro Desemprego e Abono Salarial e supera, entre outros, Auxílio Gás e Programa Popular Farmácia. O sucesso é tamanho que o governo já implementou sua expansão, na forma de duas novas modalidades criadas com o objetivo de aumentar o número de professores na rede pública. No caso das Licenciaturas Pé-de-Meia, os alunos que optarem por se formar no bacharelado poderão receber 1.050 reais por mês durante o curso. O Mais Professores para o Brasil, voltado para professores recém-formados, prevê o pagamento de uma bolsa mensal de 2,1 mil reais — além do salário pago pela instituição contratante e benefícios adicionais, como cartão de crédito de bancos oficiais. Assim como o Mais Médicos, o objetivo é incentivar a ida dos profissionais à rede pública e regiões vulneráveis ​​e de difícil acesso.

Além do momento favorável na Esplanada, Camilo se fortaleceu com sucessivas vitórias eleitorais. Após dois mandatos como governador do Ceará, o ministro foi eleito senador com mais de 70% dos votos e fez seu sucessor, Elmano de Freitas, ainda no primeiro turno em 2022. No ano passado, liderou o prefeito de Fortaleza, Evandro, à vitória Leitão, único petista a ganhar capital nas eleições. Camilo é hoje visto como o chefão de seu grupo político no estado e já emprestou nomes de sua antiga gestão ao atual governador. Com um início de mandato turbulento, Elmano promoveu uma mudança em sua secretaria e trouxe de volta ao cargo o ex-secretário da Casa Civil de Camilo, Chagas Vieira. Camilo também faz alianças da esquerda para a direita, como é o caso do acerto com o PSD, que conquistou a vice-prefeita de Fortaleza, Gabriella Aguiar.

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BOM VOTO - Elmano de Freitas (esquerda) e Evandro Leitão (centro), com o padrinho: vitórias fortalecem posição do PT
BOM VOTO – Elmano de Freitas (esquerda) e Evandro Leitão (centro), com o padrinho: vitórias fortalecem posição do PT (Reprodução/Instagram)

Outro ponto que pode pesar a favor do ministro em 2026 é o fato de ele ser nordestino, atualmente o único grande feudo eleitoral do PT. Camilo e Elmano têm insistido na presença de Lula no estado. Ambos convidaram o presidente para a inauguração do Hospital Universitário do Ceará (HUC), marcada para fevereiro —é muito provável que o petista compareça ao evento. Aliados dizem que o estreitamento do relacionamento interpessoal entre o presidente e o ministro foi patrocinado pela primeira-dama Janja, a quem, como sabemos, Lula escuta. Além disso, o Nordeste tem exigido maior participação no comando e nas decisões do PT. Aliado de Camilo e conterrâneo, deputado e líder do governo na Câmara, José Guimarães (PT-CE), é candidato à liderança do partido e conta ainda com o apoio de Gleisi Hoffmann. A candidatura de Guimarães, porém, poderá ser afetada pelas investigações sobre emendas parlamentares no Ceará (leia o relatório na página. 26).

Embora a economia seja sempre relevante e outros temas, como a segurança pública, tenham ganhado força nos últimos anos, a educação é uma excelente vitrine numa disputa eleitoral. Camilo tem grandes números para apresentar na área. A rede estadual de ensino teve o maior número de alunos com notas acima de 950 na redação do Enem deste ano em comparação aos demais estados. Ao lado de São Paulo, o Ceará também lidera o ranking das escolas públicas – federais e estaduais – com as melhores notas no Ideb, índice que avalia a educação básica. Importantes investimentos na área estão em andamento neste estado nordestino. Este é o caso campus do ITA, o prestigiado Instituto Tecnológico de Aeronáutica, o primeiro fora de São José dos Campos (SP). O motivo dado por Lula: mais de 30% dos aprovados na instituição são cearenses.

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REPETIÇÃO – Lula e Haddad, então chefe do MEC: ministério o lançou na política
REPETIÇÃO – Lula e Haddad, então chefe do MEC: ministério o lançou na política (Reprodução/Instagram)

Se Camilo viabilizar sua ascensão política devido à sua atuação na educação, terá ocorrido uma bela ironia política. Foi sua atuação nesta mesma área e nesta mesma posição que catapultou politicamente seu “concorrente” Fernando Haddad. Programas como o Prouni e o Fies, a criação de universidades e institutos federais e a reformulação do Enem fizeram dele um dos ministros mais conhecidos dos primeiros mandatos de Lula. Suas conquistas o qualificaram inclusive para ser eleito prefeito de São Paulo em 2012 — já em sua estreia eleitoral — e para ser candidato à presidência em 2018, quando foi ao segundo turno contra Bolsonaro.

Por enquanto, entre as fileiras do PT, a diretriz é que Lula seja o candidato para 2026 —e só não será se não quiser ou não puder. Por volta de 2030, então as apostas estão abertas. “Lula é candidato e continua sendo a única alternativa para unificar e reconstruir o país”, afirma Marco Aurélio de Carvalho, coordenador do grupo de advogados Prerrogativas e próximo de Lula. Ele considera que o partido tem boas perspectivas para daqui a cinco anos e destaca a importância de Haddad até em ações que dêem visibilidade ao MEC. “Haddad é um nome nacional, e muitos programas, inclusive o Pé-de-Meia, foram realizados graças ao Tesouro. Camilo é ótimo, mas ainda não se nacionalizou”, afirma.

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ESTRATÉGIA - Gleisi: adversária de Haddad, ela apoia ascensão do Nordeste na máquina partidária
ESTRATÉGIA – Gleisi: adversária de Haddad, ela apoia ascensão do Nordeste na máquina partidária (//PT)

Com todos os prós e contras, a continuação da trajetória ascendente de Camilo Santana dependerá de vários fatores, incluindo o sucesso geral do governo. Um revés na economia, segundo aliados, poderia até favorecê-lo como “alternativa” a Haddad, mas isso não significa que herdará algum capital de Lula. Pesquisa da semana passada da Paraná Pesquisas testou pela primeira vez o nome de Camilo na disputa pelo Planalto: ele teve 6,9% das intenções de voto e ficou atrás de Ciro Gomes e Tarcísio de Freitas (ambos com 27,8%) e empatou na margem de erro com Ronaldo Caiado (8,8%). A mesma pesquisa mostra, porém, que 42,6% dos brasileiros classificam o governo como ruim ou péssimo. Para o diretor do instituto, Murilo Hidalgo, todos esses fatores vão pesar na disputa: “Camilo é jovem, um novo líder do Nordeste, mas, no final das contas, a escolha do candidato vai depender da economia”, entende. .

Há outra questão: embora Camilo tenha o direito de explorar os seus pontos fortes nesta área, o facto é que o país tem um longo caminho a percorrer no que diz respeito à educação. O último Ideb, que já abrangia 2023, primeiro ano do atual mandato, mostrou que o Brasil não atingiu suas metas no ensino fundamental e médio. Uma pesquisa internacional, a Pisa, com dados até 2022, mostrou a educação brasileira na parte inferior do ranking em matemática, leitura e ciências e longe dos países desenvolvidos. Camilo pode ter algo para mostrar, mas é inegável que ainda tem muito dever de casa para fazer.

Publicado em VEJA em 17 de janeiro de 2025, edição nº 2.927



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