Este ano deverá intensificar a embate entre Congresso e Supremo Tribunal Federal (STF)dependendo do clima entre os parlamentares após o bloqueio de costura de comissão. A oposição e membros do Centrão prometem avançar para aumentar a sua influência sobre o Orçamento, além de tentarem aprovar agendas que reduzam os poderes dos ministros da Corte.
O Palácio do Planalto, por sua vez, também poderá sofrer com a briga e ver a aprovação de agendas bomba e dificuldades para avançar textos de seu interesse, como já vem acontecendo nos últimos dois anos.
Entre as principais reações desencadeadas está uma proposta de emenda à Constituição (PEC) para aumentar o valor destinado no Orçamento às emendas obrigatórias, ou seja, que o governo é obrigado a pagar.
O texto foi apresentado pelo deputado Altineu Côrtes (PL-RJ), líder do PL na Câmara, e está em fase de coleta de assinaturas. Pelo menos 100 parlamentares já deram sua aprovação à matéria, que exige a tramitação de 171 itens. Pelo texto, o valor destinado às alterações da comissão, que não são obrigatórias, seria repassado para reforçar o caixa para alterações individuais e obrigatórias.
Se votada e aprovada, a medida reduzirá ainda mais o poder de barganha do Executivo com os parlamentares. As emendas obrigatórias são destinadas a todos os deputados e senadores, sejam da base ou da oposição, enquanto as emendas não obrigatórias são utilizadas pelo governo como moeda de troca na aprovação de pautas importantes, como ocorreu em dezembro, com a votação do corte pacote de gastos e regulamentação da reforma tributária.
Também ganha força pacote anti-STF, uma série de propostas que tentam limitar a força do Tribunal. As duas principais são: a PEC 8/2021, que limita decisões monocráticas de ministros do STF que interfiram com outros Poderes; e a PEC 28/2024, que permite ao Congresso suspender decisões do Supremo. Além disso, dois projetos de lei (PLs) fazem parte do pacote e aumentam as possibilidades de os ministros do STF responderem aos processos de impeachment.
As quatro propostas foram aprovadas pela CCJ da Câmara em outubro, em retaliação ao primeiro bloqueio de emendas parlamentares. Com aprovação no colegiado, os projetos já podem ser apreciados em plenário, mas as PECs deverão passar por comissões especiais.
Parlamentares da oposição pretendem pressionar para que os textos sejam colocados em pauta quando voltarem do recesso, em fevereiro, mas dependem da eleição da Mesa Diretora e da mudança no comando da Câmara.
Outra prioridade da oposição ao Supremo Tribunal Federal é a Anistia PLque prevê indulto aos condenados pelo STF por crimes cometidos nos ataques de 8 de janeiro.
O texto chegou a ser usado como moeda de troca para angariar apoio ao próximo presidente da Câmara. Em outubro, o atual titular, Arthur Lira (PP-AL), anunciou a abertura de uma comissão especial para analisar o assunto, mas a ideia foi deixada de lado.
Candidato mais provável para assumir o cargo em 2025, Hugo Motta (Republicanos-PB), evitou se posicionar abertamente sobre a proposta. Porém, sinalizou que fará uma gestão conciliatória e que quer evitar confrontos com os demais Poderes.
Governo à vista
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva manifestou preocupação com a nova escalada de tensão entre Congresso e STF —principalmente porque o Executivo também é alvo de insatisfação parlamentar. Além da conversa que teve com o presidente da Câmara, Arthur Lira, para discutir o bloqueio das emendas, feito pela Corte, Lula convocou Hugo Motta para uma conversa na Granja do Torto na última sexta-feira.
Tanto Lula quanto Motta demonstraram desejo de acalmar as tensões entre os Poderes e buscar uma relação mais tranquila do que nos dois primeiros anos de gestão federal. A expectativa é que o paraibano, com perfil mais conciliador que Lira, evite focar nos chamados temas bomba e em assuntos que limitam as competências do Judiciário.
Os parlamentares também criticam o Planalto e acusam um “jogo concertado” com o STF, já que o bloqueio de costura Beneficia o governo federal e limita o progresso do Congresso no Orçamento – algo que incomoda Lula desde que assumiu o cargo.
Os interesses do Judiciário e do Executivo também se alinharam em outros embates, como a definição da inconstitucionalidade do marco temporal e a autorização do porte de maconha para uso pessoal, o que aumenta a desconfiança.
O temor de Lula é que o cenário tenso dificulte ainda mais a aprovação de agendas importantes para o governo em 2025. O presidente e seus auxiliares têm trabalhado com líderes do Parlamento para distanciar o Planalto de bloquear as emendas. Ao mesmo tempo, evita comentar a decisão do ministro Flávio Dino e orientou a Advocacia-Geral da União (AGU) a não recorrer.
Lula também vetou, no último dia de 2024, trechos da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), aprovada pelo Congresso, que limitavam o bloqueio de emendas parlamentares em caso de necessidade de ajustes nas contas públicas. Na proposta aprovada, apenas alterações não obrigatórias, como as feitas em comissão, poderiam ser suspensas pelo Executivo. O Planalto justificou, no veto, que a medida contraria as regras estabelecidas pelo STF. Como os vetos presidenciais ainda precisam ser avaliados pelo Congresso, os parlamentares podem derrubá-los.
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Corte acionado
Um dos argumentos apresentados por ministros do Supremo para negar a tese de perseguição a parlamentares é que o STF só age quando provocado. Parte das ações que causaram insatisfação no Congresso teve origem nos próprios partidos políticos.
Um exemplo é o bloqueio de emendas, ocorrido após atuação do PSol, Novo e entidades da sociedade civil. No PSol, o recurso foi feito após denúncias do deputado Glauber Braga (RJ) sobre a atuação de Lira.
Na segunda-feira, Braga ainda se dispôs a participar do inquérito aberto pela Polícia Federal, a mando de Dino, para apurar possíveis irregularidades no repasse de emendas.
“Farei a palavra no inquérito sobre o orçamento secreto, aberto a pedido do ministro Flávio Dino, assim que for chamado pelo delegado da Polícia Federal. Reafirmarei as acusações que já fiz em relação à atuação de Arthur Lira”, disse o deputado.
O partido também ganhou destaque por ter ajuizado a principal ação que levou ao julgamento da inconstitucionalidade do prazo de demarcação de terras indígenas, em 2023, outra pauta que contrariou o Congresso.
Para os parlamentares, o STF avança em questões de competência do Legislativo. Os ministros argumentam, porém, que a demora nos debates nas duas Casas faz com que a Justiça seja chamada com mais frequência e acabe tendo que se manifestar.
No imbróglio das emendas, o partido Novo também ganhou destaque. Além de assinar a autoria da ação que levou ao bloqueio das alterações, ele pediu a Dino, em outro documento, que bloqueasse recursos do Ministério da Saúde que estavam sendo usados como “emendas disfarçadas” para compensar a falta de comissão alterações destinadas ao setor.
Dino, porém, negou o pedido, argumentando que a liberação de recursos do ministério cabe ao Orçamento Executivo, mas que as decisões do Tribunal sobre emendas estão relacionadas a recursos do Legislativo.
Em outro caso, o da desoneração da folha de pagamento, foi o governo quem acionou o STF para bloquear o projeto de lei aprovado pelo Congresso, que foi considerado inconstitucional pela Corte.
Confrontos entre os dois Poderes
SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL
Emendas parlamentares
Em agosto, uma decisão do ministro do STF Flávio Dino bloqueou pela primeira vez o pagamento de emendas parlamentares até a criação, pelo Executivo, Legislativo e Judiciário, de novas regras de transparência. Os repasses foram liberados no início de dezembro, mas bloqueados novamente por Dino no dia 23 por suspeita de irregularidades na indicação de R$ 4,2 bilhões em aditivos.
Comissão sobre prazo
Após o STF aprovar em 2023 a inconstitucionalidade do marco temporal para demarcação de terras indígenas, contrariando a PEC aprovada pelo Congresso, este ano a Corte criou uma comissão especial para discutir o tema, com a participação de todos os Poderes e da sociedade civil. O debate continua em 2025.
Descriminalização da maconha
Em junho, o STF definiu em 40 gramas a quantidade de maconha que pode ser portada para que o indivíduo seja enquadrado como usuário, ou seja, não responda a acusações criminais. Os parlamentares reagiram afirmando que o STF estava ultrapassando as prerrogativas do Legislativo.
Alívio da folha de pagamento
Após o Congresso aprovar a manutenção da desoneração tributária para alguns setores produtivos, o governo recorreu ao STF, que declarou a medida inconstitucional e suspendeu alguns pontos da lei aprovada. O STF também determinou que os poderes Executivo e Legislativo chegassem a um consenso sobre o assunto, que negociou o fim gradual da medida até 2028.
CONGRESSO
Pacote anti-STF
A Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara aprovou quatro propostas para limitar a atuação do STF: duas PECs que limitam decisões monocráticas de ministros do Supremo e permitem que o Congresso anule decisões do STF; e dois projetos de lei que aumentam as possibilidades de crimes de responsabilidade e impeachment de magistrados.
PEC das Drogas
Em resposta ao julgamento do STF sobre o porte de até 40 gramas de maconha, o Senado Federal aprovou uma PEC que criminaliza o porte de qualquer quantidade de drogas ilícitas. O texto, porém, ficou paralisado na Câmara por conta das eleições municipais.
PEC da Imunidade Parlamentar
Em dezembro, a oposição apresentou uma PEC para ampliar a imunidade parlamentar e punir os ministros do STF que a desrespeitarem. O texto foi escrito pelo deputado Bibo Nunes (PL-RS) e foi uma reação ao indiciamento dos deputados Marcel Van Hattem (Novo-RS) e Cabo Gilberto Silva (PL-PB) pela Polícia Federal pelos crimes de calúnia e difamação do deputado da PF Fábio Alvarez Shor, após falas de parlamentares no plenário.
PEC da Anistia
O presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), deu continuidade ao projeto que concedia anistia aos condenados pelo STF pelos crimes dos atentados de 8 de janeiro e autorizou a criação de uma comissão especial para analisar o texto. Porém, o colegiado nunca foi instalado.
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