Presidente do Banco Central diz que para ter juros mais baixos, o Brasil precisa de um “choque fiscal positivo”

Presidente do Banco Central diz que para ter juros mais baixos, o Brasil precisa de um “choque fiscal positivo”


Segundo o chefe do BC, neste momento, “optar por juros artificialmente mais baixos sem ter uma âncora fiscal equivale a produzir um ajuste via inflação no médio prazo”

Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil

(Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil)

O presidente do BC (Banco Central), Roberto Campos Neto, afirmou nesta terça-feira (1º) que para o Brasil ter juros mais baixos será necessário um “choque fiscal positivo” e maior vigilância quanto à trajetória da dívida pública.

Em palestra no evento “Crescera Capital – Dia do Investidor 2024”, realizado em São Paulo, Campos Neto disse que, mesmo com uma “ansiedade” por juros mais baixos no futuro, ao olhar para a história do país, toda vez que os juros foram mais baixos foram associados a um “choque fiscal positivo”.

Segundo ele, neste momento “optar por juros artificialmente mais baixos sem ter uma âncora fiscal equivale a produzir um ajuste via inflação no médio prazo”, sendo que “quem paga” são os mais pobres.

Em sua última reunião, ocorrida no mês passado, o Copom (Comitê de Política Econômica) decidiu aumentar a taxa Selic em 0,25 ponto, que chegou a 10,75% ao ano, devido às incertezas na economia, como a desancoragem das expectativas de inflação , mercado de trabalho aquecido e hiato do produto.

O grupo também sinalizou que poderá aumentar novamente a alíquota nas próximas reuniões. A expectativa do mercado é que a Selic chegue a 11,75% ao ano e a inflação a 4,37% – quase fora da meta fixada pelo governo de 3% com margem de tolerância de 1,5% para mais ou para menos.

Antes mesmo desse aumento da taxa básica de juros, a autoridade monetária já era criticada pelo governo. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) já fez diversas declarações dizendo que Campos Neto “trabalha contra o Brasil”.

Outros membros do Executivo e aliados também elevam o tom contra o BC. Ao justificar seu discurso, Campos Neto relembrou momentos históricos, como no primeiro governo Lula, quando houve superávit nas contas públicas; a aprovação do teto de gastos – política implementada pelo ex-ministro da Fazenda Paulo Guedes – que “fez cair a longa curva de juros” e proporcionou cortes “sustentáveis” da Selic; a reforma das pensões e, mais recentemente, o quadro fiscal.

“Então, fica muito claro quando você olha a história do Brasil, no longo prazo, que os momentos em que o Brasil conseguiu baixar os juros e ter uma taxa de juros mais estável por um período maior de tempo foram momentos associados a uma percepção fiscal positiva”, frisou.

Segundo ele, isso é muito importante agora porque o mercado também tem questionado a trajetória da dívida, o que leva à percepção de que é “muito difícil” conviver com juros baixos, a longa curva de juros sobe rapidamente.

“Em algum momento, o Brasil precisará ter algum tipo de programa que gere a percepção de um choque fiscal positivo, se quiser conviver com juros mais baixos”, pontuou.

Na manhã desta segunda-feira (30), o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, defendeu uma “harmonia” entre a política fiscal e monetária para “evitar problemas econômicos”. O chefe da equipe econômica destacou ainda que tem pedido ao presidente Lula que respeite o marco fiscal e mantenha as despesas dentro da regra estabelecida.

Segundo ele, esta é “uma questão essencial” para a trajetória da dívida pública e é uma “preocupação incisiva” para o Ministério das Finanças e para a equipa económica. O principal argumento dos analistas de mercado é sobre o aumento desenfreado das despesas primárias, como a Previdenciária.

No último relatório de avaliação de receitas e despesas, referente ao quarto bimestre, a rubrica voltou a ter aumento, mas foi coberta pelo aumento da receita, bem como pelo não pagamento de outras previsões.

Campos Neto destacou ainda que o mercado questiona a sustentabilidade do crescimento económico. Salientou que grande parte deste crescimento é, na verdade, impulsionada por factores fiscais, como os gastos das empresas estatais e os fundos criados, e quanto representa o crescimento estrutural. O presidente do BC enfatizou que esta é uma questão fundamental para o futuro da economia brasileira.

“Precisamos buscar a harmonia entre a política fiscal e a política monetária, entendendo que o Brasil precisa produzir um regime onde haja expectativas positivas que façam cair as taxas de juros futuras de forma mais consistente e sustentável”, ressaltou.