FOLHAPRESS – O número de pessoas reconhecidas como refugiadas no Brasil mais que dobrou no final do ano passado, chegando a 143 mil. A maioria deles são venezuelanos que fogem das crises económicas e políticas que o país atravessa sob Nicolás Maduro.
O salto no número resulta de uma força-tarefa implementada pelo Conare, o Comitê Nacional para os Refugiados, durante o primeiro ano do governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). A terceira gestão petista herdou de gestões anteriores uma montanha de pedidos aguardando análise.
O órgão analisou mais de 138 mil pedidos de asilo no último ano. São solicitações que já haviam sido feitas em 2023 e também em muitos anos anteriores – é muito comum no país que os solicitantes esperem anos por uma resposta oficial às suas solicitações.
Ao final, o Conare deu sinal verde para mais de 77 mil solicitações. Quase todos eles – 97,6% – eram imigrantes da Venezuela, que entraram pelos estados do norte do país. Em seguida, há os afegãos, que fogem do regime talibã, e os sírios, que fogem da guerra civil.
São números consideráveis em comparação com o que foi feito nos anos anteriores. Em 2022, por exemplo, no último ano do governo Jair Bolsonaro (PL), 41,3 mil pedidos foram analisados pelo órgão governamental responsável, e menos de 10% deles foram aprovados. No ano anterior, foram 71 mil análises, com apenas 1% aprovadas.
Os dados estão compilados no mais recente relatório Refúgio em Números, organizado pela equipe do Observatório Internacional de Migrações (OBMigra), formada por estatísticos que monitoram os fluxos em direção ao Brasil.
A importância do reconhecimento da condição de refugiado reside em “tirar o requerente de uma situação provisória e juridicamente precária para levá-lo a um cenário em que o Estado brasileiro efetivamente reconheça sua necessidade de proteção”, afirma a chefe do Departamento de Migrações de Brasília, Luana Medeiros.
“Para uma pessoa em situação de perseguição ou deslocamento forçado, isso significa certeza de que foi acolhida no Brasil e pode reconstruir sua vida”, continua, em conversa com a reportagem. “Com o tempo, ela também poderá solicitar a naturalização no Brasil”.
A informação mostra também que o número anual de novos imigrantes que chegam ao país e solicitam asilo recuperou um ritmo constante após um declínio durante os anos de pandemia. No último ano de 2023, 58,6 mil pessoas solicitaram essa proteção no Brasil.
Refugiados
Refugiados são aqueles considerados em risco nos seus países de origem devido a perseguições ligadas a opiniões políticas ou orientação sexual, por exemplo. No Brasil, também existe um mecanismo facilitado para reconhecer os venezuelanos como refugiados, depois de Brasília ter reconhecido em 2019 que o país sul-americano vive uma violação grave e generalizada dos direitos humanos.
O coordenador de estatísticas do OBMigra, Tadeu de Oliveira afirma que duas coisas, em especial, chamaram a atenção de sua equipe de especialistas. Primeiro, o elevado número de cubanos (11,4 mil) e angolanos (3,9 mil) que solicitaram refúgio no país em 2023. Eram a segunda e terceira nacionalidades atrás dos venezuelanos (29,4 mil).
Esses são dois dos fluxos que vêm ganhando força. Por um lado, aqueles que fogem da asfixia económica chegam da ilha caribenha.
Muitos utilizam o Brasil apenas como país de trânsito: solicitam refúgio para poder permanecer no país por alguns meses, gozando de direitos com documentação provisória e depois partem em rotas terrestres em direção ao norte para tentar chegar aos Estados Unidos.
O fluxo de angolanos, em parte também ligado a esta característica, procura o Brasil pela facilidade do idioma. Ambos os países são de língua portuguesa.
Em segundo lugar, os especialistas destacam o elevado número de menores. Em todo o ano de 2023, mais de 44% das pessoas reconhecidas como refugiadas eram crianças e adolescentes de até 18 anos.
É um movimento natural, mas ainda preocupante quanto ao impacto na vida dos menores. Os fluxos migratórios geralmente começam com homens sozinhos, que, após se instalarem no novo país de refúgio, tentam trazer a família e os filhos.
O volume ganho pelos fluxos vindos da Ásia também não passa despercebido. Só no ano passado, mais de 1.100 vietnamitas e mais de 960 nepaleses procuraram refúgio no Brasil. Esses perfis ainda são analisados pelo Conare para entender suas motivações.
Acredita-se que esses grupos também procurem o Brasil pela facilidade de migração e depois sigam para os Estados Unidos, em uma rota perigosa que passa no meio do caminho pelo Estreito de Darién, a chamada “selva da morte” entre o Panamá e a Colômbia.
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