Exército aponta autores da Carta dos Oficiais que pedia golpe de Estado; militares responderão a inquérito

Exército aponta autores da Carta dos Oficiais que pedia golpe de Estado; militares responderão a inquérito


O Manifesto foi assinado por 37 militares e recebido pelo então ajudante de campo do presidente Jair Bolsonaro, tenente-coronel Mauro Cid. (Foto: Lula Marques/Ag Brasil)

O Exército concluiu a investigação aberta no ano passado e identificou os autores e signatários da chamada “Carta ao Comandante do Exército dos Oficiais Superiores da Ativa do Exército Brasileiro”. O manifesto foi assinado por 37 militares e recebido pelo então ajudante de campo do presidente Jair Bolsonaro, tenente-coronel Mauro Cid, na noite de 28 de novembro de 2022 — um dia antes da publicação. O documento foi considerado pelo então comandante da Força Terrestre, general Marco Antônio Freire Gomes, como uma pressão para adesão a uma tentativa de golpe de Estado.

O texto teceu considerações sobre o compromisso dos militares com a legalidade e críticas veladas ao papel do Judiciário no processo eleitoral. A carta concluía que os dirigentes estavam “atentos a tudo o que está acontecendo e que vem causando insegurança jurídica e instabilidade política e social no país”. “Além disso, preocupa-nos a falta de imparcialidade na narrativa dos factos e na divulgação dos dados, por parte dos diversos meios de comunicação.”

Por ordem do Comandante-Geral do Exército, General Tomás Paiva, quatro oficiais que redigiram o documento começaram a responder a um Inquérito da Polícia Militar (IPM), por ter sido detectado que existem “indícios de crime”. O IPM terá 30 dias, prorrogáveis ​​por mais 30, para ser concluído. O Ministério Público Militar (MPM), que fiscaliza as investigações, poderá solicitar novas medidas e incluir outros entre os 26 militares identificados por assinarem o documento e que receberam punições disciplinares, incluindo advertências, repreensões e prisões.

Segundo o jornal O Estado de S. Paulo, a investigação revelou a participação de 12 coronéis, nove tenentes-coronéis, um major, três tenentes e um sargento. Dos quatro redatores do documento – que os demais assinaram –, dois são coronéis da ativa – Alexandre Castilho Bitencourt da Silva e Anderson Lima de Moura – e dois da reserva – Carlos Giovani Delevati Pasini e José Otávio Machado Rezo Cardoso. Eles não estavam disponíveis para falar. Outros 11 militares, mesmo com seus nomes na carta, deram explicações consideradas suficientes pelos seus superiores e, por isso, não sofreram nenhuma punição.

Alexandre Bittencourt da Silva comandou o 6º Batalhão de Polícia do Exército até fevereiro de 2022. Na época da carta, ele havia deixado o cargo para morar em Santiago, no Chile, para fazer Pós-Graduação em Condução de Políticas Estratégicas de Defesa, na Academia Nacional de Política e Defesa. Estudos Estratégicos (ANEPE). Após retornar, foi alocado no Departamento Geral de Pessoal do Exército. Anderson Lima de Moura esteve, pelo menos até 2021, lotado na Secretaria de Educação e Cultura do Exército e é coordenador pedagógico da Academia Militar das Agulhas Negras.

Militares afirmaram não ter conhecimento, na história recente das Forças Armadas, de qualquer manifestação política que resultasse em investigações policiais militares que pudessem acarretar punições criminais, como é o caso do presente caso.

A carta foi encontrada no celular de Mauro Cid durante investigações da Polícia Federal, após depoimento do ex-comandante da Força, general Marco Antônio Freire Gomes, que revelou a existência do documento. Segundo ele, o objetivo era pressioná-lo a aderir à tentativa de golpe, em 8 de janeiro de 2023, logo após a posse do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, quando as sedes dos três Poderes em Brasília foram invadidas e vandalizadas. Ao assumir o comando do Exército, o general Tomás Paiva ordenou a abertura de inquérito para identificar os militares que assinaram e redigiram o manifesto, bem como as punições que haviam sido aplicadas a cada um deles.

Conforme determinado pelo regulamento disciplinar, os militares poderiam ou não ser punidos pelos seus comandantes imediatos, que também determinariam a pena, que vai desde advertência até detenção. A investigação mostrou que, dos 37, apenas 26 receberam penalidades. O Ministério Público Militar poderá solicitar que os outros 11, que não receberam nenhuma sanção, também sejam investigados.

A carta teria sido escrita por soldados nos dias imediatamente seguintes ao segundo turno, quando aumentavam as conspirações a favor de um golpe, e o texto dizia que “covardia e injustiça são as qualificações mais abominadas pelos verdadeiros soldados”.

Em depoimento à PF, Freire Gomes já falou sobre punições. Disse ainda que a manifestação dos oficiais da ativa era ilegal, que foi feita com o objetivo de pressioná-lo e que só tomou conhecimento do facto através do Centro de Comunicação Social do Exército.

Nos dias que antecederam os acontecimentos suspeitos de fazerem parte de uma conspiração para tentar um golpe no país, apoiadores de Bolsonaro e militares que apoiavam a permanência do então presidente no cargo – sob a alegação de que as eleições haviam sido fraudadas – trocaram acusações e fizeram pesadas críticas aos generais do Alto Comando do Exército. Estes, por sua vez, rejeitaram a ruptura democrática e lembraram aos insurgentes que os militares estão proibidos por leis e regulamentos de se pronunciarem colectivamente, seja em relação a actos de superiores, numa capacidade exigente ou política. O Alto Comando também alertou os signatários do manifesto mostrando que o ato traria consequências e punições.