Especialistas cobram regulação e atuação de plataformas digitais para garantir proteção de crianças e adolescentes – Notícias

Especialistas cobram regulação e atuação de plataformas digitais para garantir proteção de crianças e adolescentes – Notícias


14/08/2024 – 15:57

Vinicius Loures/Câmara dos Deputados

Deputada Luisa Canziani preside audiência pública

Especialistas cobraram a regulamentação das plataformas digitais e a atuação das empresas para garantir a proteção de crianças e adolescentes, em audiência sobre uso de tecnologia e uso excessivo de tela por esse público na Câmara dos Deputados. O debate foi promovido pela Comissão de Ciência, Tecnologia e Inovação nesta quarta-feira (14) a pedido da deputada Luisa Canziani (PSD-PR).

Segundo a pesquisa TIC Kids Online Brasil 2023, 95% da população de 9 a 17 anos é usuária de internet no país. Fundador do Grupo de Dependências Tecnológicas do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, Cristiano Nabuco destacou que a média de tempo gasto na internet por dia, no mundo, é de 6h37, enquanto no Brasil a média é 9h15, 3h37 interagindo nas redes sociais. Além disso, o pesquisadora afirmou que o Brasil é o terceiro no mundo em termos de dependência de tela entre crianças.

Os problemas causados ​​pelo uso excessivo de telas incluem depressão, ansiedade, isolamento social e perda de memória recente, além de outros impactos cognitivos, como redução da criatividade e comprometimento do desenvolvimento da linguagem.

Arranjos
Segundo o médico, é necessário que, em conjunto, o governo, as organizações académicas, os especialistas em saúde pública e as empresas estabeleçam padrões de utilização saudável e segura, adequada à idade, nas plataformas digitais.

Além disso, é necessário proteger as crianças de conteúdos nocivos – como publicações que incentivam distúrbios alimentares, violência, abuso de substâncias, exploração sexual e suicídio.

Cristiano Nabuco também defende que as empresas compartilhem dados relevantes sobre o uso das redes por crianças e adolescentes. “Essas empresas de mídia precisam urgentemente ser auditadas ou compartilhar claramente os dados que possuem”, disse ele.

“A grande questão que as publicações internacionais vão levantar é a seguinte: porque é que a sociedade civil paga o preço da falta de transparência de uma política mais clara relativamente a toda esta prática?”, questionou.

Uso qualificado
Diretora Executiva do Instituto Alana, organização da sociedade civil em defesa das crianças, Isabella Vieira Henriques lembrou que o ambiente digital não foi criado para as crianças e que grande parte do conteúdo consumido por elas não é amigável ou sensível às suas peculiaridades.

Esse conteúdo, segundo ela, foi criado com base na economia da atenção – ou seja, foi criado justamente para captar a atenção do usuário – e com um modelo de negócio baseado na exploração comercial de dados.

Isabella citou dados da pesquisa TIC Kids Online Brasil 2023 que mostram que 88% das crianças e adolescentes de 9 a 17 anos que acessam a internet possuem perfil em plataformas digitais, mesmo que os termos de uso limitem o acesso a maiores de 13 anos.

Superexposição infantil
A diretora do Instituto Alana também chama a atenção para o fenômeno da superexposição da imagem de crianças e adolescentes por parte de mães, pais e familiares, criando um rastro digital que perdurará por muito tempo.

Outro impacto social lembrado pelo diretor é o surgimento de influenciadores infantis, ou seja, do trabalho infantil artístico no ambiente digital, que ainda não é regulamentado.

Isabella Vieira destaca ainda que a idade em que as crianças brasileiras acessam pela primeira vez a Internet vem avançando nos últimos anos. Ainda segundo a pesquisa TIC Kids Online Brasil 2023, 24% dos entrevistados relataram ter começado a se conectar à rede na primeira infância, ou seja, até os seis anos de idade. Na edição de 2015, essa proporção era de 11%.

Contas
Diretor fundador da Data Privacy Brasil e membro titular do Conselho Nacional de Proteção de Dados, Bruno Bioni citou algumas normas que atualmente protegem crianças e adolescentes na internet. Estas incluem o Comentário Geral 25/21 do Comité das Nações Unidas sobre os Direitos da Criança, que estabelece que a Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos da Criança também se aplica ao ambiente digital; e o resolução recente do Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (Conanda), que responsabiliza todos, inclusive as empresas, por proteção dos direitos de crianças e adolescentes em ambientes digitais.

No Parlamento, entre os projetos que podem estabelecer normas de proteção estão:

  • PL 2628/22, do senador Alessandro Vieira (MDB-SE), que busca proteger crianças e adolescentes em ambientes digitais, como criar mecanismos de verificação da idade dos usuários;
  • Projeto de Lei 2630/20, conhecido como PL das fake news, que prevê, entre outras medidas, acesso a dados sobre o funcionamento dos algoritmos sociais. Esse texto foi aprovado no Senado e está em análise na Câmara desde 2020, com diversas propostas apegado;
  • PL 2338/23, do senador Rodrigo Pacheco (PSD-MG), que regulamenta a inteligência artificial.

Política de proteção
Representante da Secretaria Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente, do Ministério dos Direitos Humanos e Cidadania, Marta Volpi informou que o Conanda criou um grupo de trabalho com a participação de diversos ministérios, secretarias governamentais e entidades da sociedade civil justamente para formular uma política de proteção para crianças no ambiente digital.

Além disso, em outubro, segundo ela, o governo lançará um guia de proteção ao uso de telas para famílias e escolas. Ela reitera, porém, que toda a legislação de proteção infantil já é aplicável à internet e chama a atenção para outro problema: a transferência das tarefas de cuidado para as telas, devido à carga de trabalho das famílias e à falta de espaços de cuidado.

Recomendações
Coordenadora do Grupo de Trabalho Saúde Digital da Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP), Evelyn Eisenstein trouxe algumas recomendações para o uso de telas na infância e adolescência:

  • Até 3 anos: sem telas;
  • Dos 3 aos 5 anos: utilização com restrições e supervisão – por exemplo, desenhos animados acompanhados pelos pais – durante 30 a 60 minutos por dia;
  • Dos 6 aos 10 anos: desenhos animados, jogos online, vídeos apropriados de acordo com a classificação indicativa, durante 1 a 2 horas por dia;
  • A partir dos 13 anos: redes sociais.

Segundo a pediatra, o principal problema é o uso prolongado de telas, ou seja, mais de 4 ou 5 horas por dia, o que pode levar ao vício digital, problemas de saúde mental, déficit de atenção, hiperatividade e distúrbios do sono, sedentarismo, visual, problemas auditivos e posturais, riscos ao desenvolvimento da sexualidade, entre outros.

Ela também destacou o risco de as crianças participarem de jogos online perigosos, como asfixia e lesões, que podem ser fatais.

“As empresas têm uma responsabilidade, uma vez denunciados esses influenciadores precisam ser não só bloqueados, mas também deletados”, finalizou. Entre as recomendações para a família, ela mencionou desligar antes da rotina de dormir, restringir o uso durante as atividades escolares e incentivar as pessoas a brincarem sem celular. Ela também recomenda que os pais sejam um modelo de desconexão para os filhos.

“A aprendizagem das crianças se dá por meio da repetição”, reiterou a coordenadora do Comitê Gestor da Internet no Brasil (CGI.br), Renata Mielli. Ela também enfatizou a necessidade de investimento em equipamentos públicos (quadras esportivas, por exemplo) para oferecer alternativas de lazer às crianças, e investimento em escolas de tempo integral.

Exposição à publicidade
Na opinião do coordenador do CGI, um dos maiores problemas da presença massiva de crianças nas redes sociais é a exposição ilegal à publicidade. A publicidade direcionada a esse público já é proibida pela legislação brasileira.

Segundo ela, é preciso regulamentar as redes para proibir efetivamente menores de 13 anos de criar perfis e promover campanhas públicas para orientar as famílias.

Segundo Renata Mielli, apenas 28% dos pais possuem dispositivos de controle parental – que são aplicativos para controlar o que a criança faz na internet.

Visão das empresas
Os representantes das plataformas digitais garantiram que procuram promover um ambiente seguro para crianças e adolescentes e, para isso, consultam especialistas e promovem pesquisas com adolescentes e seus pais.

Todos garantiram a remoção de conteúdos lesivos aos direitos de crianças e adolescentes, como a sexualização de menores, e aqueles relacionados a suicídio, mutilação e transtornos alimentares. Isso é feito a partir de denúncias e principalmente por meio de inteligência artificial, com revisores humanos.

Gerente de Políticas Públicas de Segurança e Bem-Estar da Meta no Brasil, Tais Nigginegger acrescentou que a plataforma disponibiliza ferramentas de supervisão para os pais, por meio das quais eles podem, por exemplo, ver quanto tempo o adolescente passou na plataforma e estabelecer limites, visualizar quem é seu filho segue nas redes sociais e se as configurações de privacidade foram alteradas.

Ela informou ainda que a empresa vem aprimorando as ferramentas para verificar a idade do usuário. A Meta é responsável pelas redes sociais Facebook, Instagram e WhatsApp.

Gerente de Relações Governamentais e Políticas Públicas do Youtube no Brasil, Alana Rizzo acrescentou que a empresa não veicula anúncios personalizados para menores de 18 anos e que a família pode personalizar a experiência.

Gerente de Políticas Públicas do TikTok no Brasil, Gustavo Rodrigues informou ainda que a plataforma disponibiliza uma ferramenta de sincronização familiar, que permite aos pais vincular sua conta à do filho adolescente e definir controles. Segundo ele, para todas as contas menores de 18 anos, o tempo diário de tela é de 60 minutos e, quando esse tempo for atingido, o adolescente só poderá continuar digitando uma senha definida pela família. Além disso, para contas menores de 16 anos, apenas amigos podem comentar nos vídeos e mensagens diretas não podem ser enviadas e recebidas.

Diretora de Relações Institucionais e Governamentais da Associação Brasileira de Desenvolvedores de Jogos Eletrônicos (Abragames), Raquel Gontijo, por sua vez, destacou que a tecnologia já faz parte do dia a dia de crianças e jovens e é preciso promover o uso saudável e seguro, levando em consideração não só o tempo de tela, mas a qualidade de uso, além de construir uma regulação equilibrada.

Relatório – Lara Haje
Edição – Natalia Doederlein



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