Delegado da PF que indiciou suspeitos de hostilizar Moraes ganha cargo na Europa

BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – A Polícia Federal escolheu o delegado que indiciou a família acusada de assediar o ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Alexandre de Moraes para ocupar, por dois anos, o cargo de oficial de ligação na Europol (agência policial da União Europeia ), em Haia, na Holanda.

Thiago Severo de Rezende foi formalmente nomeado para o cargo pelo diretor-geral da PF, Andrei Passos Rodrigues, duas semanas antes de rever o posicionamento anterior da corporação e decidir indiciar o empresário Roberto Mantovani Filho, sua esposa e seu genro, por suspeita de assediar o magistrado e sua família no aeroporto de Roma, Itália.

O inquérito sobre o ministro do STF foi liderado pelo delegado Hiroshi Sakaki Araújo, do setor de contrainteligência da PF. Ele encerrou a investigação em fevereiro e concluiu que Mantovani cometeu crime de injúria real contra o filho de Moraes.

O delegado, porém, não indiciou o empresário por causa de uma instrução normativa da PF que determinava que o procedimento não fosse realizado por crime de menor potencial ofensivo, com pena máxima de dois anos.

A PGR (Procuradoria-Geral da República) se manifestou contra o entendimento do delegado, e o ministro Dias Toffoli, do Supremo, determinou que a PF continuasse a investigação.

Após a decisão de Toffoli, Sakaki pediu para abandonar o caso. O inquérito foi então repassado a Thiago Severo – chefe direto do deputado. Severo concluiu a investigação no início do mês, revertendo a posição do antecessor e indiciando Mantovani e sua família. A mudança é classificada pelos delegados como algo incomum dentro da corporação.

Normalmente, quando o Ministério Público ou o Tribunal indicam novas diligências ou a continuação da investigação, a PF apenas cumpre as medidas indicadas, mas mantém o relatório final anterior e encaminha os resultados.

A nomeação para cargos no exterior é vista como uma recompensa internamente e é sempre destinada a delegados que ocuparam cargos de chefia ou de sensibilidade na administração da corporação. A maioria das nomeações é por períodos de dois anos.

Segundo policiais ouvidos, a nomeação ocorreu bem antes da partida prevista de Severo, que deverá ir para a Europa apenas em meados do segundo semestre. Procurada, a Polícia Federal não respondeu.

Além da vaga na Holanda, a direção da PF terá uma série de novas nomeações no exterior para fazer nos próximos meses. São vagas para adidos cujo rodízio é de dois anos.

Há discussões internas para nomeações na Inglaterra, nos Estados Unidos, na Itália, no Chile e em Portugal, entre outros países.

Logo no início do governo Lula, Severo foi o responsável pelo relatório que apoiou o pedido de Andrei Passos Rodrigues para a prisão de Anderson Torres e o afastamento de membros do Governo do Distrito Federal pelos atentados de 8 de janeiro.

O documento tem 20 páginas, sendo 14 delas tomadas por imagens. Ele defendeu a importância de investigar uma “possível omissão de autoridades públicas que tinham o dever legal de agir e acabaram por deixar de agir” e concluiu que as imagens mostravam que “um evidente erro de avaliação pode ter sido cometido pela PM-DF e pela SSP/ D.F.”.

Mesmo sem citar Torres, o relatório foi enviado por Andrei para solicitar a prisão do ex-ministro e então comandante da Polícia Militar do DF, coronel Fábio Augusto Vieira.

Thiago Severo de Rezende era da Diretoria de Inteligência Policial, setor da PF que, como mostrou a Folha de S.Paulo, foi inflado durante a gestão de Andrei, quando recebeu a incumbência de conduzir investigações relacionadas ao ex-presidente Jair Bolsonaro (PL).

Há uma área específica na PF responsável pelas investigações que ocorrem nos tribunais superiores – o setor, porém, foi esvaziado desde 2022 e perdeu funções.

Atualmente, o setor da Diretoria de Inteligência que coordena as investigações contra Bolsonaro é comandado por Severo – que só deverá se mudar para a Holanda após a conclusão das investigações sobre as intenções golpistas do ex-presidente.