Supremo proíbe o Ministério Público de pedir dados fiscais à Receita Federal

Supremo proíbe o Ministério Público de pedir dados fiscais à Receita Federal


Mesmo que o objetivo seja processo ou investigação criminal, é necessária autorização prévia por meio de decisão judicial, diz a 2ª Turma. (Foto: STF/Divulgação)

A 2ª Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) impediu que o Ministério Público solicitasse diretamente à Receita Federal dados fiscais dos contribuintes para utilização em investigações e ações penais. Por unanimidade, os ministros entenderam que é necessária autorização judicial para obter as informações, protegidas pelo sigilo pela Constituição Federal.

A decisão reforça o entendimento estabelecido pelo STF, com repercussão geral, em 2019, de que somente a Receita Federal pode enviar relatórios e informações sobre os cidadãos. Mas o contrário não se aplicaria – ou seja, não seria possível encaminhar os dados solicitados.

A decisão da 2ª Turma difere de uma recente, da 1ª Turma, relatada pelo ministro Cristiano Zanin, segundo especialistas. Permitiu que a polícia solicitasse dados bancários diretamente ao Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf). Para os advogados, como a proteção constitucional é a mesma, o entendimento da 2ª Turma deverá ser adotado pelos ministros da 1ª Turma.

Os criminalistas dizem também que a polícia, os delegados e o Ministério Público
Muitas vezes utilizam este “caminho mais curto” de solicitar informações às agências fiscais sem a ajuda de juízes. No entanto, esta solução, acrescentam, pode infringir direitos garantidos por cláusula fundamental da Constituição, como a vida privada e a intimidade, prevista no artigo 5º. Algumas investigações, especialmente as que envolvem lavagem de dinheiro, destacam, seriam baseadas nestas pontos.

No recurso julgado pelo STF, o Ministério Público Federal (MPF) argumentou que o Tribunal Superior já se manifestou “repetidamente, no sentido de reconhecer a legalidade do compartilhamento de dados entre autoridades públicas”. O MPF argumentou que o artigo 8º da Lei Complementar nº 75/1993 “dispõe sobre o poder requisitante do Ministério Público, sendo vedada a oposição, sob qualquer pretexto, com exceção do sigilo quanto aos dados que lhe devem ser fornecidos”.

Em nota, a Polícia Civil disse que “atua de acordo com a legislação vigente, nos assuntos exclusivamente relacionados à Polícia Judiciária”. O IRS não comenta decisões judiciais. Fonte da PF informou que a instituição não utiliza essa via para obter provas. “Sempre perguntamos [os dados fiscais] via judicial. Sabemos que se solicitarmos diretamente ao IRS, será cancelado.”

Os ministros da 2ª Turma negaram segundo recurso do MPF e mantiveram a decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ), que declarou nulas as provas obtidas pelo Ministério Público. Neste caso, que corre sigilo e envolve suposto crime de peculato e falsidade ideológica, o Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF-3) havia considerado lícito o método utilizado pelo MPF, que solicitou diretamente ao superintendente da Receita para seis declarações fiscais. rendimentos dos acusados, familiares e diversas pessoas jurídicas.

Na votação, o relator, ministro Edson Fachin, lembrou o Tema 990, em que era permitido ao Fisco compartilhar relatórios de inteligência financeira com o MP sem autorização judicial. O inverso, porém, não se aplica.

“Embora o Supremo Tribunal Federal tenha autorizado o compartilhamento de relatórios de inteligência financeira da UIF e do procedimento de fiscalização da Receita Federal do Brasil com órgãos de persecução penal, não permitiu que o Ministério Público solicitasse diretamente dados bancários ou fiscais para fins de investigação ou ação criminosa sem autorização judicial”, afirma Fachin, na votação.

Ana Carolina Piovesana, sócia do Oliveira Lima & Dall’Acqua Advogados e especialista em direito penal econômico, que atuou no caso, diz que a decisão não proibiu o Ministério Público de ter acesso a informações fiscais, apenas reforçou limites estabelecidos na Constituição. “Os dados fiscais podem ser acessados, desde que haja autorização do Tribunal”, afirma.

Ela também entende que o STF garante que apenas as informações necessárias para o
investigação ou processo criminal será acessado. “Intervenção judicial
funciona como uma espécie de filtro, uma barreira, evitando a ocorrência de
ataques indiscriminados à vida privada dos cidadãos”, afirma Ana Carolina.

Segundo a criminalista Luiza Oliver, sócia do Toron Advogados, o resultado do Tema 990 provocou muitas discussões e interpretações divergentes por parte do MP. “Para a Receita Federal enviar um relatório sem decisão judicial é completamente diferente do que o MP está fazendo, no curso de uma investigação ou ação penal, deixando de solicitar a quebra de sigilo e dando um ‘by pass’, tocando no aspecto jurídico determinações que protejam o sigilo fiscal para solicitar acesso direto à declaração de imposto de renda”, afirma. “Não é uma via de mão dupla.”

Para ela, o entendimento de Fachin está correto, mas há contradição com a decisão da 1ª Turma, relatada pelo ministro Zanin. “O STF entende que há maior proteção nas informações fiscais do que nas informações bancárias, que têm a mesma proteção”, avalia.