Maduro diz que ganhou as eleições.
As sondagens indicavam que Nicolás Maduro perderia por uma vitória esmagadora, mas o ditador, que já fraudou eleições antes e agora desapareceu das urnas, quer fazer parecer que ganhou.
Existem tolos que acreditam. Existem pessoas inteligentes que dizem acreditar. O resto do mundo sabe que é fraude.
A fraude nas eleições não é a única coisa que aproxima Maduro e Bolsonaro.
Maduro é uma espécie de Jair Bolsonaro venezuelano, só que bem sucedido. Bolsonaro queria dar um golpe e se tornar um ditador; Maduro fez isso. Bolsonaro defendeu matar opositores; Maduro morto. Bolsonaro tentou cooptar os militares com cargos, fundos e corrupção; Maduro cooptou. Bolsonaro cogitou controlar o Supremo aumentando o número de ministros; Maduro fez isso. Ao permanecer no poder, Bolsonaro teria levado o país à catástrofe; Maduro aceitou.
Apesar do equivalente brasileiro de Maduro ser Bolsonaro, os apoiadores de Bolsonaro afirmam que Lula transformará o Brasil na Venezuela. A acusação não tem sentido, mas é compreensível: comparar o adversário com o pior governante do continente rende dividendos políticos.
Mais difícil de entender é que Lula e o PT insistem em apoiar um ditador abominável como Maduro, uma insistência que lhes tira os votos e os desmoraliza aos olhos do país e do mundo.
Diz-se que Lula está furioso com Maduro, que lhe ordenou que tomasse chá de camomila e mentiu que as eleições brasileiras não são auditadas. Mesmo assim, o presidente brasileiro permanece, até agora, em silêncio. É porque ele está numa piscina.
Se reconhecer a vitória de Maduro, reconhecerá como legítima uma fraude destinada a espezinhar a vontade do povo e manter um presidente antidemocrático no poder – um estratagema do qual ele próprio foi vítima. Se colocar em dúvida o resultado, exigindo provas de vitória, abandonará um velho amigo, trairá a absurda “causa” do “Sul global” e arranjará briga com grande parte do PT.
O problema de fechar os olhos para coisas que você tem a obrigação de condenar é que quanto mais o tempo passa, mais difícil fica corrigir o seu caminho.
O grande escritor português José Saramago (falecido em 2010), antigo companheiro de Lula, tem uma lição a ensinar ao presidente brasileiro. Saramago apoiou Cuba e Fidel Castro durante mais de 40 anos de forma incondicional e indefensável. Em 2003, quando Fidel atirou em três homens por tentarem escapar da ilha, ele estava farto. Ele escreveu:
“Eu cheguei até aqui. A partir de agora Cuba seguirá o seu caminho e eu ficarei onde estou. Discordar é um direito que está e estará escrito com tinta invisível em todas as declarações passadas, presentes e futuras de direitos humanos. Discordar é um ato irrevogável de consciência. (…) Cuba (…) perdi a minha confiança, defraudou as minhas esperanças, destruiu as minhas ilusões. Eu cheguei até aqui.”
Lula precisa trocar “Cuba” por “Venezuela” na declaração de Saramago e voltar ao caminho dos justos, mas a questão é como tirar essa bota: se o Brasil denunciar a fraude, Maduro se isolará e se radicalizará. O desafio é encontrar uma forma de Maduro entregar o poder de forma pacífica – e não há hipótese de ele aceitar isto se não houver garantias de que permanecerá rico e livre.
(Por Ricardo Rangel em 29/07/2024)
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