A sorte parece não ter acompanhado os brasileiros condenados ou investigados pelo 8 de janeiro que procurou refúgio em Argentina acreditando que estariam mais seguros na terra da direita Javier Milei. Em primeiro lugar, porque o país deixou de reconhecer, desde 22 de Outubro, o estatuto de refugiado a estrangeiros que cometeram crimes graves. Segundo, porque a primeira leva de pedidos de extradição será julgada pelo juiz Daniel Rafecasda 3ª Vara Federal da Argentina, que emitiu na semana passada mandados de prisão contra 61 brasileiros. O mandado foi publicado cerca de um mês depois que o ministro Alexandre de Moraesdo Supremo Tribunal Federal (STF)solicitou por via diplomática a extradição de 63 fugitivos que viviam no país vizinho — confira a reportagem da última edição de VEJA sobre os fugitivos de 8 de janeiro que vivem na Argentina.
O magistrado argentino tem um histórico rigoroso contra intervenções militares em regimes democráticos. O maior caso da carreira de Rafecas é o que julga a atuação do Primeiro Corpo de Exército durante a ditadura militar. O caso ainda está aberto, mas o magistrado já identificou cinquenta centros clandestinos de sequestro e tortura, responsabilizou 300 pessoas e reconheceu 3 mil vítimas. O juiz chegou a julgar o ex-general Jorge Videla, ditador do país vizinho entre 1976 e 1981. Quando sentou-se no banco dos réus em frente ao Rafecas, em 2010, Videla já havia sido condenado por diversos crimes e foi novamente condenado por 30 homicídios, 555 sequestros e 264 casos de tortura ocorreram sob a jurisdição do Primeiro Corpo de Exército. O ditador morreu em sua cela em 2013 de causas naturais.
Em 2015, Rafecas rejeitou denúncia contra a então presidente Cristina Kirchner de ter encoberto um ataque à Associação Mutual Israelita Argentina (AMIA) que matou 85 pessoas em 1994. O promotor do caso, Alberto Nisman, foi morto com um tiro na cabeça dentro de sua casa quatro dias após registrar a denúncia.
Deputados ligados ao atual presidente Javier Milei, ferrenho opositor do kirchnerismo, acusam Rafecas de viés ideológico e questionam a legalidade dos mandados de prisão contra brasileiros. Em vídeo que circula nas redes sociais de apoiadores de Bolsonaro, a deputada Maria Celeste Ponce, do La Libertad Avanza, partido de Milei, classifica as prisões como ilegais “por um juiz ligado à extrema esquerda argentina”.
Agora, em relação aos foragidos brasileiros, Rafecas terá que verificar o cumprimento dos requisitos legais de extradição, como se o pedido de extradição de Moraes tem motivações políticas, além da idade e do estado de saúde dos réus.
Em nota enviada a VEJA, o Ministério da Justiça e Segurança Pública disse que o pedido de extradição será julgado de acordo com o acordo de extradição em vigor entre os dois países. O retorno ao Brasil, porém, dependerá dos trâmites da justiça argentina.
“A regra para o retorno ao Brasil de pessoas para as quais tenham sido feitos pedidos de extradição para outro país, inclusive a Argentina, é a prisão dessas pessoas, que poderá ser seguida de sua extradição para o Brasil, após os devidos trâmites internos do país em questão . Mas existem algumas hipóteses em que a prisão preventiva para fins de extradição não ocorre em regime fechado. Outra possibilidade seria o retorno voluntário das pessoas em questão ao Brasil, o que não é provável”, escreveu o ministério.
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