Relatora da ONU destaca lições do julgamento do caso Gisèle Pelicot na França

Relatora da ONU destaca lições do julgamento do caso Gisèle Pelicot na França


A relatora especial da ONU* sobre violência contra mulheres e meninas, Reem Alsalem, afirmou nesta terça-feira que o julgamento do caso Gisèle Pelicot deve servir de alerta sobre o nível de violência sexual sofrida por mulheres e meninas.

Em 19 de dezembro, Dominique Pelicot, de 72 anos, foi condenado a 20 anos de prisão por drogar e estuprar repetidamente sua ex-mulher, Gisèle Pelicot, durante vários anos em Mazan, França.

Coragem e resiliência extraordinárias

Ele também facilitou o crime de terceiros, filmando e distribuindo imagens da violência sexual que ela sofreu. O abuso hediondo durou mais de uma década e envolveu pelo menos 72 outros homens, tornando-se um dos casos mais flagrantes de violação.

No julgamento na cidade francesa de Avignon, outros 50 homens foram condenados pela violência.

Alsalem disse que Gisèle Pelicot demonstrou “coragem e resiliência extraordinárias ao decidir ir além do seu próprio choque e tristeza para perder o anonimato e permitir que as provas destes crimes horríveis se tornassem públicas”.

O relator destacou que a sobrevivente mudou o debate público sobre estupro e punição.

Ela juntou-se a Gisèle Pelicot para homenagear vítimas não reconhecidas de crimes semelhantes que continuam a enfrentar imensas barreiras estruturais na sua busca por justiça.

Relatora Especial da ONU sobre violência contra mulheres e meninas, Reem Alsalem

Banalidade de estupradores

O relator da ONU considerou que uma das consequências mais significativas do julgamento foi revelar “a banalidade dos violadores na sociedade”.

Ela enfatizou que muitas vezes os criminosos “são homens comuns que têm famílias, empregos e responsabilidades aparentemente regulares”.

Para Alsalem, é preocupante que, apesar das evidências claras, os perpetradores do sexo masculino optem por rejeitar a sua responsabilidade por infligir “o que só pode ser descrito como tortura e tratamento desumano e degradante às mulheres”.

Pornografia e indústria farmacêutica

O julgamento trouxe à luz o impacto prejudicial da indústria pornográfica, bem como da tecnologia digital. A especialista afirmou que estes meios permitem e aceleram “a mercantilização, o abuso e a execução da violência masculina contra mulheres de todas as idades”.

O Relator Especial lembrou que, enquanto alguns Estados procuram alterar a definição de violação para incluir a falta de consentimento verdadeiro e significativo, cerca de 60 países nem sequer proibiram a violação conjugal.

Segundo ela, o ensaio de Mazan também demonstrou riscos crescentes que as mulheres e as raparigas enfrentam com a oferta de novas ferramentas de abuso, como as drogas.

Alsalem apelou aos Estados para que adoptem legislação apropriada para proibir e processar tais práticas, abordem eficazmente a violência facilitada pela tecnologia digital, incluindo a pornografia, e façam mais para mudar os estereótipos sexistas e misóginos generalizados contra mulheres e raparigas.

*Os relatores de direitos humanos são independentes da ONU e não recebem remuneração pelo seu trabalho.



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