Filme ‘O Poço 2’: tão ruim quanto um debate para a…

Uma mulher atormentada por uma tragédia passada entra, por vontade própria, numa instalação vertical onde pretende reflectir sobre a sua participação naquele acontecimento. Ela não sabe, porém, que o local é uma prisão violenta, dividida em níveis, onde as pessoas enlouquecem ou morrem de fome por causa da estranha distribuição de alimentos: diariamente, uma plataforma desce do nível 1 até o 333, o último . Cada nível abriga duas pessoas — que acordam aleatoriamente em outro andar na virada do mês. Os sortudos que acordam nos primeiros níveis se empanturram de festa, deixando pouco ou absolutamente nada para os que estão abaixo. A peculiar trama foi apresentada em 2019, no filme espanhol O poço que vence, nesta sexta-feira, a sequência chamada simplesmente O Poço 2na Netflix.

Enquanto a primeira explicava basicamente ao espectador a dinâmica do lugar, a nova produção dirigida por Galder Gaztelu-Urrutia, e estrelada pela atriz Milena Smit — no papel da mulher em busca de redenção através do sofrimento — agora se propõe a explorar teorias políticas. Se esse poço é bastante profundo, o mesmo não se pode dizer do roteiro da trama e de suas ideias. Como o recurso anterior, O Poço 2 É uma mistura de terror sangrento, com muito sangue e cenas nojentas envolvendo comida, e uma metáfora social que toca de tudo um pouco sem chegar a lugar nenhum —qualquer semelhança com os debates eleitorais para a prefeitura de São Paulo é pura coincidência. A história inclui uma seita religiosa, teorias extremas do comunismo e do neoliberalismo, tentativas de revolução e conversas errôneas sobre o que é a desigualdade social.

Desta vez, um grupo autodeclarado ungido supervisiona todos os níveis, pregando a solidariedade e a consciência de que se todos comerem apenas o que lhes é dado, então haverá comida para todos. Com infiltrados em vários níveis, os integrantes dessa trupe deixam os discursos de paz e amor de lado quando, ao perceberem que um indivíduo não cumpriu a lei, vão até o rebelde e o matam brutalmente — ou aplicam punições, como cortar fora de um braço. Ir além disso é entrar no campo minado dos spoilers. Também está tentando explicar o inexplicável. Na tentativa de ser cult, o filme deixa pontas soltas, mostra grupos de personagens sem justificativa e não economiza em conversa fiada. A jornada pelo poço é individual —e exige estômago e um pouco de paciência para chegar ao fim com um pingo de sanidade: há outra semelhança com os debates eleitorais —infelizmente, não só os de São Paulo.