Quatro ex-vereadores da Câmara Municipal de BH mudaram suas declarações de cor/raça para concorrer às eleições deste ano. Segundo levantamento do EM Data Center, Autair Gomes (PSD), Elvis Côrtes (PSD), Pedro Bueno (PRD) e Orlei (Cidadania) alteraram as informações do cadastro realizado junto ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE).
Autair Gomes declarou-se pardo em 2020, quando não conseguiu ser reeleito para o cargo. Este ano, quando tentará retornar à Câmara, o pastor da Igreja Quadrangular preencheu seu cadastro como negro. Procurado pela reportagem, o candidato disse que houve “erro no preenchimento”. Ele garantiu que corrigirá as informações.
Nos casos de Elvis Côrtes e Pedro Bueno, a mudança na declaração já havia ocorrido em 2022, quando ambos disputavam uma vaga na Câmara dos Deputados. Em 2020, o primeiro se identificou como pardo. Agora, ele se vê como branco. Procurado, Côrtes não comentou a mudança.
Já Bueno seguiu o caminho inverso: era branco e passou a se ver como pardo. “É apenas uma reflexão histórica profunda sobre a nossa miscigenação, simplesmente por isso. Considerando, portanto, a maior possibilidade de ser candidato pardo. Quero ser o mais assertivo possível e procurei não levar em consideração apenas a cor da pele”, disse ele, ao ser contatado pelo repórter.
Fora da Câmara Municipal de BH desde 2020, quando não buscou a reeleição, o ex-vereador Orlei mudou sua declaração em relação a 2022, quando tentou ser deputado federal. Há dois anos, ele se declarou pardo. Agora tão branco. A repórter tentou contato com o político do Cidadania, mas não obteve resposta.
Outros sete candidatos à Câmara de BH mudaram suas declarações em relação às eleições anteriores, todos sem mandatos no currículo. Sumaia Abençoada (Progressistas), Lucas Prates (Podemos) e Marcélia do Querite (PRD) se viam pardos nas eleições anteriores, mas registraram suas chapas no TSE como brancas este ano.
O caso que mais chama a atenção é o de Zói Bad Boy O Retorno (PSD). Há dois anos, quando tentou ser deputado federal, declarou-se branco. Agora como preto. Michele da Creche (Progressistas) também passou a se ver negra, após se declarar parda em 2020.
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Micaela Oliveira (PSDB) se identificou como branca em 2020, mas, desde 2022, quando tentou ser deputada estadual, se declarou parda. Milo, da Distribuidora (PSD), também passou a se ver como pardo, após se registrar como preto até 2020.
Dos 41 vereadores eleitos em BH em 2020, 28 se declararam brancos na época, o que totaliza 68,2% das cadeiras na Câmara. Os negros ocupavam 13 vagas (31,7%), sendo oito ocupadas por pardos e cinco por negros. Os números estão longe de refletir a realidade da população da capital mineira. De acordo com o Censo 2022, 43,6% da população da cidade se autodeclara branca, enquanto 56,1% se identifica como preta, sendo 42,6% como parda e 13,5% como preta. Outros 0,2% se consideram amarelos e 0,1% como indígenas.
Os dados apresentados neste relatório são preliminares, pois os partidos políticos podem registrar chapas no Tribunal Regional Eleitoral de Minas Gerais (TRE-MG) até o dia 15 de agosto. As informações foram consolidadas na última quinta-feira, por meio do acesso ao portal de dados abertos do TSE.
Análises de especialistas
O professor de sociologia política da UFMG, Jorge Alexandre Neves, analisa o caso com atenção, mas pede maior fiscalização das autoridades nos casos de mudança de autodeclaração de cor. “O TSE tem que se endurecer, porque a possibilidade de fraude para burlar a legislação eleitoral nesses casos é muito grande. A área eleitoral tem que caminhar na mesma direção que as universidades têm caminhado. .
Mesmo assim, o especialista faz a ressalva de que nem todo caso de alteração da autodeclaração é necessariamente uma fraude. “É suspeito, mas não significa 100% fraude. Podem ser pessoas que nunca pensaram muito sobre esse assunto e se enxergaram de uma determinada forma. Acontece principalmente com os pardos, mas quem tem que dizer isso é a Justiça Eleitoral, não só o candidato”, afirma.
Existe cota eleitoral?
Desde as eleições federais de 2022, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) exige que a distribuição de Fundo Especial para Financiamento de Campanha será proporcional ao número de candidatos negros de cada partido. Aqui é considerada a soma de pardos e pretos. Portanto, a autodeclaração dos candidatos também afeta a capacidade de investimento que cada candidato tem à sua disposição, além de servir de base estatística.
Além disso, a mesma resolução do TSE criou uma regra que faz com que o voto em candidatos negros valha o dobro, em relação às demais raças, para dar conta da distribuição de verbas de financiamento de campanha. “Essa medida visa impulsionar o investimento dos partidos em candidaturas negras”, informa o Guia Eleitoral para Candidatas Negras e Femininas, elaborado pelo Senado Federal neste ano.
O tempo de publicidade eleitoral gratuita no rádio e na TV também deve ser proporcional ao número de candidatos negros, segundo entendimento do TSE. No entanto, os partidos podem reorganizar o tempo de exposição dos candidatos na mídia. Portanto, caso a transmissão não seja proporcional em uma semana, as associações deverão compensar esse desequilíbrio nas semanas subsequentes.
Dados do TSE, compilados pelo Guia Eleitoral de Candidatas Negras e Femininas do Senado Federal, indicam que em 2018 os candidatos negros representavam 46,4%
do total de placas no Brasil; em 2020, 50% dos concorrentes se declararam pardos ou pretos; e em 2022, o número de candidatos negros inscritos chegou a 50,27%. Mesmo assim, nas últimas eleições municipais, realizadas há quatro anos, 771 casas legislativas (13,86%) não elegeram nenhum negro. Quase 54% dos vereadores se declararam brancos.
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