O Emmy Internacional de Melhor Telenovela é concedido pela Academia Internacional de Artes e Ciências da TV de Nova York desde 2008. O que alavancou esse departamento na premiação foi, principalmente, a alta qualidade das novelas produzidas pela TV Globo. Antes disso, o gênero “Telenovela” era classificado na categoria “Série Dramática”, no caso de Sinhá Moçade 2006, a primeira novela brasileira a concorrer ao Emmy. Quem se lembra desses dados da coluna PESSOAS é Mauro Alencar, consultor e doutor em teledramaturgia pela USP e autor do livro Hollywood Brasileira – Panorama das Telenovelas no Brasil, entre outros títulos.
Curiosamente, numa altura em que o cinema nacional vive uma boa fase no estrangeiro, com a megaexibição de Eu ainda estou aqui em diversos festivais, ganhando prêmios – como o recente Globo de Ouro concedido a Fernanda Torrese ter chances reais de concorrer ao Oscar – por outro lado, as produções televisivas vão de mal a pior nas premiações do gênero. O país, antes conhecido pelas novelas exportadas para os quatro cantos do planeta, assiste agora ao seu recente declínio em comparação com produções da Turquia, Coreia do Sul e China.
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Mauro Alencar relata que foi convidado para integrar a Academia Emmy em 2009. Além de votar na melhor novela, também conheceu melhor atores e atrizes estrangeiros. Grande parte do ímpeto para a participação no Brasil veio da produção de Caminho para as Índias (primeira produção brasileira a vencer na categoria), em 2009. “Comecei a votar no ano seguinte, 2010. Laços de SanguePortuguês, venceu. Depois, em 2012, foi a vez do remake de O Astro”.
A última vez que o Brasil ganhou o Emmy foi com Órfãos da Terraem 2020. A partir disso, o país passou a observar do público outros países dominando aquela que era sua área de supremacia na indústria audiovisual. “Posso dizer que conheço bem o processo de votação. E é, claro, um processo artístico e geopolítico. É a natureza destas academias apesar do seu valor artístico. O fato de o Brasil estar afastado há mais de um ano é preocupante no que diz respeito à indústria do entretenimento e à produção cultural. Digo isso não só em relação à Globo, mas a todas as emissoras produtoras. Minha preocupação é que o Brasil esteja perdendo impulso”, diz Mauro.
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Em 2021, pela primeira vez, a China ganhou o Emmy, com A Canção da Glória. Uma produção histórica ancorada no drama romântico. Marco no gênero televisivo, convenhamos. “O Brasil, que sempre foi exemplo de novas estéticas, aberturas e produções bem elaboradas, vem perdendo espaço para Turquia e Coreia do Sul, atualmente os maiores chavões do mundo quando o assunto é novela. O fato é que o mundo aprendeu a fazer novelas, como previu meu falecido amigo e diretor da área internacional, Jorge Adib. Hoje todo mundo sabe comunicar belas produções ao seu público. E, mais do que isso, conquistar as emoções de diferentes pessoas”, continua a pesquisadora.
Outro país que entra com vigor no campo é a Espanha, um dos principais produtores de televisão, com séries de alta qualidade em termos de texto, direção e interpretação. Além disso, a Colômbia tem demonstrado a força latina nos melodramas desde a época do seu produto mais bem acabado da globalização, Ei, sou Betty, la Fea. Essa situação evidencia, segundo Mauro, o quanto o produto telenovela “made in Brazil” precisa ser repensado à luz da nova era industrial, das novas estruturas geopolíticas e psicossociais.
“Isso é o que tenho visto ao viajar pelo mundo, ao conversar com produtoras internacionais, de streaming e de TV aberta. É o que tenho ouvido nas ruas, no Centro do Brasil, em áreas comerciais como o Saara, no Rio, e no shopping de São Paulo, bem como em eventos sociais. Independentemente do streaming, e mesmo para esta plataforma, as novelas brasileiras precisam se realinhar com os desejos da era fragmentada em que vivemos”, continua Mauro.
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Da mesma forma que a Coreia do Sul ganhou o Oscar com o filme Parasitaem 2023, o Brasil volta a se encantar pelo seu cinema ao ver a chance de repetir o feito da Central do Brasil, de 1998, em uma nova produção de Valter Salles chegando ao Oscar. O fato é que o cinema nunca teve exposição internacional continuada por aqui. Houve golpes com o Cinema Novo, ele desapareceu na década de 1990 e na era Collor, a esperança se reacendeu com a retomada coroada pelo Centrale agora parece gritar para o mundo o que o título do momento anuncia: “ei, pessoal, Eu ainda estou aqui!”.
Quanto às novelas, estas sempre tiveram vigor na televisão aberta, movidas pela excelência artística e qualidade técnica da TV Globo, só ameaçada quando a TV Manchete produziu pérolas como Pantanal. Os tempos são diferentes. O mundo compreendeu a importância da ficção televisiva. Não há mais inocentes. Enquanto outros países descobrem Fernanda Torres em sua intensa interpretação do Eunice Paiva, O Brasil descobre que não é mais o “melhor time” para entrar em campo quando o assunto é novela. “Que esta nova era do cinema nacional, em sintonia com o reposicionamento do prestigiado Globo de Ouro, encontre eco na produção das nossas novelas. Porque o ‘ainda’ principal produto audiovisual brasileiro popular merece recuperar seu lugar no panteão das produções internacionais”, afirma Mauro, de olho em dias melhores para a TV aberta.
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