Poder Judiciário brasileiro condena empresas por problemas gerados com uso de inteligência artificial

Poder Judiciário brasileiro condena empresas por problemas gerados com uso de inteligência artificial


Sem regulamentação sobre o tema, as decisões adotam outras normas, como o Marco Civil da Internet. (Foto: Reprodução)

Embora ainda não exista regulamentação específica para o uso de inteligência artificial (IA) no Brasil, o Tribunal determinou que as empresas indenizem os consumidores por ações indevidas realizadas por meio de robôs. Há decisões de primeira e segunda instância envolvendo TikTok, WhatsApp e Vivo.

No Brasil, existem pelo menos cinco projetos de lei sobre o tema. Um deles, mais avançado, o número 2.338, de 2023, segue a mesma linha da nova norma europeia, o AI Act, aprovado em março, com uma gradação de sanções baseada nos riscos dos sistemas desenvolvidos. Havia expectativa de que um primeiro relatório fosse aprovado ainda no primeiro semestre, o que não aconteceu.

Sem legislação específica, o Judiciário julgou os primeiros casos com base em outras leis. As decisões citam, por exemplo, o Marco Civil da Internet (Lei nº 12.965/2014), o Código de Defesa do Consumidor (CDC) e a própria Constituição Federal.

A Vivo, por exemplo, foi condenada a indenizar um consumidor por danos morais, no valor de R$ 2 mil. Ele afirmou ter recebido mais de 20 ligações por dia feitas por um robô que se autodenomina “assistente virtual, informando sobre novas promoções e acionando anúncios automáticos para o autor alterar seu plano. Não há mais recurso. O caso agora se tornou definitivo.

Na sentença, a juíza Renata Oliva Bernardes de Souza, da 1ª Vara do Juizado Especial Cível de Campinas (SP), afirma que “a teoria do ‘desvio produtivo do consumo’ pode ser aplicada no presente caso, que identifica a perda de tempo desperdiçado pelo consumidor para resolver um problema criado pelo próprio fornecedor, situação que se destaca como simples incômodo, por afetar a paz e a tranquilidade e, assim, enquadra-se na esfera do dano moral”.

Em nota, a Vivo informa que o processo judicial em questão está encerrado e destaca que “o cliente está no centro de suas decisões, portanto, desenvolve iniciativas para melhorar continuamente a forma como se relaciona com os consumidores nos diferentes pontos de contato com a marca .”

Em sentença proferida em março, a Bytedance Brasil Tecnologia, responsável pela plataforma social TikTok no Brasil, foi condenada a pagar R$ 23 milhões por danos morais coletivos, além de R$ 500 por danos morais individuais para cada usuário brasileiro cadastrado na plataforma até Junho de 2021. Recurso é possível.

De acordo com o processo, a empresa teria implementado no aplicativo uma ferramenta de inteligência artificial que escaneia automaticamente os rostos dos usuários, visando capturar, armazenar e compartilhar dados, sem o devido consentimento dos usuários. A ação foi ajuizada pelo Instituto Brasileiro de Defesa das Relações de Consumo do Maranhão (Ibedec-MA).

Em sua sentença, o desembargador Douglas de Melo Martins, do Juízo de Interesses Difusos e Coletivos de São Luís (MA), citou o artigo 5º, inciso e imagem das pessoas e o Marco Civil da Internet, que estabelece princípios fundamentais para o uso da internet no brasil.

O juiz reconheceu que “a recolha e armazenamento de dados biométricos era ilegal porque não houve consentimento livre, expresso e informado a este respeito” (processo n.º 0816292-73.2020.8.10.0001).

Dados e imagens

Especialista na área de Direito do Consumidor, o advogado Vinicius Zwarg, do Emerenciano, Baggio & Associados, afirma que o tema inteligência artificial ainda é muito incipiente, mas já está claro que terá muito diálogo com a proteção de dados, Marco Civil da Internet e com o Código de Defesa do Consumidor.

Por enquanto, segundo Zwarg, os casos analisados ​​na Justiça e na Secretaria Nacional do Consumidor (Senacon) envolvem principalmente a utilização de dados e a captura de imagens por inteligência artificial, sem que o consumidor tenha dado consentimento. Há também casos em que o consumidor afirma que sua demanda não foi resolvida de forma satisfatória pelos robôs.

Em pesquisa realizada pelo Procon-SP, em outubro de 2023, realizada com 1.043 consumidores, 28% deles disseram que nunca ou raramente conseguem identificar que estão interagindo com inteligência artificial. Um total de 57% deles entraram em contato para registrar reclamação sobre o serviço ou produto e 65% afirmaram que seu problema não foi resolvido – a inteligência artificial não entendeu a solicitação ou as respostas foram incompletas ou insatisfatórias.