Em 2018, mais precisamente até agosto daquele ano, era mais que normal ouvir que Bolsonaro Ele era louco, tinha pouco a ver com política profissional e ninguém o levava a sério. Não vai valer nada, disseram alguns. Alckminna época candidato do PSDB, era visto como aquele que no momento certo mudaria o jogo, porque tinha tempo de televisão, dada a gigantesca coligação de partidos que o apoiavam. Todos nós sabemos o resultado. Bolsonaro foi eleito presidente em uma eleição perturbadora e deixou Alckmin e figurões como Henrique Meirelles no final da disputa.
Após o debate na rede Bandeirantes na cidade de São Paulo na última quinta-feira, 8, muitos olharam para Pablo Marçal e disseram que o maluco é o treinador. Talvez não seja necessário ir muito longe para perceber que, de fato, Marçal é alguém para lá de desequilibrado. A história, parcialmente revelada no debate, mostra que o candidato do PRTB tem um passado complexo para lidar. Acusações e condenações envolvendo furto qualificado estão no âmbito de Marçal. Não faltam polémicas no currículo do treinador motivacional, que já levou pessoas ao Pico do Marins, em condições climatéricas que quase terminaram em tragédia. A lista é longa.
Mesmo com as condenações e acusações, Marçal tem um trunfo importante na corrida eleitoral. O coach se vende com um combo que precisa ser visto com muito cuidado: bem-sucedido financeiramente, empresário de sucesso, com aparência de alguém que “se cuida” e, claro, um cristão muito fiel. Longe de acreditar que esta possa ser a verdade sobre Marçal, o importante é perceber que ele consegue estabelecer esta persona junto de um bom número de eleitores, dada a sua posição nas sondagens, empatada com José Luiz Datena apresentadora de quase 30 anos de televisão e muito conhecida pelo eleitorado paulista.
Na coluna da semana passada, ao analisar os candidatos na disputa pela prefeitura de São Paulo, procurei chamar a atenção para esse trunfo do sucesso financeiro e do estilo empreendedor que repercute muito bem nos eleitores. Ir na contramão era a ideia de sucesso educacional, como a do candidato Tabata Amaral do PSB, que tenta se mostrar como alguém que teve sucesso na vida estudando e buscando um lugar na sociedade, mesmo que esse não tenha sido o destino traçado para ele.
Claro que será preciso entender se o discurso motivacional e empreendedor será suficiente. Em 2018, Bolsonaro, com jeito simples e jocoso, aquele que comia pão com leite condensado, conquistou eleitores de todas as classes com estilo outsider – apesar de ser um político profissional com mais de 28 anos de carreira no Congresso Nacional. Pelo contrário, Marçal é o rico, que despreza as favelas, que comparou a campos de concentração no debate da Band. Ele acha que alcançará os eleitores fazendo com que a “mentalidade” do eleitor seja ativada por seus comandos motivacionais.
Além disso, faltou-lhe desenvoltura e um mínimo de, surpreenda o leitor, equilíbrio emocional, quando questionado sobre as suas acusações e convicções, muitas das quais trazidas ao centro do debate pela candidata Tábata Amaral, para quem conseguiu extrapolar todos os tipos de desrespeito e machismo. Se alguém acha que isso pode ser um grande problema – além, claro, de ser um absurdo – não esqueçamos que Bolsonaro foi eleito com todo o histórico que teve, lembrando o tão divulgado caso com o deputado Maria do Rosáriocuja frase não vale a pena repetir.
Bolsonaro superou a barreira da internet e se mostrou capaz de convencer os eleitores, apesar de todo o seu passado. É preciso olhar para Marçal e ver se ele conseguirá, apesar das suas características controversas, convencer os eleitores de que é melhor do que os políticos profissionais que disputam a mais importante cadeira de prefeito do país. O ex-presidente Bolsonaro soube entender que o mundo da internet é muito diferente daquele habitado pelos políticos. Será que Marçal saberá jogar este jogo? Para ser visto.
*Rodrigo Vicente Silva é mestre e doutor em Ciência Política (UFPR-PR). Estudou História (PUC-PR) e Jornalismo (Cásper Líbero). É editor-adjunto da Revista de Sociologia e Política. Está vinculado ao grupo de pesquisa Representação e Legitimidade Democrática (INCT-ReDem). Contribua semanalmente para a coluna
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