Em seu novo livro Nostalgia do Sagrado (ed. PUC-PR), sociólogo francês e professor emérito da Sorbonne Michel MaffesoliAos 80 anos, ensaia o que chama de “retorno do sacro”, que seria a busca incessante pelo sentimento de pertencimento com o retorno do espiritismo. Com uma geração movida pela emoção e pela sensibilidade espiritual, as comunidades cibernéticas tornaram-se omnipresentes e ainda mais capacitadas. Em conversa com a coluna GENTE, Maffesoli comenta que essa formação de grupos faz parte de um retorno às tradições, marcado pelo abandono do interesse dos jovens pela política e pela dependência uns dos outros.
Em seu livro, você argumenta que há uma busca por novas formas de vivenciar a vida em sua plenitude. O que isto significa? Significa que estamos numa era de mudanças, saindo do que chamamos de “modernidade”, que começou no século XVII e terminou por volta do século XX. Agora estamos entrando na pós-modernidade. Nesta primeira fase, a mentalidade é de racionalismo, progressismo e individualismo. A questão principal é o regresso do espiritismo, o regresso à cultura, especialmente nas gerações mais jovens. Isto é o que vejo na França e na Europa como um todo, é um retorno à sensibilidade espiritual.
A pós-modernidade é ainda mais movida pela emoção? Sim. Não sei que termo você usa no Brasil, mas a palavra “emocional”, que também usamos na França, não é uma característica psicológica. Não significa simplesmente ser emocional. “Emocional” é um termo proposto por Max Weber na Alemanha para chamar a atenção para uma atmosfera geral. Significa que o que havia sido abandonado, as paixões, os afetos, os sentimentos, foram marginalizados e só restou o racionalismo. Podemos agora ver como estão se desenvolvendo esses outros parâmetros, sejam eles afetos ou paixões.
Essa busca se manifesta por meio da arte, da música, da interação social, entre outros? Não se trata de artistas oficiais, mas daqueles que, através das redes sociais, blogs, fóruns de discussão, o que chamamos de cibercultura, difundem cultura. As novas gerações, de certa forma, estão se tornando artistas. A frase que uso em francês, tentarei traduzir, é “faça da sua vida uma obra de arte”.
Como isso pode impactar diretamente os jovens? É uma geração onde o individualismo não prevalecerá, mas a comunidade sim. Há muito tempo publiquei um livro primeiro no Brasil antes de aparecer na França, Le Temps des Tributos. Fiz isso de propósito para dizer tribo, comunidade. É isso que parece estar em jogo agora. Eu particularmente apoio essas novas gerações, existe mais essa vontade de estarmos juntos. Isso é comunidade, isso é tribo. E aqui encontramos a velha ideia, no sentido etimológico, de religião, de estar ligado ao outro. É isso que leva a esta visão de viver em comunidade.
E qual é o papel das redes sociais nisso? Nas redes sociais existe a ideia de compartilhamento, troca, solidariedade e generosidade. Toda uma série de termos que se referem ao facto de estas pequenas tribos, que hoje chamo de comunidades, se basearem essencialmente não no individualismo, mas no aspecto comunitário, no facto de dependerem dos outros.
Hoje existe uma busca incessante pelo sentimento de pertencimento nas redes sociais. É possível que o sentimento de pertencimento nunca seja satisfatório? É difícil ser profeta, mas na verdade percebo que há um lento processo de sedimentação, vejo isso no Brasil, na França, na Europa, na Coreia, na Itália… Há exemplos que mostram que a sociedade vai mudar completamente. O que vejo é uma mudança numa tendência marxista que os intelectuais representam e que tem cada vez menos influência nas novas gerações. Há, de facto, uma série de pequenos grupos que ultrapassam o individualismo e entram em comunhão com valores religiosos.
Como ocorre essa transformação no Brasil? É um país que me fascina em vários aspectos. Meu ponto de vista não é o fim da pós-modernidade, me parece que no Brasil essa pós-modernidade se manifesta com mais força. O Brasil é o laboratório da pós-modernidade, deste lado da comunidade, das dimensões espirituais. Frequento com frequência essas reuniões, seja em Salvador da Bahia, em Recife, ou mesmo em São Paulo, em Porto Alegre… Para mim são sinais da mudança que está acontecendo.
O que você observa nessas viagens? O ideal de comunidade. Recebi muitos estudantes do Brasil em Paris. Havia uma dimensão comunitária, eles estavam juntos, comiam juntos, caminhavam juntos. É um pouco de tribalismo.
É isso que destaca o retorno das tradições? É o regresso da tradição, das coisas antigas, mas não exactamente as mesmas que são hoje. É uma imagem de uma espiral. As coisas voltam e voltam, mas não são exatamente as mesmas. Este regresso à tradição faz-se com a ajuda da internet, de toda a cibercultura. Ele retoma elementos que vieram da Idade Média, das sociedades tradicionais, de antes dessa era do racionalismo, mas traz de volta essa ideia de um todo, incluindo o aspecto espiritual.
Qual é o perigo de combinar religiosidade com política? Os jovens estão cada vez menos preocupados com a política. Eles não participam mais de partidos políticos, sindicatos ou lutas políticas. Por outro lado, desenvolveram uma dimensão muito mais tradicional. Há uma saturação, um declínio no envolvimento político entre os jovens, um declínio que anda de mãos dadas com o desenvolvimento religioso.
Zygmunt Bauman argumentou que a sociedade estava se tornando líquida, sem laços profundos. O retorno das tradições mostra o retorno de relacionamentos sólidos? Conversei muito com Bauman, que me convidou para ir à Sorbonne e conheço bem sua tese sobre sociedade líquida. Mas concordamos na base, ou seja, quando ele vê uma sociedade líquida, de certa forma, é um pouco do que ele dizia: retomar elementos que pensávamos terem ficado para trás no progressismo e que, mais uma vez, voltaram . E a liquidez no livro de Bauman é algo interessante, porque é algo que não é fixo. Então concordo com a sua ideia de liquidez.
Desde a década de 1980 você fala de uma “tribo urbana”. Existe alguma diferença entre o que você analisou e o que você percebe hoje? Não há diferença real. Quando comecei a falar de tribos foi uma provocação, para mostrar que, de certa forma, podíamos ver o ideal de comunidade voltando. O exemplo que dei é que, na selva, a tribo lutava contra os animais. São selvas de pedra, o que significa que são urbanas. Na Europa não temos megacidades, mas o México, São Paulo, Detroit e Seul são selvas de pedra. E nessas selvas de pedra a tribo tem a mesma função, ou seja, ajudar uns aos outros.
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