Menção a ideologias em teste reacende debate sobre a politização na Polícia Rodoviária Federal

Menção a ideologias em teste reacende debate sobre a politização na Polícia Rodoviária Federal


Elaboradas por Harvard, as questões abordam temas como afinidade partidária; A direção da organização suspendeu o formulário. (Foto: Divulgação/PRF)

Um questionário sobre preferências políticas incluído no curso de direitos humanos da Polícia Rodoviária Federal (PRF) reacendeu o debate sobre a politização na corporação, que se tornou alvo de fraudes bolsonaristas no último governo. A atual direção decidiu suspender o formulário devido à repercussão negativa, mas parlamentares da oposição consideraram o caso “absurdo” e “grave” e se mobilizaram para pedir ao ministro Ricardo Lewandowski, titular da Justiça, departamento ao qual a PRF está subordinada, que explicações. .

O questionário desenvolvido pela Universidade de Harvard em 2017 para entender o racismo estrutural tinha duas perguntas que provocavam medo entre os agentes: uma perguntava sobre “identidade política”, dando as opções de resposta: “extrema esquerda, esquerda, centro-esquerda, centro, centro-direita, direita e extrema direita”. E o outro questionou sobre “afinidade partidária”, apresentando como alternativas: “Democratas, Partido Democrático Trabalhista, Partido do Movimento Democrático Brasileiro, Partido da Social Democracia Brasileira, Partido Socialismo e Liberdade, Partido dos Trabalhadores, Partido Trabalhista Brasileiro, Partido Verde, Outros”. O caso foi revelado pelo jornal Folha de S. Paulo.

Auto-reflexão

Segundo a PRF, o questionário se chama Teste de Associação Implícita (TAI Race: Black-White), foi desenvolvido pela universidade americana e tem como objetivo provocar a “autoreflexão dos alunos” em relação ao problema do racismo estrutural:

“Embora o formulário seja anônimo e facultativo, e a organização não forneça tais informações, a atividade realizada, Corrida TAI: Preto-Branco, foi planejada para que o aluno refletisse, de forma autônoma, sobre a influência dos vieses cognitivos durante a interação policial com grupos vulneráveis”, disse a PRF, em nota. O órgão destacou ainda que o teste não pedia a identidade dos agentes, estava disponível publicamente na internet e as informações não eram armazenadas no banco de dados do órgão.

Como o questionário fazia parte do curso de direitos humanos, não ficou claro para os agentes da PRF que se tratava de uma atividade pedagógica separada e opcional. Alguns deles tinham medo de responder às perguntas e depois sofrer constrangimentos dentro da instituição.

Em nota, a Federação Nacional dos Policiais Rodoviários afirmou que está “acompanhando as alegações de uma pesquisa que traria elementos da ideologia política dos servidores, para que houvesse um real esclarecimento do caso”.

A polêmica em torno do questionário ocorre no momento em que Lewandowski planeja ampliar as prerrogativas da PRF e transformá-la em uma espécie de polícia federal ostensiva. As mudanças seriam feitas por meio de uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC), cuja minuta foi enviada pelo ministro ao presidente Lula no início do mês.

Pela proposta, a PRF deixaria de ser apenas um órgão de transporte rodoviário e passaria a ter ampla atuação em ferrovias e hidrovias, além de poder ser requisitada pelos Estados, como acontece hoje com a Força Nacional.

Desde o início do governo Lula, a direção da PRF chefiada pelo inspetor Antônio Fernando Souza Oliveira lançou uma ofensiva para reverter o rótulo de “polícia bolsonarista” atribuído à PRF no governo passado. Entre as medidas implementadas estão a recriação de comissões nacionais e regionais de direitos humanos e a inclusão de materiais sobre este tema no curso de formação de agentes. Esta havia sido extinta durante o governo Bolsonaro na gestão do ex-diretor da PRF Silvinei Vasques.

Curso redesenhado

Preso desde agosto de 2023 por suposta interferência no segundo turno das eleições, Vasques tornou-se um símbolo da aproximação da PRF com o ex-presidente Jair Bolsonaro. Ele nega as acusações. O policial também foi criticado pelo aumento da letalidade da PRF, que passou a atuar em operações, inclusive em batidas em comunidades.

Esses dois casos levaram a agência a investir, no final de 2023, na reformulação dos cursos de direitos humanos aplicados aos agentes, que incluem o questionário de Harvard. A atual direção da corporação explicou que suspendeu a prova por “gerar margem de interpretação diferente da proposta original”.

Os parlamentares da oposição não ficaram satisfeitos e pediram explicações a Lewandowski, considerando sua convocação à Comissão de Segurança Pública da Câmara.

“Isso é muito sério. Fui abordado por vários agentes reclamando deste questionário. Disseram-me que estão omitindo as suas respostas, por medo de serem discriminados ou perseguidos. Se você passar no concurso, não importa se você é de direita ou de esquerda”, disse o deputado Alberto Fraga (PL-DF), presidente da comissão.

A senadora Damares Alves (Deputada-DF) pediu que Lewandowski fosse convocado ao Senado para explicar o caso.