Bolsonarismo atua para ampliar espaço no Conselho Federal de Medicina, que inspirou projeto de lei Antiaborto

Bolsonarismo atua para ampliar espaço no Conselho Federal de Medicina, que inspirou projeto de lei Antiaborto


A proposta foi abraçada por aliados do ex-presidente Jair Bolsonaro.

Foto: Reprodução

A proposta foi abraçada por aliados do ex-presidente Jair Bolsonaro. (Foto: Reprodução)

Após a polêmica em torno do projeto de lei antiaborto (PL), os parlamentares de Bolsonaro se mobilizam para colocar nomes de sua preferência no comando do Conselho Federal de Medicina (CFM), que elegerá uma nova diretoria em agosto. Os conselheiros que buscam a reeleição articularam uma resolução em abril para limitar as circunstâncias sob as quais os médicos podem realizar abortos.

A proposta foi abraçada por aliados do ex-presidente Jair Bolsonaro que têm utilizado as redes sociais e até recorreram a uma audiência no Senado para promover chapas apresentadas como “de direita” ou “pró-vida” no conselho. A votação para eleger 54 novos vereadores, um titular e um suplente por Estado, acontecerá nos dias 6 e 7. No Rio, o vereador Raphael Câmara busca permanecer na presidência com o lema de “não deixar a esquerda tomar conta do CFM”.

Câmara foi o relator da resolução do conselho que proibiu a assistolia fetal a partir da 22ª semana de gestação. Na prática, o prazo passaria a ser o limite para a realização do aborto nos casos de mulheres vítimas de estupro, uma das três situações em que a lei autoriza o procedimento —as outras duas são quando há risco para a gestante ou quando o feto sofre de anencefalia. O ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), suspendeu a resolução em maio, por avaliar que ela pode ter extrapolado as atribuições do CFM. O texto, porém, serviu de inspiração para o deputado federal Sóstenes Cavalcante (PL-RJ) apresentar projeto de lei que equipara o aborto ao crime de homicídio nos casos em que haja “viabilidade fetal”, “presumida em gestações acima de 22 semanas”.

O parlamentar foi convidado pelo senador Eduardo Girão (Novo-CE), em junho, para debater a resolução do CFM no Senado. Na audiência, ele mostrou vídeos para reforçar o argumento de que a assistolia causaria dor ao feto. Um dos apoiadores de Câmara na eleição do CFM é o ex-ministro da Saúde do governo Bolsonaro, Marcelo Queiroga (PL). Quando era secretário da Atenção Básica, na gestão Queiroga, a Câmara já havia tentado estabelecer, via portaria, um prazo para a realização do aborto legal, o que não está previsto na legislação. A atual gestão da ministra Nísia Trindade chegou a revogar esta portaria. Mas recuou após receber críticas de parlamentares e movimentos “pró-vida”.

Outra convidada para a sabatina no Senado foi a médica Annelise Meneguesso, candidata a uma vaga no CFM da Paraíba. Ela referiu-se ao aborto como uma “agenda demoníaca” e parte de uma “nova face do marxismo cultural”. No mesmo dia, ela divulgou um vídeo do deputado Cabo Gilberto (PL-PB) em apoio a ela e disse que sua categoria é “humilhada pelo atual governo”.

As diferenças entre a classe médica e o PT remontam ao governo Dilma Rousseff, que atraiu profissionais de saúde estrangeiros para suprir a falta de atendimento no interior do país. Em 2017, já no governo Michel Temer, o então deputado Luiz Henrique Mandetta, crítico recorrente do programa Mais Médicos, articulou a criação da Frente Parlamentar da Medicina, que contribuiu para aproximar o CFM do partido anti-PT. Mais tarde, Mandetta tornou-se Ministro da Saúde no governo Bolsonaro.

A mobilização para a eleição do CFM deste ano vai além do bolsonarismo. Em São Paulo, a chapa da médica Melissa Palmieri recebeu apoio da infectologista Luana Araújo, crítica à atuação do governo Bolsonaro na CPI da Covid. A campanha de Palmieri usa o lema da mudança do CFM, mesmo slogan de um manifesto da Associação Brasileira dos Médicos pela Democracia (ABMMD), que apoia chapas de oposição ao conselho.

No Estado, o bolsonarismo chega dividido. As deputadas Carla Zambelli e Fabiana Barroso, do PL, declararam apoio à chapa de Armando Lobato. Um de seus rivais, Francisco Cardoso, já apareceu na vida de bolsonaristas por defender tratamentos sem comprovação científica na pandemia.

Autora da resolução que buscava restringir o aborto, a atual direção do CFM já demonstrou alinhamento ao bolsonarismo. O atual presidente do conselho, José Hiran da Silva Gallo, comemorou a eleição de Bolsonaro em 2018 em texto publicado no site do Conselho Regional de Medicina (CRM) de Rondônia. Uma de suas deputadas, Rosylane Rocha, conselheira do Distrito Federal, comemorou em suas redes a invasão da sede dos Três Poderes no dia 8 de janeiro.