Lula pode ficar com relógio que ganhou de presente no primeiro mandato, decide Tribunal de Contas da União

Lula pode ficar com relógio que ganhou de presente no primeiro mandato, decide Tribunal de Contas da União


O relógio está avaliado em R$ 60 mil.

Foto: Ricardo Stuckert/Divulgação

O relógio está avaliado em R$ 60 mil. (Foto: Ricardo Stuckert/Divulgação)

O Tribunal de Contas da União (TCU) decidiu que o relógio recebido de presente pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva não precisa ser devolvido. Lula recebeu o presente durante seu primeiro mandato, do governo francês, em 2005, em viagem a Paris.

Feito em ouro branco 18 quilates e prata 750, é um modelo Cartier Santos Dumont, um clássico da marca francesa. Além disso, possui uma coroa finalizada com uma pedra safira azul. O relógio está avaliado em R$ 60 mil. Os ministros do TCU acompanharam o voto do ministro Jorge Oliveira, que entendeu que, por falta de regras claras para o tratamento dos presentes recebidos, os itens não deveriam ser devolvidos.

Segundo Oliveira, a regra deve estar prevista em legislação —responsabilidade do Congresso— e não conforme determinado pela Corte, como foi estabelecido em 2016.

O entendimento de Oliveira, seguido pela maioria dos ministros, abre caminho para uma rediscussão, no TCU, do processo referente às joias e armas doadas pelo governo da Arábia Saudita ao governo do ex-presidente Jair Bolsonaro. Em 2023, o tribunal já havia entendido, por decisão unânime, que Bolsonaro precisaria devolver os itens, com base na determinação do Tribunal de 2016.

Porém, ao debater o caso de Lula, os ministros seguiram o entendimento de Oliveira, concordando que a elaboração de uma norma clara sobre presentes cabe ao Congresso, e não ao TCU.

“Não existe uma regra clara que trate do recebimento de presentes. Por mais bem-intencionado que seja, não me cabe legislar […] Receber presentes é uma prática, mas obviamente esta prática pode ter mudado. A legislação precisa ser atualizada, mas o TCU não”, disse o ministro.

Oliveira discordou do relator, Antonio Anastasia, que seguiu o parecer da área técnica —de que a regra de devolução de presentes não poderia ser aplicada retroativamente. Ou seja, os dois ministros concordam com o não retorno, mas partem de argumentos diferentes.

O ministro Jorge Oliveira argumentou que a falta de uma norma legal sobre o tratamento dos presentes recebidos pelos presidentes afasta a possibilidade de o Tribunal de Contas determinar a incorporação dos bens ao patrimônio público.

“Não é possível impor obrigação de incorporação ao patrimônio público em relação ao imóvel objeto desta representação [o relógio de Lula]como não é verdade diante de quem é escrutinado em outros processos que tramitam nesta Corte”, diz o voto.

O juiz afirma ainda que não há uma “caracterização precisa” do que seria um bem de natureza “muito pessoal”, “bem como um valor objetivo que pudesse classificar o produto como de ‘alto valor de mercado’”.

Os ministros votaram com Oliveira: Vital do Rego, Jonathan de Jesus, Aroldo Cedraz e Augusto Nardes. Jorge Oliveira foi indicado por Bolsonaro para o TCU, em 2020, após exercer o cargo de ministro da Secretaria-Geral da Presidência da República.

O TCU deliberou apenas sobre o tratamento dos presentes recebidos em 2016. Essa regra se aplica a todos os presentes recebidos desde 2002, mas excluiu itens “muito pessoais” ou de consumo pessoal. Mais tarde, em 2023, o tribunal entendeu que mesmo itens “muito pessoais” deveriam ser incorporados ao patrimônio da União.