A Alemanha leva a sério a política de preservar testemunhos da Segunda Guerra Mundial e de manter viva a memória dos crimes nazistas. Em Berlim, capital do país e centro cultural do país, o Museu Judaico e o Memorial do Holocausto estão entre os principais locais a visitar. A lista de iniciativas na mesma linha inclui até um bunker nazista transformado em galeria de arte no badalado bairro de Mitte. Além de ser um local aberto à visitação pública, é também endereço da família que mora na cobertura do local há mais de dez anos.
Idealizado sob o comando de Hitler em 1943, o projeto do bunker em questão seguiu as orientações de Albert Speer, arquiteto-chefe do Terceiro Reich, para poder abrigar 3.000 pessoas sentadas e protegê-las de ataques durante a guerra. Foi uma das poucas obras deste tipo construídas acima do nível da rua — e não no subsolo, como era mais comum. Por isso, as estruturas foram ainda mais reforçadas, com paredes de um metro e oitenta centímetros de espessura e teto de três metros de profundidade. Tudo isso em um box simétrico de 5 andares com janelas bem finas e linhas simples.
Com a queda do regime nazista, o bunker passou a ter vários “donos”. Tornou-se um armazém de frutas tropicais conhecido na época como Banana Bunker e também foi palco de diversas festas techno no início dos anos 90 até ser fechado pela polícia em 1995. Depois de um tempo, passou para as mãos de Christian Boros, um executivo de publicidade. homem rico que decidiu comprar o imóvel e transformá-lo em galeria de arte e casa própria. A transformação foi realizada pelo escritório alemão Realarchitektur e teve início em 2004. O projeto buscou manter o máximo possível das características originais do local. As paredes passaram apenas por um processo de limpeza. Assim, preservam vestígios de suor, sangue e tinta neon que foram deixados pelas diversas pessoas que por ali passaram ao longo da existência do local.
Em 2014 estive lá e só vi parte da galeria. Na época, abrigava uma coleção de arte moderna do próprio Christian Boros. Conhecer o local é um programa muito interessante, principalmente para quem gosta de arquitetura, urbanismo e história. Caminhar pelos espaços, imaginando a razão da sua existência e a sua transformação para um propósito tão diferente, é muito interessante. O tamanho das paredes chama muito a atenção, assim como o esforço feito para adaptar cada lugar a um novo significado. Este trabalho envolveu a passagem de tubulações para banheiros e ar condicionado em pedras de concreto de quase dois metros de altura. Alguns ambientes mantêm a altura original de 2,30m e é aqui que você tem a sensação mais claustrofóbica. Enquanto isso, outros espaços foram originalmente projetados para alturas de até 6 metros. Você não pode deixar de ficar impressionado com o concreto intacto da época e imaginar como deve ser viver e criar seus filhos em um lugar com tanto simbolismo.
A família do proprietário Christian Boros parece gostar da residência improvável, pois continua morando no local bastante luxuoso, sem nenhuma lembrança da proposta minimalista de sobrevivência que foi encomendada por Hitler. O acesso ao casarão no topo do edifício é feito por uma escada de aço que atravessa o teto de três metros de espessura e tem 450m2. A vista deve ser maravilhosa e facilitada por toda a parede de vidro que permite a entrada de luz no ambiente. Um lindo jardim circunda toda a residência e pode ser visto de fora. A cobertura também possui uma piscina esculpida no concreto original. “É impossível esquecer o passado quando se vive num edifício monstruoso que respira a sua inevitável severidade”, disse Karen Boros, esposa de Christian.
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