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A Editorial Sul
| 22 de dezembro de 2024
“A Câmara dos Deputados tem muitos funcionários só para cuidar de anotações. Não pode passar. Jamais farei coisas que não estejam dentro da lei”, disse Giovani Cherini (PL-RS), a respeito de pedido de ressarcimento do valor gasto com vinho. (Foto: Mário Agra/Câmara dos Deputados)
A Câmara pagou R$ 212 milhões em cotas parlamentares para seus 513 deputados em 2024. O recurso poderá ser usado para pagar viagens, alimentação e transporte, fazer anúncios sobre a atividade parlamentar e alugar um escritório. Uma pesquisa do Estadão, no entanto, identificou casos que parecem divergir da alocação original dos recursos criados para financiar a atividade legislativa.
O dinheiro foi usado, por exemplo, para pagar vinho e passagens para Bonito (MS). Procurados, os parlamentares alegaram “erro da Câmara”, no caso da bebida alcoólica, e de fazer excursão “político-partidária”, em relação à viagem.
Todos os meses os deputados apresentam faturas à Câmara para reembolsar despesas que deveriam estar estritamente ligadas aos trabalhos parlamentares. Quando a despesa não segue as regras definidas pela Câmara, o setor responsável “desautoriza” a nota e não paga o valor. Este ano foram bloqueadas despesas no valor de R$ 1 milhão. Isso ocorreu devido a irregularidades detectadas ou despesas que ultrapassaram o limite previsto.
O deputado Giovani Cherini (PL-RS) integra o Parlamento do Mercosul (Parlasul) e costuma fazer viagens à sede em Montevidéu, no Uruguai. Em junho, ele solicitou a restituição de R$ 480,22 e apresentou duas faturas, ambas datadas do dia 17 daquele mês. Em um deles, no valor de R$ 286,62, está registrado que o deputado consumiu duas taças de vinho e um cordeiro grelhado em um hotel-restaurante em Colônia de Sacramento, a cerca de 178 km da capital uruguaia. Apesar de o custo das bebidas alcoólicas ter sido proibido, a Câmara devolveu o valor.
Procurado, Cherini disse que o erro não foi dele, mas da Câmara. “A Câmara tem muitos funcionários só para cuidar das pequenas coisas. Não pode passar. Jamais farei coisas que não estejam dentro da lei”, afirmou. Questionada pela reportagem quantos servidores atuam na área de faturas, a Câmara não respondeu.
Erro técnico
Em julho, o deputado Pedro Aihara (PRD-MG) entregou cinco notas fiscais que continham bebidas alcoólicas e a Câmara reembolsou indevidamente o valor. O parlamentar alegou erro técnico e devolveu o dinheiro à Câmara. Em uma dessas notas, havia registro de chope consumido em Copacabana, no Carnaval.
A deputada Carla Zambelli (PL-SP), por sua vez, usou recursos parlamentares para pagar R$ 3,8 mil em passagens aéreas para Bonito, cidade de Mato Grosso do Sul conhecida por suas belezas naturais. Ela e o marido foram vistos pelo escritor Jeferson Tenório durante uma caminhada em um parque. O roteiro incluiu caminhadas, mergulho e visita a um centro de recuperação de animais silvestres, na mesma semana de seu aniversário.
Procurada, Zambelli confirmou que fez caminhada em Bonito, mas disse que foi à cidade para participar de um “evento político partidário” em uma fazenda no interior do estado, para receber uma delegação da Associação das Famílias pela Unificação e Paz Mundial. O parlamentar não registrou nenhuma informação sobre esse acontecimento nas redes sociais.
Em 2024, a Polícia Federal realizou duas operações em investigações sobre suspeitas de uso irregular e desvio da cota parlamentar. Em outubro, agentes fizeram buscas em endereços ligados ao deputado Gustavo Gayer (PL-GO). Ele afirmou que a operação foi uma tentativa de prejudicá-lo.
Na semana passada, a PF fez buscas em endereços ligados aos assessores dos deputados Sóstenes Cavalcante (PL-RJ) e Carlos Jordy (PL-RJ) em inquérito que apura suspeita de desvio de cotas parlamentares. Segundo a PF, “agentes públicos e empresários teriam firmado acordo ilícito para desviar recursos”. Jordy negou qualquer irregularidade e disse que foi vítima de uma perseguição. Sóstenes afirmou estar convencido da integridade do trabalho realizado por seus assessores.
Tal como tem acontecido nos últimos anos, a Câmara gasta mais dinheiro na divulgação das atividades parlamentares. Até o momento foram desembolsados R$ 81,8 milhões. O recurso pode ser usado, por exemplo, para confecção de panfletos ou para custear equipes de comunicação para produção de conteúdo nas redes sociais – desde que tenham como objetivo informar sobre o trabalho dos deputados.
A publicidade da atividade parlamentar e o aluguel de carros (R$ 37,9 milhões) – segunda maior despesa da Câmara – somam mais de 50% de tudo o que a Câmara gasta com cota parlamentar.
Átila Lins (PSD-AM) foi o deputado que mais gastou dinheiro da cota parlamentar neste ano até agora. A Câmara reembolsou R$ 577,2 mil de despesas apresentadas pelo parlamentar ao longo de 2024. A maior parte do gasto foi com fretamento de aeronaves (R$ 311,8 mil) e divulgação de atividades parlamentares (R$ 108,3 mil).
Os parlamentares amazonenses tendem a utilizar mais fretamentos de aeronaves devido à dificuldade de deslocamento rápido entre as cidades do estado. Procurado, o deputado não comentou. (Estadão Conteúdo)
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Financiamento para deputados federais brasileiros paga vinho no Uruguai; Regimento interno da Câmara não permite custeio de bebidas alcoólicas
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