“Dólar dificilmente vai cair fortemente”, diz economista que vê estouro da inflação

“Dólar dificilmente vai cair fortemente”, diz economista que vê estouro da inflação


O dólar já subiu 17,5% em 2024, alimentos e energia mais caros devido à seca são as principais pressões. (Foto: Freepik)

Luís Otávio Leal é economista-chefe da G5 Partners e monitoriza os indicadores de preços com uma lupa. Para ele, são poucos os fatores que podem fazer com que a inflação fique dentro da meta estabelecida pelo governo de 3%, que pode variar entre 1,5% e 4,5%.

Em entrevista ao jornal O Globo, ele prevê 4,60% este ano. “O dólar já subiu 17,5% em 2024, alimentos e energia mais caros por conta da seca são as principais pressões”, afirma.

1-O que fez os analistas revisarem a previsão do Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) de 4,39% para 4,5%, exatamente no topo da meta em apenas uma semana?

Há duas coisas diretamente ligadas à seca. Até há um mês, todos previam bandeira verde (sem acréscimos na conta de luz) no final do ano. Agora, há analistas prevendo amarelo (com mais R$ 1,88 a cada 100 kW/h), ou vermelho 1 (mais R$ 4,46).

Houve uma mudança na questão energética. Há uma segunda coisa que é a taxa de câmbio. Achei que o dólar ficaria em R$ 5,30 até o final do ano. Agora estou prevendo entre R$ 5,40 e R$ 5,50 (fechou nesta segunda em R$ 5,69). Esse fator acrescenta algo mais à inflação.

2-E a comida?

Esta é a questão mais relevante, com o aumento dos preços dos alimentos concentrado basicamente na carne. Por causa do aumento dos preços da carne, mudei minha projeção para alimentação em casa de 7% para 8%. Estou muito preocupado com isso. A mudança na minha projeção de inflação para o ano, de 4,40% para 4,60%, deveu-se ao aumento dos preços das carnes.

Além da entressafra (o pasto fica mais seco e o pecuarista tem que alimentar o gado com ração), o preço da arroba caiu nos últimos dois anos. Isto levou os criadores de gado a abater porcas, o que reduziu a oferta de carne. Não é apenas um problema de seca. Com o aumento do preço da arroba, novas matrizes foram confinadas, mas isso só afetará a oferta por até seis meses. O preço da carne bovina subiu quase 16%. Já apareceu 6% no atacado, 2% no varejo. Deve continuar a subir.

3-Existe algum alívio para compensar esses aumentos?

Olhando para o futuro, é difícil ser optimista. É pouco provável que o dólar caia fortemente, não está chovendo e o preço da carne não voltará tão cedo. Uma coisa que poderia ajudar é a queda dos preços do petróleo, mas com o dólar neste nível e a tensão no Médio Oriente, é difícil encontrar ali alívio.

Se chover mais, o ano pode terminar com bandeira amarela, o que pode derrubar um pouco a inflação (atualmente está no patamar vermelho 2, que soma R$ 7,87 para cada 100 kWh consumidos). É muito provável que o presidente do Banco Central tenha que escrever outra carta explicando porque não atingiu a meta de inflação.

4-Isso altera a trajetória das taxas de juros?

Teoricamente, não deveria afectar as expectativas das taxas de juro, se o que as pressiona são choques de oferta. O problema são os choques de segunda ordem, pois temos uma economia muito indexada. Exemplo disso é o salário mínimo, que deverá subir cerca de 7% no próximo ano.

Como é que leva a inflação para uma meta de 3% com o salário mínimo a subir 7%. A inflação dos serviços permanecerá sob pressão. As taxas de juros deverão continuar subindo até atingir 12% ao ano no primeiro semestre do próximo ano (atualmente em 10,75%).