Apesar de queda nas mortes violentas nos últimos anos, o Brasil ainda é um dos países onde mais se mata

Apesar de queda nas mortes violentas nos últimos anos, o Brasil ainda é um dos países onde mais se mata


A persistência da violência contra as mulheres é um ponto crítico. (Foto: Divulgação)

A principal notícia trazida no panorama da violência no Brasil em 2023, traçado pelo 18º Anuário Brasileiro de Segurança Pública, é positiva: a queda de 3,4% na taxa de mortes violentas (de 23,6 para 22,8 por 100 mil habitantes). É verdade que isso ainda é pouco se comparado à angústia que aflige os cidadãos, mas a pesquisa mostra que a queda do indicador é consistente desde 2017, quando os números bateram recorde, com 64.079 ocorrências (30,8 por 100 mil habitantes). As 46.328 mortes do ano passado representam uma redução de 28% no período. Houve queda na maior parte do país.

Mas os números são demasiado elevados. No momento, cinco brasileiros perdem a vida em homicídios, roubos, lesões corporais letais, feminicídios ou ações policiais. A taxa brasileira é 18,8% superior à média da América Latina e do Caribe (19,2 por 100 mil) e quase quatro vezes a média mundial (5,8 por 100 mil). O Brasil é o 18º país mais violento do mundo, segundo dados do Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime (UNODC). Com apenas 3% da população mundial, é responsável por 10% dos homicídios.

Outro problema é que a violência parece ser desigual. Em uma ponta, está São Paulo, com 7,8 mortes por 100 mil habitantes. Na outra, o Amapá, com 69,9, quase nove vezes. A explicação para a disparidade costuma ser a intensidade da disputa entre as facções criminosas. Nos estados onde passa por uma fase mais aguda, mais pessoas morrem. Dado que as actividades destas organizações transcendem as fronteiras estatais e mesmo nacionais — tornaram-se empresas multinacionais de tráfico de droga — a resposta à crise de segurança não pode ser compartimentada.

Sozinhos, os Estados mais afetados pela violência não dispõem de recursos materiais ou humanos para enfrentá-la. Isto é especialmente verdadeiro nas regiões Norte e Nordeste, onde facções do Sudeste travam guerras com grupos criminosos locais pelo controle dos pontos de venda de drogas, aumentando os índices de criminalidade. É por isso que o governo federal precisa se envolver e coordenar o combate ao crime organizado. Mas, evidentemente, a maioria dos crimes ainda deve ser da responsabilidade dos Estados.

A persistência da violência contra as mulheres é um ponto crítico. Apesar do endurecimento da legislação e das políticas públicas, é uma pena que todos os tipos de crimes tenham crescido. Outro fato que expõe o despreparo da polícia em relação às novas práticas criminosas é a explosão de golpes, principalmente no ambiente digital (a cada 16 segundos, alguém é vítima desse tipo de crime no Brasil). Entre 2018 e 2023, enquanto os roubos caíram 46%, as fraudes aumentaram 360%.

São necessários muitos progressos se o país quiser reverter o cenário atual. As respostas à crise de segurança tiveram pouco ou nenhum efeito. Operações policiais mal planeadas ou brutais acabam por matar mais pessoas – a letalidade policial quase triplicou numa década – sem resultados. Para derrotar as organizações criminosas que se espalharam pelo país, o Brasil precisa urgentemente de uma política nacional baseada na cooperação entre as diversas forças de segurança, em inteligência, investigação, tecnologia, compartilhamento de informações e metas a serem cumpridas. Até que o governo federal assuma um papel de liderança no combate ao crime organizado, resta apenas lamentar cada nova estatística divulgada. (O Globo)