Jards Macalé, 81 anos: as saborosas confidências de um ‘maldito’ da MPB

Jards Macalé, 81 anos: as saborosas confidências de um ‘maldito’ da MPB


Jards Anet da Silva nunca foi um bom jogador de futebol – mas o fato de ter sido um dos poucos músicos cariocas da década de 1970 a ter carro lhe garantiu uma vaga no time de Luiz Melodia, o Estácio Holly Futebol Clube. Sua principal missão não era fazer gols, mas sim percorrer cerca de 30 quilômetros do Estácio até o Recreio dos Bandeirantes, no Rio de Janeiro, para levar o grupo a uma partida no campo do Politheama, time de Chico Buarque. Na primeira oportunidade, Jards chutou o próprio Chico, que caiu drasticamente. “Bastou Melodia me tirar de campo. Não poderia faltar o dono da bola”, diz — fazendo jus ao apelido que recebeu quando criança e que hoje carrega como sobrenome: Macalé é uma “homenagem” ao jogador de pernas de pau do Botafogo da década de 1950.

Jards Macalé: Só faço o que quero – Fred Coelho

Naturalmente, ele nunca mais foi convidado para jogar. “Imagina se eu quebrasse a perna do Chico?”, riu em conversa com VEJA. Mas, como músico e compositor, nunca deixou de ser membro absoluto da elite da MPB — e, com o passar dos anos, só aumentou seu prestígio, acumulando também um manancial de histórias divertidas a partir de suas interações com colegas famosos. Aos 81 anos, o discreto Macalé dispensou grandes comemorações de aniversário e não pretende fazer nada de especial em 2025, quando completa sessenta anos de carreira. Recentemente ele fez um show emocionante na Casa Natura em São Paulo com músicas de seu novo álbum Coração Bifurcadolançado meses atrás.

Uma história da música popular brasileira: das origens à modernidade – Jairo Severiano

Celebrado pela nova geração de cantores e compositores, Macalé segue ativo e sem vontade de se aposentar, fazendo shows em pequenos espaços e olhando para o futuro — até mesmo cuidando da saúde com seu jeito curioso. Como odeia exercícios físicos, assumiu uma postura ousada no prédio onde mora, no Leme. “Sequestrei o personal trainer do Zezé Motta”, brinca. Ele explica que a atriz mora no sétimo andar do prédio dele e aproveitou a facilidade para contratar a profissional a fim de “desbloquear” seu físico para os shows. “Hoje tenho mais cuidado, porque não sei como serão os próximos 80 anos”, afirma.

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Grandes momentos Lá no alto, com Caetano Veloso em Londres; no centro, com Gal; e em festival na década de 1970: muitas histórias e parcerias (Pedro Paulo Koellreutter; @galcosta/instagram;/Arquivo pessoal)

Nascido na Tijuca e criado em Ipanema Macalé compôs ainda adolescente sua primeira música eu amo tanto. Anos depois, os versos dramáticos (“Meu amor, vim te dizer que sem você não sei viver / Vem comigo / Que sem o seu amor é melhor eu morrer”) seriam primorosamente gravados por Nara Leão (1942-1989) no álbum Nara pede passagem (1966). Compor para mulheres, aliás, tornou-se uma de suas especialidades, com gravações imortalizadas por Elizeth Cardoso (Meu mundo é seu), Clara Nunes (Mais que perfeito) e muitos outros. O novo álbum também conta com diversas dessas colaborações femininas, como Maria Bethânia em Mistérios do Nosso Amor. Com a cantora, Macalé tem uma cumplicidade notável. Aos 18 anos, quando se mudou da Bahia para o Rio para substituir Nara Leão no espetáculo Opinião, ficou na casa de Macalé, que tocava violão na peça. Mesmo contando com algumas de suas musas, o disco tem uma ausência eloquente: a de Gal Costa, uma das principais intérpretes da obra de Macalé. Foi a voz de Gal que ela consagrou Vapor barato, feito em parceria com o poeta Waly Salomão (1943-2003). “Não sei qual é o segredo Vapor barato, talvez seja o tema. É uma canção de despedida e de exílio”, explica. Gal iria gravar a música Simples Assim para o álbum, mas sua morte em 2022 frustrou o projeto.

Caderno de Poesias – Maria Bethânia

A carreira de Macalé, porém, também foi marcada pelas vaias que recebeu em 1969, no IV Festival Internacional da Canção, quando cantou a música cidade de Gotham. “Como disse Nelson Rodrigues, só vaias consagram. No dia seguinte, só se falava de mim”, conta. Nos anos posteriores, ganhou a fama de ser a “maldição” da MPB, ao lado de Melodia, Jorge Mautner e Itamar Assumpção, por não se render aos desejos das gravadoras. “Essa maldita coisa ficou no ar. Em princípio adorei a ideia de estar junto de poetas como Baudelaire e Rimbaud. Mas, com o passar dos anos, a maldição se transformou em maldição.”

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Embora nunca tenha prestado atenção ao estigma, houve uma ocasião, em meados da década de 1980, em que o alegre Macalé pensou em “desistir de viver”. Com ideias terríveis na cabeça, procurou o amigo João Gilberto, pedindo para ouvir sua voz pela última vez. Ao saber de suas dificuldades, o pai da bossa nova o convidou para sua casa e cantou Em Rancho Fundo no ouvido, o que comoveu Macalé. Mas João ficou repetindo a mesma música no violão a manhã inteira. “Adormeci. No dia seguinte, eu nem sabia mais por que estava triste”, conta. Desta forma simples, quem diria, João Gilberto prestou mais um belo serviço à MPB. O maldito favorito ainda está por aí cantando e compondo – só não o convide para o próximo jogo.

Publicado em VEJA em 12 de julho de 2024, edição nº. 2901



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