Projeto de Lei prevê punir empresas por racismo

Projeto de Lei prevê punir empresas por racismo


O Anuário Brasileiro de Segurança Pública mostrou aumento de 127% nos casos de racismo. (Foto: Reprodução)

A Comissão de Direitos Humanos do Senado tem entre suas pautas de análise um projeto de lei que, se aprovado, poderá levar à criminalização de empresas por racismo. Atualmente, as pessoas jurídicas só respondem por ações penais em casos de crimes ambientais e crimes contra a economia popular.

O projeto de lei é o 4.122, de 2021, de autoria do senador Fabiano Contarato (PT-ES) e causa divergência entre especialistas em Direito Penal Empresarial. O projeto prevê que os crimes de racismo previstos na Lei Federal 7.716, de 1989, resultem na criminalização dos CNPJs “nos casos em que a infração seja cometida por decisão de seu representante legal ou contratual, ou de seu órgão colegiado, no interesse ou benefício da empresa.”

As penalidades vão desde multa, suspensão temporária das atividades e obrigação de reparação de danos até a criação de programas de combate ao racismo. O texto prevê ainda a liquidação de empresas que tenham sido criadas com o objetivo de promover ou ocultar crimes racistas.

“A pessoa jurídica constituída ou utilizada, predominantemente, com a finalidade de permitir, facilitar ou ocultar a prática de crime definido nesta lei terá sua liquidação forçada decretada e seu patrimônio será considerado instrumento do crime e, como tal, perdido em favor do Fundo de Defesa de Direitos Difusos”, diz o texto do projeto.

Os advogados que atuam na área de Direito Penal e Empresarial estão divididos quanto à legalidade e viabilidade da proposta. “A responsabilidade penal das pessoas jurídicas só é possível nos crimes ambientais mediante autorização constitucional expressa e específica”, afirma o criminalista Sérgio Rosenthal.

Mestre em Direito Penal pela USP e especialista em Direito Penal Econômico pela Universidade de Coimbra, Rosenthal destaca que “os maiores causadores de danos significativos ao meio ambiente são as empresas e tais infrações geralmente decorrem de decisões corporativas”. “O mesmo não acontece em relação ao crime de racismo”, afirma.

Rosenthal defende que, caso sejam adotadas políticas racistas por uma empresa, “o ideal é punir os indivíduos efetivamente responsáveis, sem prejudicar outros trabalhadores, parceiros ou investidores”.

Defensores

O projeto já recebeu parecer favorável da senadora Ana Paula Lobato (PDT-MA). Se passar pela Comissão de Direitos Humanos, que adiou na quarta-feira a análise da proposta, o texto ainda seguirá para a Comissão de Constituição e Justiça. Especialista em Direito Penal Econômico pela Universidade de Coimbra e pelo IBCCrim, o advogado Dinovan Dumas considera que a criminalização de empresas por atos de racismo “representa um avanço significativo no combate à discriminação racial no Brasil”. Diz que “a liquidação forçada de empresas constituídas para promover ou ocultar o racismo é uma medida drástica, mas necessária para coibir a prática da discriminação de forma sistemática”.

Dumas foi membro da Comissão de Direitos Humanos da OAB/SP por dois mandatos. E avalia que a legislação precisa se tornar “cada vez mais” antirracista. “Não basta ser contra o racismo. Precisamos ser antirracistas. É assim, e só assim, que as senzalas serão definitivamente esquecidas.”

Para Dumas, o projeto de Contarato é um passo importante “para responsabilizar não só as pessoas físicas, mas também as empresas, que muitas vezes se escondem atrás de pessoas jurídicas para cometer atos discriminatórios”.

Dados

O Anuário Brasileiro de Segurança Pública mostrou aumento de 127% nos casos de racismo, totalizando 11.610 boletins de ocorrência no ano passado, ante os 5,1 mil registros de 2022. Por Estados, o Rio Grande do Sul liderou o levantamento, com 2.857 casos, e apresentou o maior taxa de casos por 100 mil habitantes, com 23,2.

Os incidentes envolvendo insultos raciais também aumentaram em 2023, chegando a 13.897 denúncias, um salto de 13,5% em relação a 2022. Para especialistas em segurança pública, os números já podem mostrar a influência da sanção, em janeiro de 2023, da lei que equipara o insulto racial ao crime de racismo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Segundo dados do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), as ações judiciais por injúrias raciais aumentaram 610% na comparação entre os anos de 2020 e 2023.