SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – O prefeito Ricardo Nunes (MDB) encaminhou nesta sexta-feira (2/8) à Justiça um pedido para exclusão de um vídeo em que um investigador da “máfia das creches” de São Paulo afirma ter recebido valores desviados de unidades de educação infantil quando ainda era vereador.
A ação do prefeito incluiu inicialmente para exclusão links de reportagens da Folha de S.Paulo, que revelou o caso, e de outros veículos de comunicação como Metrópoles, Carta Capital e Poder 360. A petição foi revelada pelo portal Metrópoles e confirmada pela reportagem.
Posteriormente, porém, a defesa de Nunes recuou e encaminhou ao tribunal um pedido de retificação do material no qual afirmava não solicitar a retirada de material jornalístico, mas sim daqueles que dele fizeram uso político e eleitoral nas redes sociais.
Nesta semana, o principal adversário de Nunes na disputa pela reeleição, o deputado federal Guilherme Boulos (PSOL), postou o vídeo em suas redes sociais.
A petição pede ainda a quebra do sigilo de Rosângela Crepaldi dos Santos, alvo da Polícia Federal no caso da creche e autora das declarações.
O pedido assinado pelo advogado Daniel Bialski sustenta que Nunes sofre danos irreparáveis devido às acusações feitas por Rosângela. O documento solicita a abertura de inquérito policial, com busca e apreensão contra ela e quebra de sigilo telefônico.
Inicialmente, o pedido falava da necessidade de apagar ou suspender o conteúdo dos links que seguiam, incluindo reportagens da Folha de S.Paulo e de outros veículos.
O advogado disse à Folha de S.Paulo que a intenção da petição nunca foi censurar a imprensa e que fez uma correção para esclarecer o assunto.
A sua retificação afirma que visa “esclarecer que o solicitado não esbarra em eventual censura” e que “visa resolver eventual dano irreparável à vítima, e, por outro, impedir a propagação desenfreada e incontrolável de seu conteúdo para fins eleitorais e políticos, além de impedir a divulgação de montagens feitas por adversários políticos”.
“Desta forma, afirma-se que não foi solicitada e não se pretende a retirada das reportagens da imprensa, nem mesmo a sua divulgação nas respetivas redes sociais”, acrescenta.
Segundo a assessoria de Nunes, o prefeito nunca soube da inclusão dos links dos relatórios na petição inicial e que o erro do departamento jurídico foi logo reconhecido e corrigido por novo documento ao Tribunal.
O advogado de Rosângela, William Albuquerque de Sousa Faria, afirmou em comunicado que o vídeo foi produzido por questões de segurança e que não houve intenção de torná-lo público. A gravação obtida pela reportagem não faz parte da investigação da Polícia Federal sobre o assunto. Nos autos, Rosângela permaneceu em silêncio.
Entenda o contexto
Segundo investigação da PF, ONGs que administram creches municipais teriam recebido de volta parte do dinheiro contabilizado como despesas materiais. As empresas realizavam pagamentos via cheques, depósitos e letras, beneficiando pessoas ligadas à administração dessas entidades.
Conforme revelou a Folha de S.Paulo em 2021, Nunes e uma empresa de sua família, Nikkey Serviços S/S Ltda, receberam valores em 2018 de uma empresa chamada Francisca Jacqueline Oliveira Braz, considerada pela polícia suspeita de ser uma grande “noteira” da máfia da creche.
Segundo documento da Justiça Federal obtido pela reportagem, havia dois cheques no valor de R$ 5.795,08 cada para Nunes em fevereiro daquele ano, revelados após quebra de sigilo bancário.
Ainda segundo o documento, a suposta empresa “cartório” enviou outros R$ 20 mil para a Nikkey, empresa de controle de pragas, em nome da esposa do prefeito, Regina, e de sua filha de um relacionamento anterior, Mayara.
O prefeito sempre alegou que a transferência decorreu da prestação de serviços. No vídeo gravado por Rosângela, ela descarta a prestação de serviços de Nunes e diz que trabalhou para devolver esses valores a pessoas ligadas a ONGs.
“Foi repassado”, disse ele. “[Nunes] nunca prestou nenhum serviço”, acrescenta, em trecho de vídeo obtido pela reportagem.
A PF também investiga repasses feitos pela Acria (Associação Amiga da Criança e do Adolescente), entidade que administra creches conveniadas à prefeitura da zona sul de São Paulo, da qual Nunes tem proximidade. ZNos vídeos, Rosângela aborda o tema.
“Todo esse processo da Acria foi gerenciado por essas pessoas [ligadas a Nunes]mas sabíamos que era ele [Nunes]. Mesmo na hora de formalizar o contrato com a Acria, foi ele quem veio ao meu escritório e falou comigo. Agora, os cheques foram enviados e não sabíamos o destino de cada cheque”, disse.
A PF decidiu nesta terça-feira (30) dar continuidade à investigação sobre a “máfia das creches”. Um dos objetivos da sequência de investigações é apurar suspeitas de lavagem de dinheiro por parte do atual prefeito quando ainda era vereador.
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