Morre o professor Rogério Cezar de Cerqueira Leite

Morre o professor Rogério Cezar de Cerqueira Leite



SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – O físico e engenheiro eletrônico paulista Rogério Cezar de Cerqueira Leite morreu aos 93 anos na madrugada deste domingo (12/01). Foi um dos mais importantes cientistas brasileiros e diretor de alguns dos principais departamentos de pesquisa e tecnologia do país.

Cerqueira Leite foi professor emérito da Unicamp (Universidade Estadual de Campinas) e membro do Conselho Editorial da Folha de S.Paulo entre 1978 e 2021.

Destacou-se na década de 1970 não apenas por sua relevante produção como pesquisador na área de matéria condensada, mas, sobretudo, por seu papel constante e crítico nos grandes debates sobre ciência e tecnologia brasileira e nas políticas de desenvolvimento industrial.

Em X, o presidente Lula afirmou neste domingo (12/01) que Cerqueira Leite foi um dos principais responsáveis ​​pelo avanço da ciência e um defensor da democracia no Brasil. “Em 93 anos de vida, deixou contribuições em tantas áreas, que seu legado continuará dando frutos e não será esquecido”, escreveu o presidente na rede social.

Ativou raios laser pela primeira vez no Brasil em 1965, no ITA (Instituto Tecnológico de Aeronáutica), em São José dos Campos (SP), ao retornar dos Estados Unidos após trabalhar por três anos como pesquisador nos Laboratórios Bell.

Sua participação foi decisiva para a criação pelo governo federal, em 1997, em Campinas (SP), do LNLS (Laboratório Nacional de Luz Síncrotron), único do gênero na América Latina. Atualmente, o local faz parte da organização social CNPEM (Centro Nacional de Pesquisa em Energia e Materiais) – também criada graças ao trabalho do pesquisador -, que também conta com unidades de biotecnologia, nanotecnologia e bioetanol.

Além de importantes trabalhos acadêmicos, a produção intelectual de Cerqueira Leite engloba livros e centenas de artigos na imprensa sobre assuntos como programa nuclear brasileiro, exploração de minerais estratégicos como nióbio e quartzo, ensino superior, política industrial e energia. Seus textos conseguiram mesclar didatismo com erudição e, muitas vezes polêmicos, tiveram críticas contundentes.

Nas últimas matérias publicadas nesta Folha de S.Paulo, Cerqueira Leite se dedicou a analisar o cenário político, como a eleição de Jair Bolsonaro (PL), o negacionismo científico, as mudanças climáticas e a importância das universidades para o desenvolvimento da ciência no país. o país.

Em seu último artigo publicado no jornal, em outubro de 2023, abordou a distribuição de recursos em pesquisas acadêmicas e propôs que a maior parte, 80%, fosse destinada a projetos necessários ao desenvolvimento nacional e o restante destinado a projetos escolhidos por cientistas.

Nascido em 14 de julho de 1931 em Santo Anastácio, a 589 quilômetros da capital paulista, Cerqueira Leite tinha uma formação cultural que vai além de sua área de atuação acadêmica – inclui história, biologia e artes, especialmente música.

Esteve presente na estreia da seção Tendências/Debates, da Folha de S.Paulo, em 22 de janeiro de 1976. Sua contribuição foi com o artigo “Tecnologia e humanismo”. No jornal, também manteve as colunas “Diapasão”, sobre música, e “Engenho e Arte”, sobre divulgação científica.

Defensor da autonomia nacional em tecnologias estratégicas, como o etanol, nos últimos anos tem alertado para a necessidade de investimentos em pesquisa e produção desse combustível como alternativa tecnológica e industrial mais rentável e segura que o pré-sal em termos econômicos, ambientais , e social e compatibilidade com as condições brasileiras.

Formado em engenharia eletrônica e de computação em 1958 pelo ITA, concluiu o doutorado em física da matéria condensada em 1962 na Universidade de Paris-Sorbonne, na França. Em seguida, trabalhou nos Laboratórios Bell, onde trabalhou com Sérgio Pereira da Silva Porto (1926-1979), seu professor no ITA e um dos primeiros a desenvolver o uso do laser na medicina brasileira.

Foi também com esse mestre e amigo que o jovem físico participou, no início da década de 1960, de estudos pioneiros no Brasil sobre aplicações do chamado efeito Raman. O fenômeno consiste na variação de frequência na dispersão dos raios de luz através de determinados materiais, cuja explicação rendeu em 1923 ao indiano Chandrasekhar Raman (1888-1970) o Prêmio Nobel de Física.

Na Unicamp, onde começou a lecionar em 1970, foi diretor do Instituto de Física (1971-1974) e coordenador geral das faculdades (1975-1978). Também foi membro do Conselho Superior da Fapesp (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo).

Apesar de reclamar de “não ter ido até o fim na carreira acadêmica”, Cerqueira Leite teve uma produção relevante na área de física da matéria condensada, na qual foi autor de livros e de 76 artigos, a maioria deles em alta- impactar revistas estrangeiras. na comunidade científica internacional.

Foi agraciado com a Cátedra da Universidade de Montreal, Canadá, em 1979, e com a Comenda da Ordem Nacional do Mérito da França, em 1980. No Brasil, recebeu a Grã-Cruz da Ordem Nacional do Mérito Científico, em 2006.

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Aposentado da Unicamp desde 1987 e membro da Comissão de Energia da União Internacional de Física Pura e Aplicada (Iupap), foi também editor da revista científica britânica Solid State Communications (1974-1982) e consultor de outras 20 publicações internacionais.

Nas últimas semanas, Cerqueira Leite esteve internado devido a complicações da diabetes. Ele deixa esposa, três filhos e seis netos.



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