Adoção por casais homoafetivos cresce 186% em quatro anos

Adoção por casais homoafetivos cresce 186% em quatro anos


Atualmente, são 4.940 crianças e adolescentes à espera de pais adotivos.

Foto: Marcello Casal Jr./Agência Brasil

Atualmente, são 4.940 crianças e adolescentes à espera de pais adotivos. (Foto: Marcello Casal Jr./Agência Brasil)

Juntos há 14 anos, Osvaldo Maffei Junior e Carlos Henrique Braga decidiram adotar uma criança durante a pandemia. Em maio de 2023 chegaram dois: Aylla e Victor, de 3 e 6 anos. Para que esse encontro acontecesse, o casal contou com o apoio de um grupo que acolhe pretendentes, principalmente gays, e os ajuda a lidar com possíveis obstáculos e manifestações de preconceito ao longo do caminho. caminho. Esses fatos se repetem com outros casais do mesmo sexo que decidem adotar crianças ou adolescentes, iniciativa que cresceu 186% — ou quase triplicou — entre a população LGBTQIA+ no Brasil, de 2019 a 2023.

Maffei acredita que teve sorte. Ainda durante o processo de habilitação para adoção, encontraram um grupo de apoio no Rio. Depois de muita orientação e abertura para aceitar crianças maiores, independente de raça e com irmãos, concluíram a adoção. O preconceito foi percebido principalmente quando foram visitar Aylla e Victor no abrigo.

“Todo o processo judicial foi incrível. Um dia estávamos em 440º lugar na fila e depois passamos para 1º porque foi avaliado nosso perfil como profissionais da educação e como casal gay, porque Victor tem TDAH (transtorno de déficit de atenção e hiperatividade) e resistência à figura materna. Mas durante as visitas, os agentes do abrigo, que muitas vezes não recebem orientações sobre diversidade, nos olhavam com estranheza e demoravam para permitir que as crianças saíssem. É tudo muito sutil”, lembra Maffei.

De acordo com o Sistema Nacional de Adoção e Acolhimento (SNA) do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), 23.918 crianças e adolescentes foram adotados desde 2019. Destes, 1.535 por casais do mesmo sexo, ou 6,4% do total. O número passou de 145 adoções em 2019 para 416 no ano passado. Em 2024, ocorreram 203 adoções por casais gays.

Atualmente, são 4.940 crianças e adolescentes à espera de pais adotivos. Dos 35.562 adultos que pretendem ser pais, 7% são homossexuais. Não existem obstáculos legais para casais do mesmo sexo adotarem crianças. O Supremo Tribunal Federal (STF) reconheceu as uniões estáveis ​​deste tipo em 2011 e uma nova decisão em 2015 reforçou o direito à adoção. O processo é igual para todos: coleta de documentos, entrevistas com psicólogos e assistentes sociais e visitas a abrigos, até aprovação do juiz.

Porém, o advogado de família Givanildo Freire aponta o estigma, a falta de informação e acolhimento como motivos para o medo da adoção entre a comunidade LGBTQIA+. Outro fator é que os tribunais nem sempre seguem a jurisprudência do STF.

“Há relatos de decisões judiciais mais lentas ou processos mais rigorosos quando os adotantes são casais LGBT. Principalmente no interior, onde o preconceito pode estar mais arraigado. Muitos casais também enfrentam resistência de familiares ou críticas nas redes sociais”, explica a advogada.

A vontade de ser pai e a falta de informação sobre o que fazer levaram o advogado Saulo Amorim, 42, a fundar seu próprio grupo de apoio no Rio. Cores da Adoção nasceu em 2017, meses após a chegada de Teodoro, primeiro filho de Amorim.

“Criamos um espaço de orientação e acolhimento, onde as crianças crescem sabendo que a diversidade é benéfica. O que afasta as famílias LGBTI+ da adoção ainda é a LGBTIfobia, a crença de que o processo é burocrático e a falta de informação”, reconhece Saulo Amorim.

Em linha

Juntas há 12 anos, a terapeuta Carolina Rua, 39, e a empresária Laís Guerra, 36, recorreram ao Cores da Adoção para o processo de “gestar um filho no coração”. Mas aguardam a aprovação da Justiça há pouco mais de um ano, após enviarem a documentação necessária para adoção a um Juizado da Criança, do Jovem e do Idoso.

Carolina e Laís ainda ampliaram o perfil para que a espera seja menor. O casal se dispôs a acolher crianças mais velhas e doentes. A mudança de perspectiva levou o terapeuta a criar um jogo para ajudar os aspirantes a adotantes a se aprofundarem na adoção tardia. O jogo é inspirado em Harry Potter: assim como o bruxo dos filmes, a maioria das crianças em abrigos tem mais de 7 anos.

“Muitas coisas interferem no atraso. São muitos documentos, o perfil escolhido também influencia. O jogo que criei tem a função de desmistificar a adoção tardia e ampliar a perspectiva dos pretendentes para essas crianças”, afirma Carolina.

A assistente social do Tribunal de Justiça da Bahia Denise Ferreira explica que um dos desafios que atrasa a adoção é adequar o perfil da criança real disponível com o que os pretendentes procuram.

“Cerca de 70% das crianças elegíveis são negras e mais velhas. Quanto mais flexível for o perfil, mais rápido será o processo”, acrescenta.

Para agilizar o encontro entre adotantes e abrigados, uma lei aprovada este ano tornou obrigatória a consulta do SNA pelos juízes. Até então, a busca por pretendentes em diferentes estados era feita por iniciativa de juízes e grupos de apoio à adoção. As informações são do portal de notícias O Globo.